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Zeinab Ghasemi Tari

Irã x EUA mostra até onde países ocidentais podem ir para politizar o jogo

E fazem isso enquanto sempre dizem aos outros para separar o esporte da política

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Zeinab Ghasemi Tari

Professora-assistente de estudos americanos na Universidade de Teerã

Em uma noite de verão na França em 1998, a seleção do Irã venceu sua primeira partida de Copa do Mundo com um surpreendente 2 a 1 sobre os Estados Unidos. Em Teerã, houve enormes celebrações: milhares de torcedores, de todas as esferas, foram às ruas comemorar o triunfo nacional.

O confronto Irã x Estados Unidos é indissociável do contexto das relações entre os países. O Irã já foi um aliado próximo e um pilar estratégico para os Estados Unidos. Quando se enriqueceu com receitas do petróleo, tornou-se um mercado para investimentos, armas e produtos dos norte-americanos.

A fim de sustentar sua influência e poder, os Estados Unidos exerceram interferência contínua nos assuntos externos e internos do Irã. O golpe de 1953 contra um primeiro-ministro democraticamente eleito, Mohammed Mossadegh, por agentes da CIA, é conhecido como o início da relação clientelismo entre os países.

Jogadores de Irã e Estados Unidos se perfilam para a execução dos hinos antes do confronto entre as seleções na Copa do Mundo do Qatar - Odd Andersen/AFP

Os laços estreitos foram rompidos com a Revolução Islâmica, em 1979, quando o xá deixou o Irã. As memórias do golpe e as preocupações a respeito de um segundo golpe quando os Estados Unidos deram refúgio ao xá levaram à "tomada da embaixada". Em 4 de novembro de 1979, um grupo de estudantes assumiu a embaixada norte-americana em Teerã e exigiu o retorno do xá para julgamento.

Foi o que ficou conhecido como a "crise dos reféns", que durou 444 dias e extinguiu as relações diplomáticas e consulares Irã-Estados Unidos. Com a invasão do Irã pelo Iraque em 1980, os iranianos viram os Estados Unidos apoiarem Saddam Hussein e Washington inclinar-se ao Iraque. O governo norte-americano tirou o Iraque da lista de terroristas, ofereceu ajuda econômica a Saddam e ajudou o Iraque na produção e no uso de armas químicas contra soldados e civis iranianos.

Embora as sanções contra a nação iraniana estejam em vigor há quatro décadas, a unilateral "pressão máxima" foi reforçada em novembro de 2018, aumentando dramaticamente o sofrimento. Como qualquer outro setor, o esporte do Irã também enfrenta, direta ou indiretamente, repercussões dessas sanções: as equipes não podem comprar equipamentos ou inscrever-se facilmente em competições internacionais, há dificuldades no arranjo de amistosos, e patrocinadores internacionais relutam em cooperar.

Os atletas iranianos têm regularmente vistos negados para participar de eventos pelo mundo, muitas vezes nos Estados Unidos e no Reino Unido. Em junho de 2018, a Nike rompeu com a seleção do Irã devido às sanções.

Recentemente, uma mulher de 22 anos morreu sob custódia da polícia. Mahsa Amini foi presa por violação do código de vestimenta iraniano. A mídia persa controlada pelo Ocidente imediatamente fez acusações de brutalidade policial, levando a protestos e a tumultos apoiados por grupos iranianos financiados por governos ocidentais.

Imagens de Mahsa e as confissões gravadas de seu pai levantaram sérias questões sobre as acusações de brutalidade policial, mas àquela altura as manifestações estavam em pleno andamento e Mahsa Amini já não era mais importante para os manifestantes.

Com a chegada da Copa do Mundo, o time de futebol iraniano foi fortemente atacado pela mídia persa de propriedade do Ocidente e por grupos financiados pelo Ocidente baseados na Europa e na América do Norte. Como muitos dos jogadores viviam no exterior e jogavam em times estrangeiros, vários foram pessoalmente intimidados. Isso fez com que jogadores não ousassem cantar o hino nacional antes da partida contra a Inglaterra, embora os milhares de iranianos no estádio estivessem cantando altamente. A equipe, desmoralizada, foi duramente derrotada em campo.

Porém, antes do segundo jogo, contra o País de Gales, o time se reuniu, recuperou a confiança, cantou o hino nacional junto com a multidão de iranianos no estádio e venceu a partida.

Enquanto os iranianos se preparavam para a partida contra os Estados Unidos, a oposição apoiada pelo Ocidente tinha perdido qualquer credibilidade que pudesse ter entre alguns iranianos, porque queria que o time perdesse. Esse movimento antipatriótico irritou os iranianos e os estimulou a dar ainda mais apoio ao time.

Mas o governo dos Estados Unidos e seus órgãos afiliados começaram sua própria guerra psicológica contra os iranianos. Primeiro, a federação de futebol norte-americana insultou a bandeira iraniana. Depois, a mídia ocidental começou a publicar notícias falsas para desmoralizar o time.

O jogo contra os Estados Unidos não foi um dos melhores do Irã, mas mostrou até onde os países ocidentais podem ir para politizar uma partida, enquanto sempre dizem aos outros para separar o esporte da política.

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