Lobos invadem palco de Débora Falabella
'Mantenha Fora do Alcance do Bebê' retrata transformação das emoções em produto
Um lobo acompanha o processo de adoção de um bebê. Observa, silencioso, a entrevista de uma mulher com uma assistente social na peça "Mantenha Fora do Alcance do Bebê", segunda parceria da dramaturga Silvia Gomez e do diretor Eric Lenate.
Do lado de fora do prédio da repartição pública, uma superpopulação de lobos invade ruas e calçadas.
"Esses lobos representam o que existe de mais terrível, opressivo e destruidor no ser humano", diz Lenate.
Gomez diz não ter resposta única para explicar o animal em cena. Há muitas significações possíveis. Em todas elas, a presença do lobo instaura uma tensão desestabilizadora. "O fato dele estar em cena altera completamente a relação entre as personagens", diz o diretor.
A invasão do selvagem no terreno da civilização sugere um descompasso do homem com o mundo no qual está inserido. A autora usa o tema da adoção como pretexto para falar sobre um aspecto subterrâneo e urgente.
"O homem se afoga para conseguir se adequar aos padrões de consumo e para se enquadrar ao que se entende por felicidade. A felicidade se tornou um pacote formalizado: é preciso se casar, ter dois filhos, passar férias no resort, colocar sua vida na rede social, etc.", afirma Gomez.
MERCADORIAS
É contra essa formatação do humano que a autora grita. O texto sugere uma equivalência entre o desejo da mulher, interpretada por Débora Falabella, em adotar um bebê e o de possuir qualquer outra mercadoria.
A personagem pede para a assistente social (Anapaula Csernik) "um modelo [de filho] que não dê muito trabalho, tenha um nível médio de energia, não faça muitas perguntas, já venha com certos conhecimentos prévios e não tenha tiques nervosos".
Como escreve o autor e diretor Roberto Alvim no prefácio do texto, que ganha uma publicação e será distribuído gratuitamente aos espectadores após o espetáculo, nesta peça "mesmo as emoções humanas mais nobres são encaradas como valores agregados ao produto-bebê".
O espetáculo inaugura a primeira Mostra de Dramaturgia em Pequenos Formatos Cênicos do Centro Cultural São Paulo. A intenção de Kil Abreu, curador de teatro do espaço, é "olhar a dramaturgia como elemento estruturante da criação teatral".
Outros dois textos foram selecionados: "O Taxidermista", de René Piazentin, que entra em cartaz em 10 de julho, e "Memórias Impressas", de Claudia Schapira, apresentada a partir de 31 de julho.
As inscrições para a segunda edição do edital começam na próxima segunda-feira (15), no site www.centrocultural.sp.gov.br.
MANTENHA FORA DO ALCANCE DO BEBÊ
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 20h; estreia sáb. (13); até 5/7
ONDE Centro Cultural São Paulo - r. Vergueiro, 1.000; tel. (11) 3397-4002
QUANTO grátis
CLASSIFICAÇÃO 14 anos