Projeto da família real do Qatar chega ao ápice com Messi e Mbappé na final da Copa

Regime é acusado de usar 'sportswashing' para ofuscar práticas do Estado autocrático

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Doha (Qatar)

Quando terminou a semifinal da Copa do Mundo entre França e Marrocos, na quarta-feira (14), desenhou-se o que seria uma final dos sonhos para o Qatar.

Depois de garantida a presença do argentino Lionel Messi na decisão, foi a vez do francês Kylian Mbappé também confirmar sua vaga.

Será o confronto do jogador sete vezes eleito o melhor do mundo e que, aos 35 anos, tem sua derradeira chance de conquistar o título que lhe falta, contra um dos maiores candidatos a herdar o trono do futebol mundial, já em busca de sua segunda taça da Copa, aos 23 anos.

Messi e Mbappé durante a Copa do Mundo do Qatar
Messi e Mbappé durante a Copa do Mundo do Qatar - Juan Mabromata e Gabriel Bouys/AFP

De acordo com a revista Forbes, a dupla está no topo da lista dos jogadores de futebol mais bem pagos do mundo em 2022. Mbappe lidera o ranking, com US$ 128 milhões (R$ 466 milhões), sendo US$ 110 milhões (R$ 400 milhões) apenas com o futebol. Messi aparece em segundo, com US$ 120 milhões (R$ 436 milhões), sendo US$ 65 milhõs (R$ 236 milhões) com o esporte.

Em comum, ambos vestem a camisa do Paris Saint-Germain, clube de propriedade da QSI (Qatar Sports Investments), subsidiária do fundo soberano do Estado do Qatar.

O fundo é acusado de investir cifras bilionárias em um projeto de "sportswashing" sem precedentes, que envolve até mesmo a escolha do país do Oriente Médio, rico em petróleo e gás natural, como sede desta edição da Copa do Mundo.

As denúncias contemplam todos os significados do termo em inglês, que indica o uso do esporte como forma de "lavar" a imagem de um Estado autocrata, em que o respeito à democracia e aos direitos humanos é questionável, como é o caso do Qatar.

O país tem um longo histórico de afrontar direitos básicos das mulheres, dos trabalhadores migrantes —milhares dos quais foram responsáveis por construir toda a estrutura para a Copa—, além da comunidade LGBTQIA+.

Nesse contexto, o uso da Copa do Mundo como ferramenta de geopolítica vai contra o que a própria Fifa defendeu ao longo da competição —tentar impedir a todo custo o uso político das partidas que promoveu.

Realizada em um país onde é crime ser homossexual, esta edição ficará marcada, por exemplo, pelo veto ao protesto em defesa da comunidade gay que sete seleções europeias pretendiam fazer por meio de uma mensagem na braçadeira de seus capitães.

Os atletas usariam o adereço com as cores do arco-íris e a inscrição One Love (um amor). Depois que a entidade máxima do futebol ameaçou puni-los em campo caso fizessem isso, eles se viram forçados a usar a braçadeira oficial da Fifa. Nela, estava escrito "no discrimination" (não à discriminação).

Em todos os jogos da competição, os torcedores também foram impedidos de entrar nos estádios com camisetas ou bandeiras com as cores do arco-íris. O rigor da fiscalização era tão forte que até mesmo uma bandeira do estado de Pernambuco, com as mesmas cores, chegou a ser confundida pelas autoridades locais.

A presença de Messi e Mbappé na decisão, além do peso do confronto de duas seleções que buscam um tricampeonato mundial, pode ser o retorno do investimento do Qatar no esporte.

As capas de jornais, as reportagens de rádio e TV, além das páginas online serão inundadas no próximo domingo (18) com a história do sucesso e do fracasso em campo, seja de qual for o lado, dando menos peso às denúncias contra o regime.

Nesta semana, por exemplo, a Sky Sports News publicou uma entrevista com Nasser Al-Khelaifi, presidente da Qatar Sports Investments, presidente do Paris Saint-Germain, presidente da European Club Association e um dos homens mais poderosos do esporte global, em que ele falava sobre a Copa.

Al-Khelaifi disse que não suporta políticos que usam o esporte para se promover e que qualquer um que tentar usar as competições para outras agendas "não terá sucesso".

"O que estamos fazendo aqui no Qatar é apenas esporte e futebol", disse ele.

Na entrevista, Al-Khelaifi não menciona o escândalo no centro de uma instituição da União Europeia, revelado na semana passada.

Segundo uma investigação de autoridades belgas, um grupo de pessoas com funções e trânsito dentro do Parlamento Europeu teria recebido dinheiro e favores para defender interesses do Qatar, com o intuito de melhorar sua posição internacional.

Apelidado de Qatargate, o caso levou quatro pessoas à prisão, incluindo uma das vice-presidentes da Casa, a grega Eva Kaili, que também foi destituída do cargo.

Em novembro, parlamentares aprovaram uma resolução que lamentava a falta de transparência no processo de escolha do Qatar como sede da Copa do Mundo.

Na véspera da votação dessa resolução, Eva defendeu o país do Oriente Médio. "A Copa é a prova de como a diplomacia esportiva pode obter a transformação histórica de um país com reformas que inspiraram o mundo árabe", disse ela.

Por meio de seu advogado, ela nega que tenha recebido propina. A investigação já está na extensa lista de denúncias que envolvem o cenário que abrigou os principais jogadores da atualidade, dois dos quais vão se enfrentar neste domingo.

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