Brasileiros enxergam Belarus como vitrine, apesar de vírus

Sem parar o futebol, presidente do país recomenda vodka contra pandemia

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Santos

Causou espanto a jogadores e técnicos em Belarus um ofício enviado pela federação local a apenas dois dias do início da Vysshaya Liga, principal competição no país, no último dia 21.

Dirigentes de clubes de cada uma das 16 equipes foram informados que o futebol não pararia por causa da pandemia de coronavírus.

Na Bielorrússia, meio-campista Gabriel Ramos ainda segue jogando; ele marcou na estreia pelo Torpedo Zhodino
Na Bielorrússia, meio-campista Gabriel Ramos ainda segue jogando; ele marcou na estreia pelo Torpedo Zhodino - Divulgação/Torpedo Zhodino

“Havia uma certeza sobre a paralisação. O comentário que ouvimos é de que estava 99% acordado para ser cancelado ou, pelo menos, adiado. Fomos pegos de surpresa com a confirmação do início”, conta à Folha o atacante brasileiro Diego Carioca, 22, jogador do FC Vitebsk.

A decisão do país, o único da Europa a seguir jogando —as demais ligas em atividade são Nicarágua, Turquemenistão, Burundi e Mianmar— tem o dedo de Alexander Lukashenko.

Lukashenko é presidente bielorrusso desde 20 de julho de 1994, e ganhou manchetes em jornais internacionais nos últimos dias por uma visão controversa sobre a pandemia.

“O coronavírus é apenas mais uma psicose”, disse na última semana, em entrevista ao diário italiano La Gazzetta dello Sport.

As pessoas não deveriam apenas lavar suas mãos com vodka, mas, também, envenenar o vírus com ela”.

“Fazer sauna, beber vodka e trabalho duro em um trator pode curar qualquer coisa”, acrescentou Lukashenko, que esteve presente a uma partida de hóquei no gelo no último sábado (30), em Minsk.

Até agora, os públicos ainda são modestos. O melhor deles, de 3.648 torcedores, aconteceu no empate por 1 a 1 entre Dínamo Brest, atual campeão nacional, e Smolevichy, na rodada inaugural da competição.

O número de torcedores presentes nos estádios já caiu entre as duas primeiras rodadas, de 10.474 para 8.958, de acordo com levantamento feito pela ESPN Brasil.

Torcedores de dois clubes, o Shakhter Soligorsk e Neman Grodn, também avisaram que boicotarão as próximas partidas.

Mesmo com isso, o futebol do país cresce aos olhos de apostadores e de interesse televisivo como nunca havia registrado. A emissora Match, da Rússia, e Futbol 1, da Ucrânia, adquiriram direitos de transmissão.

O espanto inicial de Diego Carioca virou, também, esperança de dias melhores para os jogadores que buscam maior visibilidade. O atacante puxa uma fila com outros seis brasileiros pouco conhecidos e contratados por equipes de Belarus.

“Todos os dias a minha família me liga, perguntam como estou me sentindo. Eles têm essa preocupação, acham que aqui também deveria parar. Eu também acho isso, mas sou funcionário do clube”, explica o atacante Gabriel Ramos, contratado há pouco mais de um mês pelo Torpedo Zhodino.

Gabriel, 24, estreou na competição com um gol marcado nos minutos finais da vitória diante do Shakhtyor. Antes de chegar ao país, teve passagens pelas categorias de base do Bahia e do Flamengo, mas precisou ir para a Geórgia. Assinou com o Dinamo Batumi, para seguir sonhando com a carreira no futebol.

Este ano foi levado por empresários ao Torpedo.

“Quando cheguei não havia esse medo todo. Estamos correndo riscos, querendo ou não, mas precisamos não pensar nisso”, afirma.

Não há medidas restritivas no país. Comércios, creches, escolas, fábricas, bares, shoppings e restaurantes seguem abertos normalmente. Outros esportes populares, como o hóquei no gelo e handebol, também tiveram suas competições iniciadas.

Nos estádios, é comum ainda a cena de torcedores sem camisas. Na entrada, agentes de segurança medem a temperatura dos torcedores. Jogadores foram instruídos a evitarem contatos físicos desnecessários.

“O que nos passam é para irmos do treino para casa, evitar estar em locais com muita gente. Em campo, esquece, é impossível não ter contato. Na primeira rodada não trocamos nem cumprimentos com adversários”, conta Diego Caricoa.

O atleta mais novo a chegar no país é o meio-campista Lipe, 22, companheiro de Gabriel Ramos no Zhodino.

Diferentemente dos demais, ele precisou passar quase duas semanas em isolamento, sendo visitado somente pelo médico do clube para acompanhamento e para receber alimentos.

“No começo a minha família não entendia por que não íamos parar. Expliquei que a doença aqui não está da mesma forma que no Brasil. Querendo ou não, aqui hoje virou um campeonato visado. Passei por bons clubes no Brasil, mas não tive chances. Hoje tenho uma chance”, disse o jogador, apresentado somente na última semana pelo time.

Na última terça-feira (31) morreu o primeiro paciente de Covid-19 no país, que tem pouco mais de 9,5 milhões de pessoas.

Há mais de 150 casos confirmados da doença. Parar ainda segue longe de estar nos planos de Belarus.

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