Descrição de chapéu Todas Consciência Negra

Corte big chop viraliza nas redes e encoraja quem não quer mais alisar os cabelos

Cabeleireira especializada em cachos naturais dá dicas para quem quer passar pela transição e eliminar a química

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São Paulo

A frase clássica dos pais "Na minha época…" é mala, sim, mas se tem um momento em que vale prestar atenção nela é quando alguém diz que no passado a patrulha dos padrões de beleza era mais pesada que hoje. Existia a ideia de que só alguns corpos e rostos eram bonitos, e meninas e meninos sofriam para se encaixar em aparências que podiam ser antinaturais e violentas.

Os cabelos eram campeões nesse quesito. A cobrança por um estilo padronizado trazia muito do racismo que até hoje as pessoas negras precisam enfrentar, o que significava que, para se ter um "cabelo bonito", era preciso ter um cabelo liso. E dá-lhe progressiva, formol, produtos químicos para alcançar os fios escorridos.

Grazi Gonçalves, cabeleireira especializada em cabelos cacheados e no corte big chop - Divulgação

Daí que a época é outra e dá para, finalmente, amar os cachos. Mas o que muita gente não fazia ideia é que, para voltar ao cabelo natural depois de tanto alisamento, muitas vezes é preciso fazer um sacrifício grande, esperando o cabelo crescer livre até o próximo corte.

E é esse corte o grande astro das redes atualmente: o big chop. Vídeos e mais vídeos circulam no TikTok e Instagram de pessoas indo ao salão para a retirada de toda a parte com química que restou nos fios depois das progressivas.

"O preconceito com cabelo crespo sempre foi muito presente e até hoje ainda é bem relevante, porém as mulheres hoje querem ser livres e mostrar que todo cabelo é lindo", diz Grazi Gonçalves, cabeleireira carioca que atende num salão na Barra da Tijuca e se especializou em cabelos naturais.

Grazi tem quase 500 mil seguidores no Instagram (@_grazigoncalvess), onde posta vídeos de antes e depois de pessoas que passam pelo big chop. "O big chop envolve brancas, pretas e pardas, mas a transição capilar na mulher preta é muito mais dolorida do que na mulher branca, pela questão racial. Hoje, meu público de big chop é 80% de mulheres brancas. Porém, ambas recorrem à transição", afirma.

No salão em que Grazi trabalha, todas as colaboradoras têm cabelos cacheados - JRMFotox/Divulgação

O big chop não é novidade em termos de corte —sempre existiu em salões do mundo todo, a diferença é que agora se tornou viral. Além de a época ser outra, Grazi acredita que a popularidade vem também do fato de que hoje há muito mais profissionais especialistas em cabelo com curvatura, além de referências de pessoas com cabelos naturais na TV e nas artes.

Ela faz em média 50 big chops todos os meses. No salão em que ela trabalha, todas as colaboradoras usam cabelos naturais, o que, para Grazi, ajuda as clientes a se sentirem em casa. "Elas não ficam com medo de alguém oferecer uma escova ou falar que elas deveriam baixar um pouco o volume do cabelo", afirma.

Até agora, ela soube de apenas uma cliente que se arrependeu do big chop e voltou a alisar os fios, porque não se adaptou ao corte. De resto, diz Grazi, "todas amam o resultado". A cabeleireira diz que as histórias das mulheres que ela compartilha em seus perfis servem para dar coragem a quem ainda precisa de uma forcinha para decidir transicionar.

"As mulheres se encorajam por saber que podem também ficar lindas com volume, com cabelo curto, com cabelo raspado, com muitas camadas etc. Elas sempre chegam ao salão dizendo que minha página fez elas se reconectarem com elas mesmas", conta.

"Todas me emocionam. São mulheres que sofreram muitos traumas e preconceitos. Saber que elas estão ali para se verem livres de tudo que passaram é lindo", diz Grazi, que também tem cabelos cacheados e por isso resolveu se especializar neste tipo de fios, depois de largar a carreira de engenheira.

"É uma área que ainda precisa de muita atenção, no sentido de ter mais profissionais. Atendo gente que vem de outros países e outros estados somente pra cortar cabelo comigo. Se parar pra observar, quantos salões de cabelo natural você conhece?".

Tecnicamente, ela acha o big chop o corte mais fácil de todos. Isso porque, depois que o cabelo natural já cresceu um pouco, a parte que sofreu com a química fica aparente, e é só cortar a partir daquele comprimento.

"É um processo lento, que envolve autoestima. A pressa vai ser sua pior inimiga. [Enquanto espera] O que você deve fazer é apostar em penteados, tranças e não fazer chapinha e escova. Tenho muitas clientes que fizeram, e por conta do calor do aparelho e da frequência com que faziam, a parte natural alisou, e aí, você volta à estaca zero", recomenda.

"Dura uns meses, mas o processo passa e vale muito a pena. Se for da sua vontade ver seu cabelo natural, deixe ele vir. Com calma e persistência você vai vencer."

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