Simulação policial
Apontado como operador de um esquema de fraudes milionárias em licitações no Comando-Geral da Polícia Militar de São Paulo, o tenente-coronel José Afonso Adriano Filho tentou a princípio se defender no campo das intenções.
"Assumo tudo o que fiz. Tudo foi feito somente para o bem e jamais para o mal", declarou a esta Folha. Procurava descrever como os desvios, realizados em 2009 e 2010, ocorriam para bancar despesas da corporação; não se destinavam a enriquecimento próprio. Estava em sua casa, em um condomínio em Itu, a 101 km da capital.
Dias depois, contudo, nova reportagem mostrou que taxas daquele mesmo condomínio haviam sido quitadas com um cheque de uma das empresas envolvidas no esquema. Emitido em 2012, no valor de R$ 14.320, garantiu o pagamento antecipado de quantias referentes a quatro imóveis pertencentes à família de Adriano Filho.
O oficial, dessa vez, preferiu não se manifestar --e suas explicações iniciais tornaram-se ainda mais objeto de desconfiança.
Segundo investigações internas da PM, identificaram-se irregularidades em todas as 458 licitações analisadas. Durante dois anos, gastaram-se ao menos R$ 10 milhões em compras fraudulentas de itens como papel higiênico, clipe para papel e programa de computador.
Em um dos casos mais chamativos, a empresa contratada a fim de fornecer peças para a manutenção de veículos havia ficado em 16º lugar na concorrência. Recebeu R$ 1,7 milhão e não entregou nenhum material.
O tenente-coronel Adriano Filho confirmou a aquisição simulada. O objetivo --como se os supostos fins pudessem purgar a ilegalidade dos meios-- seria saldar dívidas por serviços prestados anteriormente de forma extraoficial. Na sindicância, entretanto, não há comprovação do débito alegado.
Não terminam aí, todavia, os aspectos a serem esclarecidos. Em suas declarações, o oficial sustentou que agiu por ordem ou com o conhecimento de seus superiores. Quais? "Todos os superiores", enfatizou, sem citar nomes.
A atual cúpula da Polícia Militar não disse se vai abrir nova investigação para apurar eventual participação de outros oficiais.
Os coronéis Roberto Diniz e Álvaro Camilo, que foram comandantes-gerais da PM à época das fraudes --nas gestões de José Serra e Alberto Goldman, ambos do PSDB--, têm a oportunidade de mostrar seu interesse em eliminar todas as suspeitas.