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Saúde gastou R$ 8 milhões com campanha de vacinação infantil da Covid

Campanha de imunização teve baixo alcance, avaliam especialistas; pasta investiu cerca de R$ 143 mi com campanha para adultos

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Campo Grande e São Paulo

O governo federal gastou R$ 7,87 milhões com a campanha de vacinação infantil contra Covid em 2022.

O valor destoa dos investimentos feitos no passado em outras fases da pandemia, incluindo o gasto de cerca de R$ 23 milhões para incentivar o tratamento precoce, que não tem comprovação científica.

Em 2021, o Ministério da Saúde gastou aproximadamente R$ 142,16 milhões e, em 2022, R$ 1,67 milhões para divulgar a vacinação de adultos, incluindo gastos para a campanha de reforço —um total de R$ 143,83 milhões, portanto.

Os dados do foram obtidos pela Folha via LAI (Lei de Acesso à Informação) e compreendem o período de janeiro de 2021 até julho de 2022. Procurada, a Saúde afirmou que atuou desde o início da pandemia para informar a população sobre a imunização.

Para especialistas, o baixo investimento da pasta na imunização infantil explica ao menos em parte porque a campanha de vacinação para essa faixa etária está estagnada, conforme mostrou reportagem da Folha.

De acordo com o IBGE, as crianças representam cerca de 17% da população brasileira, o equivalente hoje a 36,5 milhões dos 215,4 milhões de habitantes do país.

Sophia Torres, 5, recebe a vacina contra Covid na escola municipal de Borba Gato, na zona sul de São Paulo - Rivalgo Gomes - 21.fev.22/Folhapress

Até o último dia 7, no país, 13,9% das crianças de 3 a 4 anos receberam a primeira dose do imunizante contra Covid, e só 4,2% receberam as duas doses, segundo dados do DataSUS. Na faixa etária de 3 a 11 anos, até o último domingo (20), 52,88% receberam a primeira dose, e 36,18% as duas doses do imunizante, de acordo com o consórcio de veículos de imprensa

Já a população adulta atingiu 84,67% da população com pelo menos uma dose e 80% com esquema primário vacinal completo (duas doses ou dose única), segundo dados do consórcio de veículos de imprensa.

Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, a demora em iniciar a vacinação de crianças e a falta de ampliação do público-alvo podem estar relacionados a um menor interesse do governo na imunização desse grupo.

Para o infectologista e pesquisador da Fiocruz Julio Croda, o governo federal ainda não enxerga essa população como prioritária. "Quando olhamos todos os dados que foram gerados no Brasil, podemos dizer que as crianças são o grupo etário que apresenta maior risco de hospitalização e de óbitos", diz.

Segundo ele, o alcance da campanha pode ser considerado limitado. "É um número bem restrito, que vai gerar pouco impacto. O ideal seria adquirir em torno de 21 milhões de doses para ofertarmos essa vacina para todas as crianças entre 6 meses e 5 anos."

Croda destaca que não houve alocação de recursos para realizar aquisição de vacinas para 2023. "O que podemos prever para o próximo ano é um apagão de doses de vacinas; os contratos estão vencendo e não temos uma renovação, em termos de oferta adequada de acordo com o quantitativo por estados", afirma.

Para o pediatra e diretor de imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Renato Kfouri, a chegada de vacinas para os mais novos ocorre em um momento em que o cenário epidemiológico já não preocupa mais tanto a população, apesar da alta recente de casos no país.

"Criou-se a falsa percepção de que as crianças não precisam ser vacinadas porque os sintomas não são tão intensos quanto nos mais idosos, mas a Covid sozinha causou mais mortes em crianças do que a soma de todas as outras doenças para as quais já existem vacinas", explica.

Segundo ele, houve um boicote do governo à vacinação infantil. "Não conseguiram com os idosos, com as grávidas, com os adolescentes, mas no público infantil, o receio dos pais foi muito grande. Pela primeira vez, a situação se inverteu: os pais e responsáveis, que tomaram a vacina, não querem vacinar os seus filhos", lamenta.

A imunologista e professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Cristina Bonorino, classifica a ação de não proteger as crianças como um ato criminoso.

"Nós sabemos que o vírus pode causar sequelas neurológicas e que a [incidência] de Covid longa em crianças aumenta a cada dia. Não sabemos o que vai acontecer com essas crianças, e isso é responsabilidade do governo federal", afirma.

Procurado, o Ministério da Saúde informou por meio de nota que trabalha desde o início da pandemia para "divulgar amplamente todas as medidas de prevenção contra a doença, incluindo a importância de completar o ciclo vacinal com todas as doses recomendadas para conter o avanço da doença e atingir a máxima proteção contra o vírus".

Disse, ainda, que a pasta realizou, de março de 2020 até agora, 39 campanhas de comunicação sobre a Covid, incluindo "medidas preventivas e reforço da importância da campanha de vacinação e da dose de reforço", com investimento de mais de R$ 400 milhões, incluindo 25 mil inserções em TVs, 400 mil inserções em rádios, 965 milhões de impressões e mais de 837 milhões de inserções em mídia exterior, segundo a nota.

Em relação à vacinação infantil, a pasta esclarece que "não houve atraso na aquisição e incorporação das vacinas pediátricas" e que "solicitou reserva dos imunizantes ainda em 16 de dezembro [de 2021], logo após a autorização da agência reguladora [Anvisa]". "O primeiro lote chegou em 13 de janeiro, considerando o menor tempo de produção e logística necessárias para sua chegada. A vacinação de crianças de 3 a 5 anos teve início em julho de 2022".

Karol Duarte , Ítalo Cosme , Guilherme Gama e Ana Bottallo

Esta reportagem foi produzida como parte do programa de Trainee InfoVacina, promovido pela Agência Bori e pelo Instituto Sabin para Vacinas.

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