Crítica - Rock
Neil Young soa ridículo à frente de orquestra
Voz frágil e imperfeita do cantor compromete o novo álbum, 'Storytone', que traz temas ambientais em letras fracas
YOUNG ENCARNA O QUE NUNCA FOI: UM CROONER'. IMAGINE RAY CHARLES CANTANDO PUNK OU DEAN MARTIN COM O RADIOHEAD
ANDRÉ BARCINSKI ESPECIAL PARA A FOLHANeil Young sempre fez o que quis. Nos anos 1980, gravou discos de pouco apelo comercial e irritou tanto sua gravadora, a Geffen, que foi processado pelo próprio empregador. A acusação? Fazer discos que "não soavam como Neil Young".
Ao longo de uma carreira de quase cinco décadas, Young sempre confundiu fãs e críticos com guinadas inesperadas de estilo: flertou com a música eletrônica, fez discos conceituais e gravou LPs ao vivo de pura microfonia e barulho.
Nos últimos anos, sua esquisitice só aumentou: em 2009, gravou um disco inteiro --"Fork on the Road"-- sobre um carro; este ano, entrou com um violão numa cabine de gravação dos anos 1940 e saiu de lá com o LP "A Letter Home", uma coleção de "covers" gravada com uma qualidade propositalmente sofrível.
Menos de seis meses depois de lançar "A Letter Home", Young chega com outro projeto inusitado: "Storytone", seu 35º disco de estúdio. São dez canções gravadas com uma orquestra de 92 músicos, coral e uma "big band" de metais e percussão. Fãs de Neil Young já se acostumaram a esperar o inesperado. Mas ouvi-lo cantar à frente de uma orquestra não é simplesmente estranho. É ridículo.
A voz de Young é frágil e imperfeita, e foi dessa imperfeição e aspereza que ele extraiu algumas das interpretações mais marcantes do rock. Em discos como "Tonight's the Night" e "Zuma", clássicos dos anos 1970, sua voz parece que vai se despedaçar a qualquer momento, realçando a emoção e intensidade das canções.
Em "Storytone", Young encarna o que nunca foi: um "crooner". Imagine Ray Charles cantando punk ou Dean Martin à frente do Radiohead, e você terá uma ideia da estranheza que é ouvir Young tentando impor sua voz sobre uma orquestra.
Para piorar, as letras estão entre as mais fracas de qualquer disco do compositor. "Who's Gonna Stand Up" é um libelo ecológico contra o "fracking", ou "fraturamento hidráulico", técnica de perfuração no solo para extração de gás, e parece ter sido escrito por uma criança de dez anos: "Pare o fracking' / vamos salvar a água / quem vai enfrentar as máquinas poderosas?".
Ao longo do disco, seja em canções de temas ambientais --uma obsessão recente do compositor-- ou em letras românticas e confessionais, o ouvinte é brindado com pérolas como "Quero dirigir meu carro até o fim da estrada", "Estou revelando minha alma" e "Pegue minha mão e vamos caminhar até a terra prometida".
Daqui a 50 anos, quando alguém for analisar a obra completa de Neil Young, "Storytone" estará entre os discos mais estranhos --e piores-- de sua carreira.