Descrição de chapéu Artes Cênicas

Em tom de fábula, peça faz metáfora sobre crise econômica portuguesa

'Tristeza e Alegria na Vida das Girafas' foi encenada no Festival de Teatro de Curitiba

Os atores Thomas Quillardet (esq) e Maloue Fourdrinier (dir), na peça 'Tristeza e Alegria na Vida das Girafas'
Os atores Thomas Quillardet (esq) e Maloue Fourdrinier (dir), na peça 'Tristeza e Alegria na Vida das Girafas' - Lenise Pinheiro/Folhapress
MLB
Curitiba

Girafa é uma menina de nove anos. Tem altura maior do que a média (daí o apelido animalesco) e uma esperteza incomum. Gosta de jogos de palavras e de questionar as explicações filosóficas do pai.

Mas, quando a crise chega à sua casa, decide partir em aventura. É preciso encontrar o primeiro-ministro de Portugal para criar uma lei que a permita roubar um banco e, então, garantir uma assinatura vitalícia do Discovery Channel.

Girafa é também uma metáfora da crise portuguesa. É a personagem central de “Tristeza e Alegria na Vida das Girafas”, do dramaturgo lusitano Tiago Rodrigues.

O espetáculo, escrito em 2011, ganhou tradução francesa da companhia 8 Avril, montagem apresentada no último fim de semana no Festival de Teatro de Curitiba.

Rodrigues narra tudo em tom de fábula, pelos olhos da garota. Ela perdeu a mãe há pouco e vê seu pai, ainda que um otimista, agoniado pela falta de emprego e pelas contas que acumulam.

Mas não se busca uma ilusão ou uma completa ingenuidade. Girafa tem corpo e jeito de adulto (é interpretada pela francesa Maloue Fourdrinier). Quando encontra estranhos na rua, não hesita em perguntar, antes de qualquer interação, se seriam pedófilos.

Seu ursinho de pelúcia, a quem dá o nome de Judy Garland, é na verdade um marmanjo (Christophe Garcia) que desata a falar palavrões.

“A porta de entrada é a fábula, mas a peça vai te levando para outros caminhos”, diz o diretor Thomas Quillardet, que também traduziu o texto. “Quando você coloca uma criança para ver o mundo, tem ingenuidade, mas verdades também.”

Na falta do canal pago, a menina sai à rua numa Lisboa em crise. Vai ao banco e tem o pedido de dinheiro negado. Questiona por que não pode ser ajudada se, já em seu slogan, a instituição diz: “O teu banco para todas as ocasiões”.

Finalmente chega ao primeiro-ministro, mas logo pensa se a saudade que sente é de seu programa de girafas ou da mãe que se foi. “É uma menina que aprende sobre os absurdos do mundo e, com isso, aprende também a fazer um trabalho de luto”, afirma Quillardet.

Em sua encenação, o francês reforça o tom fabular. Cria um cenário repleto de tecidos e traquitanas que sobem e descem por cabos manuais, como se numa brincadeira de criança. Como a casa de Girafa e seu pai (interpretado pelo próprio Quillardet), feita como uma grande barraca de camping e que cuja estrutura se movimenta com os suspiros dos moradores.

Também usa alguns efeitos de som para ilustrar a narração da criança. Quando ela fala de sua corrida pelas ruas, manipula sapatos sobre um montinho de pedras, que tem o som captado. Ao seu lado, Judy Garland representa a respiração ofegante apertando uma bomba de ar, dessas de encher balão.

A jornalista MARIA LUÍSA BARSANELLI viajou a convite do Festival de Teatro de Curitiba.

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