Descrição de chapéu Coronavírus câncer

Retomada de atividades e eventos presenciais preocupa pacientes com câncer

Imunodeprimidos tem três vezes mais risco de ter Covid, de acordo com estudo

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Belo Horizonte

As festas do final de ano, em meio à retomada dos eventos presenciais, têm deixado pacientes que fazem parte do grupo de risco para a Covid apreensivos —principalmente imunossuprimidos, caso de pessoas em tratamento de câncer.

A queda na imunidade, causada muitas vezes tanto pela doença quanto pelo tratamento, aumenta o receio de uma possível contaminação, mesmo com a vacinação.

Jackeline Godoni olha para a câmera e sorri; ela veste roupa clara e tem os braços cruzados
Jackeline Godoni, 49, mora em Capanema (PR) e luta contra o câncer em meio à pandemia - Kiko Sierich/Folhapress

Segundo pesquisa da Pfizer/BioNTech, entre os totalmente vacinados, pessoas imunodeprimidas têm três vezes mais risco de contrair Covid e adoecer com quadros mais graves. Os pesquisadores analisaram 1,2 milhão de casos registrados nos EUA entre dezembro de 2020 e julho de 2021 e concluíram que, mesmo assim, o risco é pequeno em comparação com quem não está vacinado.

Aproximadamente 18% dos casos analisados eram de pacientes imunodeprimidos, ou seja, pessoas transplantadas, com HIV, tumores malignos, doenças autoimunes ou outras doenças imunológicas. Entretanto, aproximadamente 60% das hospitalizações e 100% das mortes foram entre pessoas desse grupo.

Maira Caleffi, chefe do Serviço de Mastologia do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, e presidente voluntária da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), faz uma ressalva: o tipo de câncer faz muita diferença no impacto na imunidade e a pesquisa não especifica quais são os pacientes oncológicos referidos como imunodeprimidos.

Os dados apontam que o risco de uma pessoa saudável contrair Covid após ser imunizada com a vacina da Pfizer é de 6 em 10 mil, já para pacientes categorizados como imunocomprometidos esse número é três vezes maior, de 18 em 10 mil.

No caso dos pacientes oncológicos, a redução da imunidade pode acontecer tanto devido ao tumor quanto por alguns tipos de tratamento. Isso porque, ao mesmo tempo em que destrói as células malignas, quimio e radioterapia podem reduzir as células de defesa. Assim, gera-se um ambiente em que o sistema imunológico enfraquece e deixa o paciente mais suscetível a processos infecciosos, explica o oncologista André Fay, médico do grupo Oncoclínicas em Porto Alegre.

Maira Caleffi afirma que a preocupação com a vulnerabilidade deve ser maior no início, em geral o momento mais agressivo do tratamento, que pode incluir cirurgias, quimio e radioterapia, por exemplo. Depois, a terapia pode estender-se por até dez anos com medicamentos, mas não tem impacto na imunidade dos pacientes.

A massoterapeuta Solange Ilkiu, 56, vizinha de Jackeline Goldoni em Capanema (PR)
A massoterapeuta Solange Ilkiu, 56, vizinha de Jackeline Goldoni em Capanema (PR) - Kiko Sierich/Folhapress

Quem passa pelo tratamento inicial percebe que, às vezes, até pequenas exposições podem ter complicações graves. "Para você ter uma ideia, depois que comecei a quimioterapia, em julho deste ano, já peguei gripe oito vezes", conta a administradora de empresas Jackeline Goldoni, 49, que vive em Capanema, interior do Paraná.

Jackeline descobriu o câncer de mama durante uma consulta de rotina em maio deste ano, época do pior período da pandemia no Brasil, que vivia um quadro de mais de 2.000 mortes diárias e tinha menos de 20% da população imunizada com a primeira dose.

"A primeira coisa que meu médico me disse foi para tomar a vacina contra a Covid. Ainda não tinha chegado a vez das pessoas da minha idade, mas ele me deu atestado médico e fui correndo", conta. Em junho, já vacinada e menos de um mês após o diagnóstico, fez cirurgia para retirada da mama e colocação de implante. No mês seguinte, iniciou a quimioterapia, que desde outubro deu lugar ao tratamento radioterápico.

Afastada do trabalho desde junho, quando "trancou-se em casa", Jackeline espera poder voltar à ativa neste mês, mesmo que fazendo jornadas mais curtas. Para ela, trabalhar é uma questão de necessidade. "Eu vou voltar, mas tomando cuidado, quero ter a minha vida normal. Vou fazer minha família ter consciência de que preciso voltar e preciso me cuidar."

A rotina será desafiadora, mas ela já enfrentou algo parecido quando o filho de 14 anos retornou às aulas presenciais (ela tem outro de 24). "Foi desesperador para mim. Ele chegava em casa e eu [falava] ‘vai tomar banho e depois venha me dar um abraço'. Você já está num momento delicado e pensa ‘Já imaginou pegar [Covid]?’"

E ela pegou, de fato, junto com seus pais, marido e filho. Todos se recuperaram bem, mas Jackeline e seus pais tiveram quadros mais graves: ela ficou internada por quatro dias, e eles, por oito dias.

Vizinha de Jackeline em Capanema e ainda sem a dose de reforço, a massoterapeuta Solange Ilkiu, 56, voltou ao trabalho como diretora do Departamento Municipal de Políticas para a Mulher ressaltando a importância do contato com as colegas e o público que atende. ​

Ambas destacam que não pretendem diminuir os cuidados gerais com a prevenção da doença, como o uso correto de máscaras, a preferência por ambientes ventilados e sem aglomerações. Fay afirma que as recomendações de cuidado devem ser individualizadas para cada paciente, levando em conta fatores da doença, do tratamento e do momento epidemiológico.

"Há situações onde há uma preocupação maior e ainda se recomenda um grau de restrição um pouco mais rigoroso; em outras, é possível retomar as atividades dentro dos cuidados usuais de toda a população, nem mais nem menos."

Hoje, entretanto, já se sabe que a vacinação contra Covid-19 é segura e produz imunidade em pacientes com câncer de mama. Para Maira Caleffi, a imunização plena recebe destaque na prevenção de infecções que podem agravar o quadro de saúde.

A médica orienta as pacientes a procurarem aconselhamento para manter as vacinas em dia, em consonância com o cronograma nacional. A recomendação não serve apenas para quem já está doente: o aconselhamento pode ser encontrado por qualquer um, gratuitamente, em qualquer UBS (Unidade Básica de Saúde).

Antes da preocupação com a Covid, os médicos já orientavam seus pacientes a tomar cuidados maiores para prevenir infecções durante o tratamento inicial. Fay recomenda, por exemplo, a preferência por refeições cozidas e não cruas, para evitar contaminação via ingestão, e não tirar a cutícula na manicure, para fugir de machucados que funcionam como porta de entrada para micro-organismos.

Na mesma linha, Caleffi destaca também a importância da higiene bucal, de onde pode vir a contaminação. "O acompanhamento regular com dentistas para evitar gengivites e detectar problemas infecciosos na boca e na gengiva é muito importante para o paciente que está preocupado."

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