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Passageiros relatam falta de comida e limpeza em cruzeiros com surto de Covid

Navios tiveram as atividades suspensas em Salvador e Santos após o aumento de infecções entre os viajantes

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Rio de Janeiro

Passageiros de cruzeiros que tiveram as operações interrompidas nos últimos dias por surtos de Covid relatam nas redes sociais que têm recebido pouca assistência durante o isolamento. Eles narram problemas como pouca oferta de comida, falta de limpeza e dificuldade de obter atendimento médico.

O cruzeiro da MSC Splendida, que teria como destino o Rio de Janeiro, teve que atracar no porto de Santos na quarta-feira (29) após aumento de casos de Covid observados entre os tripulantes. No total, 51 tripulantes e 27 passageiros testaram positivo. Foram identificadas, ainda, 54 pessoas que tiveram contato com os infectados.

Em ofício enviado à Anvisa nesta sexta-feira (31), a empresa MSC Cruzeiros comunicou o encerramento das operações no cruzeiro. A agência disse, em nota, que os passageiros que testaram positivo deverão dar continuidade, em terra, ao isolamento iniciado na embarcação e que serão monitorados pelos Cievs (Centros de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde) das cidades de destino.

Café da manhã servido a passageiros isolados após surto de Covid-19 no cruzeiro MSC Splendida, segundo registro de viajante - Reprodução/Facebook

Todos os demais terão que passar por testes para a Covid-19 antes de desembarcar. Segundo a Anvisa, a duração da operação de desembarque está sujeita às necessidades operacionais e deve ser organizada pela empresa.

A MSC Cruzeiros diz que os hóspedes começaram a desembarcar de forma escalonada nesta sexta-feira (31) e que o processo de desembarque continua durante este sábado (1°).

Nesta sexta, a passageira Viviane Cardoso escreveu nas redes sociais que, após três dias confinada no MSC Splendida com teste negativo para Covid, ainda não conseguia obter informações junto à empresa. Ela reclamou de não haver limpeza dentro das cabines durante o isolamento e disse que enfrenta dificuldades até para obter alimentos.

"A alimentação, se não for pedida (ramal sempre ocupado) não está chegando até nós. Quando chega está fria. Hoje pela manhã recebi este café da manhã. Não temos escolha. Ou comemos isso ou não comemos nada", escreveu.

A passageira Thalita Leme, que testou positivo no navio e já desembarcou, escreveu em um grupo no Facebook que sua sogra e sua cunhada, que tiveram o teste negativo, estão isoladas e "passando fome" há três dias.

Ela também afirmou que os passageiros não estão recebendo atendimento médico adequado.

"O rapaz da cabine do lado queimando de febre, pediu uma dipirona, levou mais de cinco horas, só deram depois de muito escândalo que ele fez, não tivemos observação de um médico sequer, não ligavam nem pra perguntar se estávamos bem, comíamos a hora que resolviam dar e o que resolviam dar, tudo frio, resto de coisa... Foi um pesadelo", escreveu.

Em nota, a empresa afirmou que o cancelamento do cruzeiro se deu devido ao impacto causado no roteiro programado, diante do retorno do navio para Santos. A MSC Cruzeiros também disse que "está dando suporte aos hóspedes, incluindo logística e hospedagem, conforme necessidade e demanda".

A companhia não esclareceu o que pode ter provocado o surto de Covid-19 na embarcação e disse que foi identificado "um número limitado de casos". A MSC Cruzeiros também não se manifestou a respeito das reclamações de negligência entre os passageiros.

A empresa afirmou ainda que conta com "robusto protocolo de saúde e segurança", com obrigatoriedade de apresentação de comprovante de vacinação e testagem para embarque. Segundo a MSC Cruzeiros, os navios operam com 75% da capacidade de ocupação e o distanciamento social é obrigatório, assim como o uso de máscaras.

Foram confirmados ao menos 68 casos de Covid-19 no cruzeiro Costa Diadema
Foram confirmados ao menos 68 casos de Covid-19 no cruzeiro Costa Diadema - Divulgação

Não foi essa, porém, a experiência vivida pela professora Carolina Tinen, 35, que participou de um cruzeiro de Natal no navio MSC Seaside.

Carolina diz à Folha que a empresa não cumpriu os protocolos de segurança e muitas vezes expôs os passageiros a situações de aglomeração. Ela embarcou no dia 23 de dezembro e, no dia 28, começou a apresentar sintomas gripais. Na sexta-feira (31), menos de um dia após desembarcar, testou positivo para a Covid-19.

