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Depois de ir às ruas, jovem promove educação política e cidadã

Gabriel Marmentini, líder da Politize!, foi um dos finalistas do Prêmio Empreendedor Social 2022 na categoria Direitos Humanos e venceu a Escolha do Leitor

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Time de voluntários da Politize! orienta embaixadas da entidade e promove formação política

Time de voluntários da Politize! orienta embaixadas da entidade e promove formação política Renato Stockler/Folhapress

Florianópolis

Gabriel Marmentini, 29, se sente uma grande caixa de ferramentas. E não é à toa, já que desde pequeno costuma puxar os problemas para si e tenta resolvê-los antes de externá-los.

Essa característica foi moldada a partir dos quatro anos, quando viu os pais se separarem e teve até que lidar com mudança de CEP —por cinco anos, deixou Santa Catarina e morou em São Paulo. "Eu ficava mais sozinho. Minha mãe trabalhava fora. E, mesmo quando voltamos para Florianópolis, era mais eu comigo mesmo", afirma Gabriel.

Gabriel Marmentini, diretor-executivo da Politize!, trabalha para aumentar o interesse e o conhecimento sobre política em toda a sociedade - Renato Stockler/Folhapress

Da capital paulista, levou o amor pelo Corinthians e por samba e, de forma autodidata, se esmerou na ilha a tocar o violão que o pai tinha lhe dado.

"Enfim, eu era criança sem figura paterna presente. E nem era rico. Eu nunca pensava em ser nada na vida, dessas coisas de profissões respeitadas."

Mas, impulsionado pela mãe, a representante gráfica Melissa Ribeiro, ele começou a traçar a rota da formação em escola particular, o Colégio Catarinense, em que ela o tinha matriculado com bolsa parcial e que ele sentia um dos únicos a andar de transporte público.

"Terminava um ano, e a gente estava pagando o anterior. Mas minha mãe sempre falou que, estando lá, eu poderia me igualar e superar os outros no empenho e na dedicação."

E assim assumiu para si valores e caráter que o tornaram até exigente e metódico. Aprendeu também a lidar com outras dores, como a da perda do bisavô materno em 2010 — "foi a primeira das duas vezes que chorei"— e ainda talhou o corpo com acidentes de percurso e esportivos, que lhe deram 15 pontos espalhados por cabeça e queixo.

O êxito no colégio o levou a buscar a faculdade. Tentou relações internacionais empresas na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e administração pública na Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina). "Culpei as cotas por não ter passado no vestibular na federal", diz.

Para cidadãos conscientes, a eleição é o primeiro dia de muita participação, construção e fiscalização política pela frente

Gabriel Marmentini

sobre formar cidadãos comprometidos com a democracia

Na Udesc reviu a opinião contra a política que garante vagas para negros e alunos de baixa renda. Lá também descobriu sua veia de gestor e empreendedor social. Tudo após uma disciplina o levar a fazer consultoria —e depois estágio— no Icom (Instituto Comunitário Grande Florianópolis), em jornada que durou um ano e meio.

Neste período de imersões, fez um pouco tudo. Até montou até lixeira comunitária na rua onde vivia e que não era atendida por caminhões de coleta, para participar do programa Guerreiros sem Armas, do Instituto Elos, em Santos.

"Foi incrível. Foi uma das raras vezes em que quebrei uma regra. Eu saí à noite, no meio da favela na Vila Progresso, e fiz uma tatuagem no abdômen", diz ele, que tem outras 15 tattoos.

Uma delas, em homenagem à mãe, que, no mesmo ano que ele entrou na faculdade, descobriu um câncer agressivo na laringe. "Ela estava rouca, e o médico quis investigar. Fizemos a biópsia, que apontou leucoplasia, câncer nível 3. Foram 34 sessões de radioterapia e uma cirurgia, o que a deixou sem voz", conta.

No dia da cirurgia da mãe, diante das incertezas e sem poder fazer mais nada que não torcer, o líder da Politize! diz ter chorado pela segunda vez.

Medindo 1,84 m, "seco e comprido", ele deixou a barba crescer para acabar com "a aura de menino", começou a fazer advocacy em questões envolvendo pacientes de câncer de cabeça e pescoço e estruturou o grupo que apoiou sua mãe.

