Descrição de chapéu The New York Times

Por que o corpo humano parece estar ficando mais frio

Estudos recentes apontam que a temperatura média do corpo humano não é de 37°C, o que pode influenciar a medição da febre

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Dana G. Smith
The New York Times

Nas últimas décadas, têm se acumulado evidências de que a temperatura média do corpo humano não é realmente de 37°C. Em vez disso, a maioria das pessoas tem uma temperatura basal um pouco mais baixa.

O padrão de 37°C foi estabelecido há mais de 150 anos pelo médico alemão Carl Wunderlich, que supostamente fez mais de um milhão de medições em 25 mil pessoas. As temperaturas variaram de 36,2°C a 37,5°C, e a média foi de 37°C. Wunderlich também estabeleceu 38°C como "provavelmente febril".

No entanto, um estudo publicado em setembro que avaliou as temperaturas de mais de 126 mil pessoas entre 2008 e 2017 descobriu que a média está mais próxima de 36,6°C. Outros estudos modernos relataram números semelhantes.

Menina loura, com expressão de dor, debaixo de cobertas brancas e com um termômetro eletrônico na boca
Temperatura corporal mais baixa pode influenciar aferição de febre - Serhio Lee/Fotolia

Os especialistas que estudam a temperatura corporal têm opiniões divergentes sobre por que parecemos ter ficado mais gelados ao longo do tempo e se isso importa quando se trata de avaliar febres e diagnosticar infecções.

POR QUE 37°C ESTÁ ERRADO

Alguns pesquisadores dizem que pode ser apenas uma questão de medição —Wunderlich pode ter avaliado as temperaturas usando métodos e padrões diferentes dos que usamos hoje. Um relato afirma que ele usou um termômetro de 30 cm de comprimento que era colocado na axila das pessoas.

Muitos fatores podem influenciar a leitura da temperatura corporal, sendo o mais significativo o local onde é feita: as temperaturas retais são mais altas do que as temperaturas orais, que são mais altas do que as leituras feitas na pele.

A temperatura corporal também é influenciada pelo horário do dia, se está quente ou frio lá fora e até mesmo se a pessoa acabou de comer ou beber algo. As leituras também podem variar de termômetro para termômetro, dependendo de como são calibrados.

Comparar dados históricos e modernos resulta "uma mistura de observações", diz Philip Mackowiak, professor emérito de medicina na Escola de Medicina da Universidade de Maryland, que, em um artigo de 1992, foi um dos primeiros pesquisadores a analisar as conclusões de Wunderlich. A queda na temperatura pode ser "um fenômeno real", acrescenta ele, "mas não há como saber porque os dados são muito diversos".

Outros especialistas acham que os seres humanos realmente ficaram mais frios nos últimos 150 anos. Nossas temperaturas podem ter diminuído porque "temos a sorte de estar mais saudáveis do que costumávamos ser", afirma Julie Parsonnet, professora de medicina e de epidemiologia e saúde populacional na Faculdade de Medicina de Stanford, que liderou o estudo de setembro sobre a temperatura corporal.

Por exemplo, pode ser que muitas pessoas na amostra de Wunderlich tivessem temperaturas ligeiramente elevadas devido a inflamações de baixo grau. Tratamentos melhores para infecções, cuidados dentários aprimorados e o desenvolvimento e uso de medicamentos como estatinas e anti-inflamatórios não esteroides podem ter contribuído para uma diminuição das inflamações desde o século 19, o que, por sua vez, reduziu a temperatura média das pessoas, explica Parsonnet.

Independentemente do motivo da mudança, os especialistas entrevistados concordaram que 37°C não deve mais ser considerado o padrão humano universal. Mas, em vez de diminuir a temperatura média em um grau ou mais, ela deve ser apresentada como uma faixa, afirma Waleed Javaid, professor de medicina na Escola de Medicina Icahn do hospital Monte Sinai, que publicou um artigo de revisão sobre a temperatura corporal em 2019.

Essa faixa levaria em consideração a variabilidade natural da temperatura que ocorre de acordo com o gênero e a idade —as mulheres tendem a ter uma temperatura ligeiramente mais alta do que os homens, e os adultos mais velhos têm uma temperatura mais baixa do que os mais jovens. Além disso, a temperatura corporal de cada pessoa flutua ao longo do dia —geralmente é mais baixa de manhã e mais alta no final da tarde.

"Assim como há uma faixa para a frequência cardíaca, há uma faixa para a pressão arterial", a temperatura também tem uma faixa, diz Javaid.

O QUE CONTA COMO FEBRE

Se redefinirmos a temperatura corporal "normal" do ser humano, o que seria considerado anormal?

O CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças) dos Estados Unidos afirma que temperaturas de 38°C ou mais são consideradas febre —um aumento de um grau em relação a 37°C. Mas se a temperatura média do ser humano for mais baixa, é possível que a temperatura que indica febre também possa ser mais baixa.

Parsonnet gostaria que houvesse uma abordagem personalizada para a febre, em que os médicos comparem cada paciente com sua própria média, para que febres de baixo grau não sejam ignoradas em pessoas que têm uma temperatura mais baixa.

A missão é um tanto pessoal para ela: a sogra dela tem uma infecção cardíaca que não foi diagnosticada por meses porque ela nunca apresentou febre. Sua temperatura era em torno de 37°C, mas, segundo Parsonnet, isso "não era normal para ela, para a idade dela".

Para Mackowiak, essa abordagem individualizada seria ideal, mas é utópica dadas as restrições de tempo já enfrentadas por médicos e enfermeiros.

Ele e Javaid também não estão tão preocupados com a possibilidade de febres de baixa intensidade não serem registradas por causa dos padrões de temperatura atuais. Em vez de mudar a definição de febre, eles disseram que a solução pode ser dar menos ênfase à febre como um todo e considerá-la como um sinal entre muitos —algo que muitos médicos já fazem. (Este conselho se aplica aos pais, assim como aos médicos.)

Se a temperatura estiver muito alta, isso é uma informação importante, disse Javaid, mas "a temperatura não é a única coisa que se deve observar".

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