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21/12/2012 - 04h50

Crítica: Ciclos da vida guiam experiência notável do filme "As Quatro Voltas"

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INÁCIO ARAUJO
CRÍTICA DA FOLHA

Em "As Quatro Voltas" existe, primeiro, um velho pastor solitário. Ele se arrasta com seu rebanho durante o dia e à noite toma seu remédio. Podemos até acreditar que tal remédio beira à insânia (pó da igreja misturado a água). Mas o que acontecerá no dia em que faltar o remédio?

Eis o primeiro episódio, a primeira vez ou o primeiro ciclo, como se prefira, do magnífico filme do italiano Michelangelo Frammartino. Embora milanês, o diretor situou seu filme na Calábria, região pobre da Itália. E numa aldeia que parece isolada do mundo.

Divulgação
Cena do filme italiano "As Quatro Voltas", de Michelangelo Frammartino
Cena do filme italiano "As Quatro Voltas", de Michelangelo Frammartino

Se o primeiro episódio trata da velhice, o segundo começa pelo nascimento de uma ovelha e segue até o momento em que pode, enfim, caminhar com os outros animais.

Essa é a primeira real surpresa que o filme causa: é um episódio referente a animais e do qual o homem se acha inteiramente excluído. Vemos então que Frammartino, um pouco à maneira de Apichatpong Weerasethakul, é desses cineastas que não tomam mais o homem como centro de todas as coisas.

Há algo de novo sob o sol. Frammartino pode não ser radical como Apichtapong, que convoca florestas, fantasmas, animais, homens, macacos sobrenaturais para participar de uma conversação. Mas é nessa balada que parece seguir.

Ganhamos mais certeza disso no episódio seguinte, onde tudo que importa é uma árvore. Numa região de montanha ninguém protestaria contra ela ser cortada para ser usada numa festividade. Mas nós, espectadores, sofremos intensamente ao ver sua queda e, depois, ela ser escalpelada: há uma agressão contra outra vida que o filme torna quase insuportável.

Porque nós, homens, não somos também senhores da natureza ou das matas. Talvez seja inevitável cortar algumas árvores, mas também deveria ser inevitável sofrer por elas (assim como pelos animais ou pelos outros homens). Assim como inevitável é essa árvore, seus restos, ser depois transformada em carvão, ou seja, em energia. O ciclo assim se completa (se bem entendi).

Seria impossível não notar, no entanto, o personagem talvez mais interessante desse filme: um pequeno cachorro. Um cãozinho anarquista, capaz de provocar alguns desastres e desorganizar o que parece uma estabilidade secular.

AUDÁCIA FASCINANTE

Dito assim, parece um filme chatinho. Porém, é de uma audácia fascinante: o tempo longo dos planos, em vez de tornar as coisas lentas, parece encontrar o seu dinamismo e o suspense que cerca cada um desses momentos só aparentemente insignificantes.

Uma das experiências cinematográficas mais notáveis dos últimos tempos, "As Quatro Voltas" corre, porém, o risco do cinema italiano atual: criar autores que brilham em um ou dois filmes antes de se apagarem.

AS QUATRO VOLTAS
DIREÇÃO Michelangelo Frammartino
PRODUÇÃO Itália, 2010
ONDE Espaço Itaú Augusta
CLASSIFICAÇÃO livre
AVALIAÇÃO ótimo

 

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