"Tenho convicção de que a MSC me impôs e não me deu alternativas a situações de aglomeração de centenas ou milhares de pessoas, e que eu fui intensamente exposta ao vírus por conta disso, tendo contraído a doença apesar de todos os meus cuidados redobrados", afirma ela.

Carolina narra uma série de situações no navio em que não teria havido preocupação por parte da organização em manter o distanciamento social ou o uso de máscaras.

Segundo ela, o embarque e o desembarque não foram efetivamente escalonados, e os cerca de 3.000 passageiros do navio ficaram aglomerados nos mesmos espaços. Carolina aguardou por quase duas horas e meia o desembarque, junto a outros viajantes.

A professora também desistiu de assistir a um espetáculo quando notou que não haveria distanciamento entre os assentos. "A ocupação limitada a 75% não é nem um pouco eficaz se não se faz esse controle em todos os espaços", diz.

Carolina diz que muitos passageiros, se não a maior parte, utilizavam a máscara abaixo do nariz, e que funcionários da MSC não cobravam o uso correto. Ela afirma que não viu crianças usando a proteção e que a piscina infantil, coberta, estava frequentemente aglomerada.

A passageira diz que os próprios profissionais da empresa, que trabalhavam em bares e restaurantes no navio, abaixavam a máscara quando estavam um pouco afastados dos passageiros, mas ainda próximos às bebidas e aos alimentos.

A professora conta que, com o passar dos dias, o relaxamento das pessoas em relação aos protocolos foi aumentando, mas que a empresa nunca alertou os passageiros sobre o crescimento dos casos de Covid-19 dentro do navio, tampouco sobre o procedimento nessas situações. Até agora ela não sabe, de fato, quantas pessoas contraíram o vírus no cruzeiro.

Quando uma pessoa do seu grupo testou positivo, a professora descobriu que havia um "covidário", ou seja, uma seção de cabines para os que se infectaram e outra para as pessoas que tiveram contato com infectados, mas cujo teste deu negativo.

Corroborando relatos de passageiros nas redes sociais, ela diz que as pessoas isoladas não conseguiam obter informações com a MSC. "As ligações feitas dessas cabines de isolamento não eram atendidas. Essas pessoas ficaram horas sem saber o que acontecia, a MSC não entrava em contato para acompanhar os casos e verificar se estavam bem, se precisavam de algo", afirma.

Nesta sexta-feira (31), a Anvisa interrompeu as atividades em outro cruzeiro, o Costa Diadema, que ficou atracado no porto de Salvador.

A embarcação saiu com 3.836 viajantes e teria como destino Ilhéus (BA), mas terá que retornar ao porto de Santos após a confirmação de 68 casos de Covid-19 até o momento. Assim como no MSC Splendida, a maior parte das infecções ocorreu entre os tripulantes. Cinquenta e seis deles testaram positivo, e 12 entre os passageiros.

Foram autorizados a desembarcar em Salvador os viajantes com teste positivo, que ficarão em isolamento em hotéis já disponibilizados pela operadora do cruzeiro. Moradores da capital baiana também puderam sair da embarcação.

Segundo o plano de contingência, a embarcação poderá seguir, sob condição de restrições a bordo, para Santos. Isso significa que todas as atividades não essenciais devem ser interrompidas.

Ao desembarcarem em Santos, todos os viajantes terão que ser testados. O monitoramento deve ser realizado pelos Cievs.

No grupo de Facebook Costa Diadema, o passageiro Milton José Silva afirmou que está passando por um "tratamento desumano" a bordo do navio, com dificuldade de acesso a atendimento médico.

Ele também disse que os passageiros precisam pedir pela alimentação várias vezes para serem atendidos e que na quinta-feira não foi ofertado café da manhã. Escreveu, ainda, que o quarto não está sendo limpo e que faltam papel higiênico e toalhas novas.

Em nota, a Costa Cruzeiros anunciou a interrupção das operações do Costa Diadema para os embarques em Santos em 3 e 10 de janeiro e os embarques em Salvador em 6 e 13 de janeiro.

A empresa disse que adota "rígidos procedimentos de saúde" para o embarque, como obrigatoriedade de apresentação do comprovante de vacinação e de teste negativo. Procurada, a companhia não respondeu o que pode ter motivado o surto, tampouco se manifestou a respeito das reclamações de falta de assistência.

Diante do aumento dos casos de Covid nas embarcações, a Anvisa recomendou ao Ministério da Saúde na sexta-feira a suspensão provisória da temporada de navios de cruzeiro, em caráter preventivo, até que haja mais dados disponíveis para avaliação do cenário epidemiológico.

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