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Em ação ao STF, Bolsonaro pede anulação de normas de estados e diz que governadores não podem fechar serviços por decreto

Medida foi anunciada por presidente na quinta-feira (18), durante a sua live semanal

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Brasília

A ação que o presidente Jair Bolsonaro moveu no STF (Supremo Tribunal Federal) contra regras de governadores de combate à Covid-19 pede a suspensão de decretos adotados pelo Distrito Federal, Bahia e Rio Grande do Sul.

O presidente Jair Bolsonaro, durante sua live semana, nesta quinta-feira (18) - Reprodução Jair Bolsonaro no YouTube

O governo também defende que o Supremo reconheça que, mesmo em casos de necessidade sanitária comprovada, o fechamento de serviços não essenciais não pode ser determinado por decreto, necessitando para tanto de lei específica.

A ofensiva judicial foi anunciada por Bolsonaro na quinta-feira (18), em sua live semanal. A ação é assinada pelo próprio chefe do Executivo, e não por integrantes da AGU (Advogado-Geral da União), como ocorre geralmente.

A argumentação do governo é que as medidas tomadas pelos entes federados são contrárias a princípios estabelecidos pela Lei de Liberdade Econômica, aprovada pelo Congresso em 2019.

"Antes de completar dois anos de vigência, a efetividade da Declaração dos Direitos de Liberdade Econômica tem sido bruscamente frustrada por uma série de atos normativos estaduais que, sob a pretensão de conter o avanço da pandemia da Covid-19, optaram por utilizar o poder coercitivo estatal para tolher fulminantemente a liberdade econômica", diz a ação.

Nesse sentido, Bolsonaro pediu ao STF a anulação de algumas normas adotadas por governadores.

O chefe do Executivo conversou nesta sexta-feira (19) com o presidente do Supremo, Luiz Fux, sobre a ação. O chefe da corte que ligou para Bolsonaro após receber informações desencontradas de que o presidente poderia decretar estado de sítio.

Bolsonaro desmentiu a informação e ainda comentou sobre o processo que protocolou no tribunal. A corte ainda não tem previsão para julgar o caso.

Por enquanto, ainda não houve definição nem sobre o relator da matéria. O presidente do Supremo ainda deve decidir se haverá sorteio para definir o responsável pelo caso ou se o processo será distribuído a um ministro específico por já ter relatado outro processo com tema similar.

Os ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, por exemplo, foram responsáveis por ações sobre a competência de estados e municípios no combate a pandemia.

O ministro Ricardo Lewandowski, por sua vez, é relator de diversos casos importantes sobre o enfrentamento da Covid-19.

Depois de receber a ação em seu gabinete, o ministro responsável deve pedir manifestação do Congresso Nacional, da AGU e da PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre o tema. É provável que também peça parecer dos estados que tiveram decretos citados na peça.

O relator pode dar um despacho liminar (provisória) individual na ação ou submeter essa decisão ao plenário da corte.

​As normas do DF e da Bahia tratam de restrições de locomoção da população entre 22h e 5h no período agudo da pandemia.

As do governo gaúcho, por sua vez, estabelecem regras para a prestação e venda de produtos considerados não essenciais.

Sobre as limitações de circulação em determinados horários, Bolsonaro alega que trata-se de um tipo de "toque de recolher", algo que, segundo ele, não tem amparo legal no Brasil.

"Esses decretos afrontaram as garantias estabelecidas na Declaração dos Direitos de Liberdade Econômica e subtraíram parcela importante do direito fundamental das pessoas à locomoção, mesmo sem que houvessem sido exauridas outras alternativas menos gravosas de controle sanitário, externando, por isso, uma decisão política desproporcional", diz a ação.

A argumentação do governo é que restrições de locomoção só podem ser direcionadas a pessoas doentes pelo vírus ou com suspeita de contaminação.

Também afirma que os governos locais não podem definir os serviços essenciais por meio de decreto, sendo necessário para tanto a aprovação de leis nesse sentido.

O Planalto diz na peça que, embora decretos locais possam definir os serviços e atividades essenciais a serem preservados, "somente legislação formal pode impor restrições à locomoção de pessoas saudáveis ou ao exercício de atividades econômicas".

No pedido, Bolsonaro diz que o STF deve reconhecer que medidas de fechamento de serviços não essenciais exigem respaldo legal e "devem preservar o mínimo de autonomia econômica das pessoas, possibilitando a subsistência pessoal e familiar".

