Clóvis Rossi
A grande tumba de miseráveis
Resolver o problema dos imigrantes clandestinos exige uma grandeza política que não está à vista
Tem toda a razão o "Financial Times" ao escrever, em editorial: "Os europeus não podem chamar civilizados a eles próprios se falharem em dar uma resposta generosa a pessoas que procuram salvação no continente".
Refere-se aos imigrantes que estão morrendo em quantidades dantescas nos naufrágios que se sucedem no Mediterrâneo. O problema é que as respostas que as autoridades europeias estão procurando são insuficientes ou diretamente incapazes de resolver o problema ou pelo menos minimizá-lo.
O premiê italiano Matteo Renzi, chefe de governo do país que é o principal ponto de chegada dos imigrantes, diz que "o problema não é o controle do mar e, sim, destruir os traficantes de homens, que são os novos escravagistas do século 21".
Tem razão, mas é uma proposta inócua. É a mesma coisa que dizer que é preciso eliminar os traficantes de drogas.
Não ocorrerá nem com traficantes de homens nem com traficantes de drogas enquanto houver pessoas dispostas a consumir as segundas ou a arriscar a vida para chegar ao que imaginam ser o paraíso.
Documento da Comissão Europeia, citado nesta segunda (20) pelo jornal "El País", vai mais fundo na questão ao dizer que "a única maneira de mudar a realidade é abordar a situação pela raiz, porque, enquanto houver guerra e dificuldades em nossos vizinhos, as pessoas continuarão procurando um lugar seguro na Europa".
A pergunta seguinte é como ir à raiz da questão. As duas hipóteses imagináveis exigem coragem política para implementar e, no caso de uma delas, visão de estadista, o que não é exatamente uma categoria abundante. Primeira hipótese, defendida, por exemplo, por François Gemenne, do Centro de Estudos e Pesquisas Internacionais, no "Le Monde": abrir as fronteiras europeias, de forma controlada, é claro, a partir do pressuposto de que "uma fronteira fechada não detém um migrante que pagou US$ 5.000 e está pronto para arriscar a vida".
Podendo entrar legalmente na Europa, os migrantes não precisariam arriscar a vida em barcos precários.
O problema é que partidos anti-imigração já estão em alta na Europa, com fronteiras relativamente fechadas. Abri-las mais lhes daria mais argumentos e, potencialmente, mais votos. A maneira definitiva de enfrentar o problema é utópica, admito: uma grande operação da comunidade internacional, nos moldes do Plano Marshall, que permitiu reerguer a Europa dos escombros da 2ª Guerra, para criar o máximo possível de condições de vida digna e segura nos países da África e do Oriente Médio que fornecem a grande massa de imigrantes.
Seria necessário um envolvimento direto de europeus e também dos norte-americanos em situações das quais eles procuram manter distância. Refiro-me aos conflitos em países como Síria, Iraque, Líbia etc., que fornecem parte considerável dos imigrantes, além dos que tradicionalmente fogem da miséria dos fundões da África.
Exigiria uma grandeza que não está à vista, o que significa que o Mediterrâneo continuará a ser uma grande tumba de miseráveis.