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Sem licença para gastar
Situação das contas públicas impõe elevação de alguns tributos e abre espaço para debates nessa área; é preciso limitar expansão de despesas
A irresponsabilidade no trato das contas públicas e o baixo crescimento da economia vão fazer com que o governo federal registre o maior deficit desde 2003. A diferença entre receita e despesa deve chegar neste ano ao equivalente a 5% do PIB, quase R$ 260 bilhões, mais de dez vezes o custo anual do Bolsa Família.
O saldo negativo redunda em aumento da dívida, contribui para a alta de preços, tolhe o impulso empreendedor privado e eleva o descrédito do governo, com o que avançam as taxas de juros.
Conter a sangria tornou-se imperativo. No entanto, dada a má administração, o engessamento das despesas e o ínfimo crescimento previsto para a arrecadação em 2015, não há como evitar a elevação de alguns tributos.
A resignação diante do mal menor não significa tolerar que o aumento de imposto ocorra sem mais; sem que o governo imponha limite, de preferência legal, ao crescimento de suas despesas. Não deve ser concedida licença para gastar.
Dadas as oportunidades restritas no curto prazo, é provável --e lamentável-- que parte dos cortes recaia sobre o investimento em obras, como ocorreu no início do primeiro mandato de Lula.
Estima-se que tal medida contribua com um terço a um quarto da meta de poupança de 2015, de 1,2% do PIB. "Poupança", bem entendido, desconsiderados os pagamentos de juros da dívida.
A equipe econômica de transição estuda quais impostos aumentar de imediato. Vence no final do ano a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), um ganho de receita. De modo gradual, deve voltar a cobrança do tributo sobre combustíveis (Cide). Não se descarta uma alta do IOF (Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros) para pessoas físicas.
Verbas adicionais poderiam ser obtidas com alíquotas maiores sobre bens tidos como supérfluos ou sobre alguns importados. Essas ações ainda não bastarão, porém, para a redução almejada do deficit.
Para 2016, será necessário levantar mais recursos. Desta feita, seria possível contar com tributos novos ou majorações de alíquotas que dependam do Congresso.
Assim, pode-se planejar um aperfeiçoamento social e econômico nessa área --por exemplo, tributando um tanto mais rendas e patrimônios elevados, baixando a carga sobre empresas e reduzindo impostos indiretos.
O aperto fiscal deve ser transformado no início de um programa de reformas sempre adiado; em um plano que limite a expansão da despesa pública, diminua a iniquidade social dos impostos e comece a atenuar a ineficiência econômica do sistema tributário.