Na live de quinta, Bolsonaro revelou que o governo ingressaria com a ação.

"Bem, entramos com uma ação hoje, ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal exatamente buscando conter esses abusos, que inclusive, no decreto, o cara bota ali toque de recolher. Isso é estado de defesa, estado de sítio que só uma pessoa pode decretar: eu", disse o presidente.​

De acordo com o artigo 137 da Constituição, o estado de sítio pode ser decretado quando há “comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa” e “declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira”.

Já o estado de defesa, que o precede, pode ser instaurado, entre outros casos, quando o país é atingido por “calamidades de grandes proporções da natureza”.

Como a Folha já mostrou, a comparação feita por Bolsonaro entre estado de sítio e restrições que acontecem, por exemplo, no Distrito Federal, é enganosa.

"O Supremo vai decidir. Não vou emitir nenhum juízo aqui. Obviamente, se entramos, por intermédio da AGU [Advocacia-Geral da União], a proposta foi supervisionada pelo ministro da Justiça, nós esperamos ter uma resposta no tocante a isso aí", disse o presidente.

Em conversa com apoiadores na manhã desta sexta (19), Bolsonaro voltou ao tema e defendeu a ação tomada junto ao Supremo.

Ele atacou os governadores e prefeitos e disse que eles estão "humilhando" a população.

"[Eles estão] dizendo que está defendendo a vida deles [da população]. Ora bolas, que defendendo a vida? Vocês [governadores e prefeitos] estão matando essas pessoas".

Em outra crítica à limitação da atividade econômica, Bolsonaro disse que o Brasil está perto de viver uma situação de caos social e que "a fome vai tirar o pessoal de casa".

Em tom de ameaça, ele questionou se o governo federal "vai ter que tomar uma decisão", embora não tenha dado detalhes dobre o que seria essa ação.

"Onde é que vamos parar? Será que o governo federal vai ter que tomar uma decisão antes que isso aconteça? Será que a população está preparada para uma ação do governo federal dura no tocante a isso? O que é dura? É para dar liberdade para o povo, é para dar o direito do povo trabalhar. Não é ditadura não. Uns hipócritas falando de ditadura o tempo todo, uns imbecis. Agora o terreno fértil para ditaduras é exatamente a miséria, fome, pobreza, onde o homem com necessidade perde a razão", declarou.

Em outro trecho, o presidente voltou a usar a expressão "meu Exército" e disse que os militares não cumprirão ordens de governadores que limitem a locomoção e atividade econômica das pessoas.

"O meu Exército não vai para a rua para cumprir decretos de governadores. Se o povo começar sair, entrar na desobediência civil, sair de casa, não adianta pedir ao Exército. Porque o meu exército não vai, nem por ordem do Papa, não vai", declarou.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), apontado como possível adversário de Bolsonaro em 2022, reagiu à investida judicial do Planalto e disse que o presidente está concentrando sua energia em "conflito".

Ele defendeu os decretos adotados pelo estado e afirmou que eles têm por objetivo proteger a vida das pessoas e garantir a concorrência entre estabelecimentos autorizados a funcionar e os que devem manter suas portas fechadas.

Leite também destacou que Bolsonaro "chega atrasado", porque os decretos estaduais têm vigência até domingo (21), quando deverão ser substituídos por outras normativas.

"O presidente chega portanto atrasado e infelizmente coloca energia em conflito, confronto e enfrentamento. Desprezando a gravidade da pandemia, quando ele poderia estar colocando essa energia toda em ajudar, conseguir vacina para a população. É isso que a população precisa, vacina, e não confronto e conflito como o senhor [Bolsonaro] está estabelecendo", disse Leite.

Rui Costa (PT), governador da Bahia, também se manifestou e disse que pretende atuar junto ao governo gaúcho na resposta à ação de Bolsonaro no STF.

"Mais uma vez, o presidente demonstra ser o grande aliado do vírus e da morte. Eu nunca imaginei que o Brasil chegaria a uma situação desta, de tamanha falta de responsabilidade e solidariedade. Além de não ajudar, ele [Bolsonaro] faz questão de atrapalhar", escreveu Costa no Twitter.

"Tenho convicção que o STF, que tem dado sucessivas demonstrações de compromisso com a vida, vai mais uma vez deixar claro que a ciência prevalece, e não a negação".

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