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Ensaio de Eduardo Jardim analisa Callado, Gal Costa e Ana Cristina César

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Crédito: Patrícia Santos - 11.abr.1995/Folhapress O escritor Antonio Callado na Academia Brasileira de Letras.*** NÃO UTILIZAR SEM ANTES CHECAR CRÉDITO E LEGENDA***
O escritor Antonio Callado na Academia Brasileira de Letras

MAURÍCIO MEIRELES
COLUNISTA DA FOLHA

O primeiro capítulo de "Tudo em Volta Está Deserto", do filósofo e crítico literário Eduardo Jardim, se chama "Literatura É Documento" –nele, o autor reconstrói e analisa o período histórico em que foi publicado "Quarup", de Antonio Callado.

Já o último trata da obra de Ana Cristina César, poeta autora de "A Teus Pés", que com sua obra afirmava o contrário –literatura não é documento–, embora jogasse criticamente com o elemento documental, explorando gêneros como a carta e o diário.

No meio dos dois, Jardim reflete sobre o show "Gal a Todo Vapor", encenado pela cantora nos anos 1970.

A escolha dos três assuntos, claro, não é fortuita.

Jardim trata da arte brasileira em três momentos diferentes da ditadura militar: "Quarup" sai em 1967, às vésperas do AI-5; o show de "Gal a Todo Vapor", em 1971, quando a barra já estava pesadíssima; e "A Teus Pés", de Ana C., em 1982, às vésperas da abertura.

Callado representa a busca por uma literatura de confronto à realidade política, em que o tema da identidade nacional –que atinge seu ápice com o modernismo– ainda é importante.

Já o show de Gal, cheio de melancolia, diante do endurecimento do regime, acontece após o tropicalismo ser sufocado –Caetano e Gilberto Gil já estavam exilados– e a identidade brasileira deixar de ser uma questão.

"Nosso século 20 modernista termina ali no fim dos anos 60. O tropicalismo ainda formula esse tema de forma extremamente inteligente. O que acontece depois? Não sei ainda. Temos que fazer o trabalho de desenhar esse perfil", diz Jardim.

Ana C., por sua vez, traz um recolhimento da literatura brasileira na intimidade, com dilemas estéticos já bem diferentes dos de Callado.

"Em vez de dizer 'Tadinha, só podia fazer aquela poesia íntima [por causa da ditadura]', quis resgatar a positividade da poesia dela", diz Jardim. "Digo que eu sou Ana Cristina César. Sinto-me muito mais próximo da voz dela do que da dos outros."

"Ana está liberando a imaginação, fazendo uma exploração em profundidade. O que sinto falta no momento atual é a imaginação, a possibilidade de formular algo além das alternativas postas. Tenho certeza que a imaginação é mais reveladora do que uma literatura documental."

Para o leitor acostumado à Ana C. poeta, o livro apresenta também seu lado de crítica literária e tradutora.

Embora o ensaísta não chegue a traçar uma relação com a atualidade, as questões apresentadas pelas obras de Callado e Ana C. estão de novo a pleno vapor, num momento em que a política volta a ser um dilema para a literatura. E o documental –ou uma leitura da arte como documento, à esquerda e à direita– se retorna aos debates.

Mesmo Callado, como Jardim mostra em seu livro, não tinha uma visão ingênua do aspecto documental. "Essa geração teve uma reação militante a 1964. Mas 'Quarup' apresenta uma aposta e quer discuti-la. Ele é cheio de questionamentos."

TUDO EM VOLTA ESTÁ DESERTO
AUTOR Eduardo Jardim
EDITORA Bazar do Tempo
QUANTO R$ 42 (128 págs.)

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