Em 2013, abriu relação mais efetiva com a política ao ir às manifestações de junho contra o aumento de passagens no transporte público.

"Éramos jovens que saímos à rua sem saber bem o que estávamos fazendo, mas nos sentimos parte de problema que ninguém tinha resolvido e identificamos oportunidade de botar a mão na massa e resolver."

ESCOLHA DO LEITOR

A inquietação de 2013 levou Diego Calegari, Gabriel e outros jovens a estruturarem a Politize!, organização suprapartidária da sociedade civil que nasceu para formar cidadãos conscientes e comprometidos com a democracia e que faz isso por meio da educação política.

"Vimos que a democracia era um valor, um direito humano. E isso deveria ser reforçado todo ano, como vacina", disse Calegari, 35, que hoje é associado da Politize! e é secretário de Educação de Joinville (SC).

A estratégia era divulgar conteúdos políticos educativos gratuitos pela internet, a fim de alcançar o maior número de pessoas possível.

Para o cientista político Humberto Dantas, 47, isso gerou desconfiança. "Errei com a Politize!, e fico feliz com isso, quando me falaram que ensinariam política sem receber nada", diz o diretor-geral do Movimento Voto Consciente.

Dantas se lembrou de uma frase de Cacilda Becker: "Não me peça para fazer de graça a única coisa que tenho para vender". Membro do conselho consultivo da organização, entende hoje que "a Politize! é fundamental e faz algo muito saudável, ao acolher e formar pessoas de diferentes vertentes partidárias".

Disruptivo na política marcada por polarização e ódio, Gabriel também criou a Associação Brasileira de Câncer de Cabeça e Pescoço (ACBG Brasil), que conseguiu que pacientes pudessem ter laringes eletrônicas via SUS.

Na Politize!, notou que não fortaleceria a democracia só com textos na internet. Passou a formar jovens, ao todo 2.384, que viraram multiplicadores e embaixadores em 426 cidades.

Um deles é a estudante Thalia Farinon, 22. "Sou da cidade de Caçador, onde pessoas não falam de política. Veem como futebol: se o pai é Grêmio, você tem que ser também. Na Politize!, parei de ver que só os políticos eram responsáveis pela política e hoje ensino política."

Ao todo 82 milhões de usuários já acessaram os conteúdos da Politize!, que, além formar lideranças, atua com a educação básica. Neste último eixo, com a reforma do ensino médio, já impactou 67.850 professores e estudantes e 1.155 escolas e tem potencial para chegar 2,5 milhões por já estar presente nas redes de ensino de oito estados.

Time de parceiros voluntários da Politize! em grupo de trabalho na Universidade Estadual de Santa Catarina
Time de parceiros voluntários da Politize! em grupo de trabalho na Universidade Estadual de Santa Catarina - Renato Stockler/Folhapress

Tamanho impacto faz com que a organização atraia aportes até de capital estrangeiro. "Mas, quando a gente diz que não é partidário no Brasil, a proposta some." Isso levou a Politize! a mapear 38 hipóteses de gerar renda. "Estamos testando até e-commerce, licenciando a marca..."

Alvo de assédio de políticos de olho no pleito, Gabriel, que dá aulas na Udesc e até joga bola com os alunos, é direto: "Para cidadãos conscientes, a eleição é o primeiro dia de muita participação, construção e fiscalização política pela frente".

Assim, na luta por educação política e diversidade e com desafios pessoais, como nadar da ilha do Campeche a Florianópolis, Gabriel, como uma caixa de ferramentas, tenta consertar o que há de mais democrático no Brasil: "o despreparo da população para desenvolver a democracia".

Projeto em números

- 82 milhões já acessaram os mais de 3.000 conteúdos educativos, em site com 88% do tráfego orgânico
- 67.850 professores e estudantes e 1.155 escolas impactados, com formação e material pedagógico que podem chegar a 2,5 milhões pela organização já estar presente nas redes de ensino de oito estados
- 8.421 jovens selecionados para o Programa de Embaixadores na pandemia
- R$ 10 milhões em recursos mobilizados
- 426 cidades do país contam com pessoas formadas pela Politize!

Conheça os demais finalistas e vencedores do Prêmio Empreendedor Social 2022 na plataforma Social+.

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