Tati Bernardi
A banalização da teta
Tem algo de podre no reino das tetas politizadas na mídia, e não estou falando de estética
Terminei o documentário da Cássia Eller aos prantos lacrimais e fiquei uns dois dias cantarolando "All Star" pela casa. A história é recheada de lindezas dilacerantes como seu filho, aos sete anos, tocando Nirvana no Rock in Rio e o momento em que a dona do vozeirão arrebatador decide ser mais doce e romântica porque o mesmo Chicão, fã de Marisa Monte, pediu. Impossível não se emocionar com essa força da natureza que, tímida e coça sacos imaginários, conseguiu ser amada pela turma do blues, do rock, da MPB, do samba e ainda encerrou sua carreira brilhante com algo inédito e revolucionário, principalmente para o Brasil daquele ano: um juiz aceitando uma união homossexual e dando a guarda do filho de Cássia para Maria Eugênia, sua companheiro por 14 anos.
Quando a cantora mostrava os seios, por tudo o que berrava ou apenas para provocar como uma moleca, aquilo fazia um enorme sentido pra mim. Quando a turma Pussy Riot, Femen e Marcha das Vadias mostra os seios, contra o machismo, a favor de uma história de lutas (pelo direito a: voto, transar por prazer, decidir sobre uma gravidez indesejada, ganhar o mesmo salário de um colega, se proteger contra a violência dentro da própria casa, sair de shortinho agarrado na rua sem aturar abordagens desagradáveis e, o pior, um desgraçado achando que isso dá direito a estupro, curtir a praia fazendo topless, não ter o corpo exposto nas redes sociais por um ex escroto) também estou com elas.
Quando uma atriz, modelo, gostosa em capa de revista, mães do mamaço ou mera cidadã exibicionista (me incluindo aqui quando fiz uso de decote extremo para persuadir atendente da Gol a me colocar num voo já fechado), exibe os seios bem à vontade, também acho coisa bonita de se ver. O peito é nosso e todo aquele blablabá! Escancarar principalmente para "rir de quem se acha muito poderoso ao tentar ver" é fantástico.
Mas confesso um profundo incômodo (prometo avaliar em terapia se mora dentro de mim uma sapata mal resolvida ou uma tiazola reaça do tradição, família e propriedade) quando a teta desnuda me soa mal intencionada. Respeito muito a teta niilista, aquela do "por nada": tava calor, eu tava entediada, eu tava doida, eu tava brincando. Palmas pra essa e também para a teta simplesmente vaidosa. O "sei lá" e o ego purista são Beethoven nesses tempos chatos em que tudo precisa ter "uma bandeira". Mas a teta MAL INTENCIONADA me constrange. A TETA FALSA IDEALISTA merece ser discutida porque banalizar a teta (estar louco pra se exibir mas dizer que é apenas uma teta e que na verdade você está preocupado é com os ursos polares) é cagar na cabeça de Freud. Em alguns casos, temos que nos perguntar: se fossem apenas seios, por que mostrá-los para chamar a atenção para poder dizer isso?
Por teta de má fé chamo as pessoas que decidem "mamilar" de forma engajada quando o tema não tem nada a ver com biquetas. Tipo: mostrar os seios por que os professores ganham mal? Por que os velhinhos merecem melhores aposentadorias? Para se sentir intelectualmente inserida num momento político tenso quando a única real intenção é a capa da "Sexy"? Expulsar uma brasileira gordinha de um grupo de idealistas "expotetas" e não querer que a gente pense que precisa ser 'gatinha padrões beleza' pra poder "tetareivindicar"? Daqui a pouco vão mostrar a teta só porque a Net mentiu de novo que vinha. Tem algo de podre no reino das tetas politizadas na mídia e não estou falando de estética (ainda que, e por isso me pareça tão errado, algumas delas estejam). Minha audiência nunca será imediata tampouco grandiosa enquanto escrever for a minha teta de fora, mas esse feminismo chucro deveria ser visto como uma bobagem (muuuito chata!) um tanto perigosa.