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Como é torcer para o Barça em Madri e para o Real em Barcelona

Folha acompanhou grupos de torcedores que se reúnem em território inimigo

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Madri e Barcelona

Enquanto Barcelona e Real Madrid se encaminhavam para o vestiário nesta quarta-feira (27), ao fim do primeiro tempo, o advogado José Ramón Casas, 58, saía para fumar um cigarro na calçada do edifício que abriga o Centro Catalão de Madri, que fica em frente à Plaza de España.

“Controlamos demais [o primeiro tempo], faltou profundidade. O controle é bom, mas é preciso chutar no gol”, disse Casas, um dos dez barcelonistas que assistiram na sede da Penya Blaugrana, praticamente no coração da capital espanhola, à vitória do Barça por 3 a 0 sobre o Real Madrid, pela semifinal da Copa do Rei. A reportagem acompanhou o clássico no local.

O advogado é um dos fundadores de uma das associações de torcedores do Barça na cidade, que desde 1985 se reúne neste mesmo espaço para assistir aos jogos da equipe ou, no passado, quando não havia TV por assinatura, de onde saíam para seguir o time pelo país.

Na Espanha, as “peñas” (penyas em catalão) são grupos de fãs reconhecidos pelos clubes como entidades oficiais. É motivo de orgulho para essas peñas, às vezes tão distantes de onde suas equipes residem, que tenham o reconhecimento como representantes da instituição pelo território nacional afora.

José Ramón Casas conta que o grupo já chegou a reunir mais de 200 torcedores na época de Pep Guardiola à frente do Barcelona. Nesta quarta, porém, somavam somente uma dezena os presentes no salão de reuniões do Centro Catalão —que chegou a ter 12 pessoas, mas uma dupla de amigos foi embora no intervalo–, cuja única peça de decoração alusiva ao Barça era uma modesta bandeira colocada embaixo da TV. “O número de [presentes] hoje até que foi bom”, disse Casas.

Nos primeiros 45 minutos, Casas e os demais torcedores demonstraram o nervosismo natural de quem via o time precisar de gols para se classificar. A TV estava em um canal catalão, mas, segundo os envolvidos com a peña, os catalães são minoria entre quem vai ao local torcer pelo time.

As melhores oportunidades da primeira etapa foram do Real, principalmente com Benzema e Vinicius Junior. O brasileiro, inclusive, deixou impaciente um torcedor com suas seguidas quedas após divididas. “Por que não se joga oito vezes mais?”

O capitão rival Sergio Ramos também recebia o carinho dos barcelonistas. “Que vergonha de jogador!”, disse um dos presentes.

Já em Barcelona, onde a Folha acompanhou um grupo de torcedores do Real em território inimigo, a noite terminou frustrada. Pelo menos nos 120 m² da sede da peña madridista Juan Gómez “Juanito”.

A associação fundada por um grupo de amigos em 1991 com o nome de “La Parmera”. No ano seguinte, quando o atacante que jogou no Real de 1977 a 1987 morreu num acidente de carro, foi rebatizada para homenageá-lo.

O local tem dois andares. O de cima conta com duas mesas compridas e um bar. Na decoração, uma réplica da taça da Champions League –que custou mil euros (R$ 4,2 mil)–, fotos de jogadores e bandeiras do clube. O andar de baixo deveria ser usado pelos mais de 150 sócios da peña, os únicos que podem acessá-lo, mas quase todos os presentes se apertam no piso superior, onde é mais quente.

Até os 27 minutos do segundo tempo, cerca de 30 madridistas alternavam entre apreensão coletiva e gritos sincronizados, inclusive nos replays. Depois do primeiro gol do Barcelona, as reações se acentuaram e os berros de “vamos!” deram lugar a palavrões. Quando veio o terceiro gol catalão, enfim, resignação.

“Agora temos que ganhar a Champions”, repetia um torcedor. “Ganhamos três com o Cristiano Ronaldo. Ele saiu e o dinheiro continua no banco, não contratamos ninguém. O resultado é esse”, respondeu outro.

O brasileiro Marcelo foi hostilizado. Quando apareceu na transmissão no primeiro tempo, brincando com uma bola no banco, foi alvo de ira. “Vá logo para a Juventus”, gritaram. Quando voltou à tela, aparentemente revoltado, depois do segundo gol, afirmaram que nada mudaria se ele estivesse em campo.

Um dos torcedores no local era o empresário aposentado Pepe Rubó, 65, presidente da federação das peñas madridistas da Catalunha, que congrega 27 associações. Apenas a “Juanito” fica na cidade do arquirrival.

Nascido em Barcelona, sua família é toda "blaugrana", mas, durante o clássico desta quarta, vestia um cachecol merengue.

“É que quando era pequeno meu cérebro se desenvolveu [risos]”, brinca Pepe ao tentar justificar a torcida pelo Real Madrid. “Eu via os jogos com meu pai, barcelonista, quando criança em uma TV preto e branco. Ele torcia pros jogadores de roupa escura e eu contrariava, torcendo para os ‘blancos’”, conta.

Enquanto na pequena parte madridista da Catalunha os gols eram vistos com o lamento da desclassificação iminente para o rival, em Madri os barcelonistas do Centro Catalão comemoravam entre abraços e apertos de mão. Animado com a vitória, Casas projetou o duelo de sábado entre Real Madrid e Barcelona, novamente no Bernabéu, pelo Campeonato Espanhol.

“Estamos com a moral nas nuvens. Mas é difícil ganhar duas vezes no Bernabéu. Nós, do Barça, somos assim, tendemos a ser um pouco mais pessimistas. Os do [Real] Madrid não, até quando perdem cantam a vitória seguinte”, disse o advogado, enquanto fumava um último cigarro a caminho do metrô para embarcar na mesma linha que liga o Bernabéu ao Centro Catalão, onde a amargura dos madridistas encontrou a felicidade dos fãs do Barça.

O jornalista Bruno Rodrigues viaja a convite de La Liga, que organiza o Campeonato Espanhol

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