Chris Paul supera traumas e chega à decisão da NBA em sua 16ª tentativa

Em jornada improvável com Phoenix Suns, experiente armador enfim vai à final da liga norte-americana

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São Paulo

Não era fácil arrancar elogios de Kobe Bryant, que afirmava o seguinte sobre Chris Paul: “No fim das contas, quando tudo for história, ele será um dos melhores de todos os tempos”.

Eles eram amigos, é verdade, mas Kobe nunca foi adepto do aplauso barato e também não tinha dificuldade para apontar defeitos nas pessoas próximas. Era real a sua admiração por Paul, de quem foi colega na seleção dos Estados Unidos.

Campeã olímpica em 2008, a dupla esteve bem perto de unir forças no Los Angeles Lakers, em 2011, mas o negócio foi vetado por questões políticas. A Bryant restou imaginar como seria a parceria, que acabou não se materializando na NBA: “Nós simplesmente não perderíamos”.

Chris Paul era amigo de Kobe Bryant e considerado pelo craque do Los Angeles Lakers um dos melhores jogadores de basquete de todos os tempos - Lucy Nicholson - 20.fev.09/Reuters

Sem o reforço do amigo, o pentacampeão viveu anos difíceis nos Lakers até sua aposentadoria, em 2016. Já Chris Paul, que havia iniciado a carreira no New Orleans/Oklahoma City Hornets, passou em seguida por Los Angeles Clippers, Houston Rockets e Oklahoma City Thunder, completando 15 temporadas na liga norte-americana de basquete sem chegar a uma final.

Na 16ª tentativa, enfim, ele conseguiu. Aos 36 anos, liderando um Phoenix Suns que não era colocado entre os favoritos ao título e nem sequer se classificava para o mata-mata desde 2010, o armador superou velhos traumas e finalmente avançou à decisão.

A vaga foi assegurada na noite de quarta-feira (30), com uma vitória por 130 a 103 sobre os Clippers. Com o resultado em Los Angeles, a equipe do Arizona fechou a série final da Conferência Oeste em 4 a 2 e passou a aguardar o vencedor da Conferência Leste, Milwaukee Bucks ou Atlanta Hawks.

“Cara, isto é bom. É gostoso. Ainda temos trabalho a fazer, mas eu vou aproveitar isto aqui. São 16 anos, cirurgias, trabalho duro, derrotas, derrotas duras...”, afirmou o jogador, que dominou o jogo 6 com 41 pontos, oito assistências e três roubos de bola.

Não faz justiça à contribuição de Paul, no entanto, resumi-la a estatísticas. Sua presença elevou a novo patamar o jovem time dos Suns e foi sentida até nas partidas de que não pôde participar. Nos dois primeiros duelos com o Clippers, ambos vencidos pelo Phoenix, o veterano estava afastado por causa de um teste positivo para Covid-19.

Terminado o jogo 2, decidido em lance espetacular no segundo final, os atletas correram para o vestiário e entraram em contato com o armador pelo aplicativo FaceTime. Ele vem de outra era do basquete –o que se vê em seu ataque metódico, lento, e nos arremessos de meia distância, fora de moda–, mas soube se conectar com os mais novos.

“Acho que ele foi a melhor coisa que aconteceu na minha carreira”, afirmou Deandre Ayton, responsável pela enterrada que definiu aquele triunfo crucial no instante derradeiro.

O atleta de 22 anos encontrou no experiente companheiro algo que ainda não havia conhecido em sua breve trajetória como profissional: alguém com conhecimento profundo do jogo e personalidade para apontar erros. Ayton cresceu, vem se consolidando como uma força no garrafão e dá boa parte do crédito ao veterano.

“Ele realmente presta atenção nos detalhes. Nunca vi um cara que se importe tanto com basquete e com competir em qualquer coisa. É contagioso, e foi isso o que ele construiu em mim”, disse o pivô. “A primeira coisa que ele me falou foi: ‘Ângulos’. E eu fiquei, tipo: ‘Ângulos?’. Ângulos para fazer o corta-luz, para pegar o rebote. É uma das coisas que estou aprendendo com ele.”

A tranquila vitória decisiva sobre os Clippers já estava assegurada, mas Chris Paul continuava orientando Deandre Ayton, enquanto Devin Booker festejava - Harry How/AFP

O efeito não foi muito diferente com Devin Booker, 24, que já era considerado uma estrela em ascensão na NBA, mas criticado por produzir estatísticas vazias, que não resultavam em vitórias. O ala-armador chegou a anotar 70 pontos em uma noite, em 2014, mas, em cinco tentativas, jamais havia conseguido classificação aos “playoffs” –do qual participam 16 dos 30 times– até o encontro com Paul.

Tudo se encaixou a partir da chegada do veterano. Para o próprio veterano, para os jovens, para o elogiado técnico Monty Williams e para o Phoenix Suns. Foram 51 vitórias e 21 derrotas na fase de classificação, suficientes para o segundo lugar no Oeste. No mata-mata, além dos Clippers, derrubados na quarta, ficaram para trás os Lakers, campeões de 2020, e o Denver Nuggets, de Nikola Jokic, eleito o melhor jogador da atual temporada.

No caminho até a final –onde estão os Suns pela terceira vez em 53 anos de história, ainda sem nenhum troféu–, Chris Paul precisou reviver velhos pesadelos. Um deles foi a lembrança da fragilidade de seu corpo de 1,83 m, que o traiu com lesões na fase final da competição em 2015, 2016 e 2018.

Desta vez, ele teve um choque no ombro que o limitou severamente no confronto com os Lakers. Depois, veio o afastamento por Covid-19, mesmo após as duas doses da vacina de proteção contra o novo coronavírus.

Enquanto esteve fora ou com seus movimentos restritos, o camisa 3 pôde contar com o auxílio dos companheiros que ajudou a crescer, como Booker e Ayton. Também percebeu que não é o único atleta sujeito a problemas físicos e viu todos os adversários enfrentados no Oeste perderem peças fundamentais: Anthony Davis, dos Lakers, Jamal Murray, dos Nuggets, e Kawhi Leonard, dos Clippers.

Assim, a final ficou novamente ao alcance das mãos, o que reavivou outras memórias ruins. Com os Suns à frente por 3 a 1 na final do Oeste, vieram à mente as situações em que os times de Paul estiveram com a mesma vantagem antes de levar a virada. A mais cruel foi em 2018, quando o armador sofreu lesão e, fora das duas partidas derradeiras da conferência, viu o Golden State Warriors fazer 4 a 3 em seus Rockets.

Por isso, quando o Phoenix ganhou o jogo 4 contra os Clippers, o armador logo avisou em sua entrevista na saída da quadra: “Não quero falar sobre 3 a 1”.

No jogo 5, os Suns perderam em casa, trazendo à tona todo o histórico negativo. Na partida subsequente, porém, Chris Paul tratou de assumir o controle das ações e encarnou o papel de cestinha, que não costuma abraçar: só nos dois quartos derradeiros, anotou 31 pontos, sua maior marca da carreira em um tempo.

O arremesso de meia distância pode estar fora de moda, mas foi útil para Chris Paul despachar o Los Angeles Clippers e, enfim, chegar à final da NBA - Gary A. Vasquez/USA Today

Assim, aquele que era apontado por Kobe Bryant como um dos melhores da história do basquete finalmente ganhou a oportunidade de mostrar isso no grande palco do esporte, as finais da NBA. “Isto é bom, cara. Dezesseis anos. Isto é bom.”

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