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Artes Cênicas teatro

Posição autoral de criadores é quase imperceptível em 'A Procura de Emprego'

Texto do francês Michel Vinaver tem direção de Rubens Rewald e Jean-Claude Bernardet

Paulo Bio de Toledo

A Procura de Emprego

  • Quando Sex. e sáb., às 21h, dom., às 18h.Até 10/6
  • Onde Sesc Santo Amaro, r. Amador Bueno, 505
  • Preço R$ 9 a R$ 30
  • Classificação 12 anos

A peça "A Procura de Emprego", escrita pelo francês Michel Vinaver no início da década de 1970, é protagonizada por Fage, um diretor de vendas que foi descartado pelo mundo do trabalho e acumula fracassos ao tentar se reintegrar.

Sempre atual, o assunto aparece aqui também na organização estrutural da peça. As cenas são marcadas por intensa fragmentação: diálogos recortados e entrecruzados, situações justapostas, fluxo desconcertante de falas que mal conseguimos identificar a quem se dirigem.

É como se a sensação de vertigem causada pela forma estilhaçada do texto espelhasse um mundo cada vez mais estranho e hostil ao protagonista.

A montagem dirigida por Rubens Rewald em conjunto com Jean-Claude Bernardet se entusiasma por esse procedimento formal do texto e busca evidenciá-lo sem cair na armadilha de tentar completar as elipses da peça.

Peça "A Procura de Emprego", em cartaz no Sesc Santo Amaro
Cena da peça "A Procura de Emprego", em cartaz no Sesc Santo Amaro - João Caldas Filho/Divulgação

Nesse sentido, o elenco consegue uma dinâmica veloz e interessante para lidar com a sobreposição de falas. Mas, por outro lado, a concretude de cada pequeno fragmento, sua verdade atomizada, as relações entre as personagens e, principalmente, as suas correlações sociais e históricas se tornam cada vez mais indiferentes no decorrer da cena. Tudo soa mais ou menos igual.

A proposta espacial da montagem amplifica essa sensação. Os atores estão confinados num pequeno quadrado demarcado com fita no chão. Eles se movem de um lado para o outro e não saem do lugar. O confinamento iguala todos eles. E tal indistinção negligencia o tema do mundo do trabalho em prol de velhas questões existenciais como a incomunicabilidade, a solidão contemporânea, a vida repetitiva e sem sentido etc.

Características específicas e contraditórias que posicionam socialmente as personagens na peça de Vinaver tornam-se somente estereótipos no espetáculo atual. A filha Nathalie (Bianca Lopresti), uma jovem de classe média vivendo o rescaldo de 1968, aparece apenas como um garota de ideias lunáticas. Ou seja, a especificidade histórica da personagem é deixada de lado em prol da paródia de uma adolescência idealista e egocêntrica.

De modo geral, as referências contextuais à França da década de 1970 não são desdobradas tampouco adaptadas para a atualidade local. Nesse sentido, é sutil e quase imperceptível a posição autoral dos criadores do espetáculo.

A ênfase no mecanismo formal e no comentário existencial e universalista da montagem dilui a característica crítica do debate ligado ao mundo do trabalho. Muito embora a peça de Vinaver já apresente tal tendência à abstração, o espetáculo remove de vez o lastro histórico e social da dramaturgia fragmentada.

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