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Artes Cênicas

Dramaturgia não está à altura de Tonico Pereira, que celebra 50 anos de carreira

Fraco como crítica política, 'O Julgamento de Sócrates' é baseado na obra de Platão

BRUNO MACHADO

O Julgamento de Sócrates

  • Quando Sáb., às 21h, dom., às 19h. Até 9/9
  • Onde Teatro Nair Bello - shopping Frei Caneca, r. Frei Caneca, 569
  • Preço R$ 60
  • Classificação 12 anos

"O Julgamento de Sócrates" busca ser, a um só tempo, celebração do meio século de carreira do ator Tonico Pereira e síntese da sua trajetória; encenação da condenação do filósofo, e comentário sobre a situação política brasileira. A dramaturgia de Ivan Fernandes, que assina a direção ao lado do ator, contudo, cumpre apenas parte dos objetivos.

Além da importância para a história do direito, a sentença que recaiu sobre Sócrates pode ser lida como um dos primeiros exemplos do uso arbitrário da lei contra aqueles que recusavam as normas.

Sob ótica idealista, o julgamento reafirma a força do livre pensamento frente à inflexibilidade das instituições.

Há drama e universalidade intrínsecos ao tema, que são pouco explorados pelo texto. Livre adaptação de "Apologia de Sócrates", na qual Platão expõe a defesa do mentor, acusado de heresia e corrupção da juventude, a dramaturgia pouco situa a plateia sobre o pensador. Prefere estabelecer relações entre a Atenas antiga e o Brasil contemporâneo.

De fato, o texto se limita a elencar os diversos escândalos que frequentam as manchetes políticas e enfileirar, indiscriminadamente, nomes de variadas tendências —do presidenciável Guilherme Boulos ao presidente Michel Temer.

O discurso resultante é vago e difuso, e a crítica endereçada ao ambiente político soa superficial e reducionista.

Tais deficiências são realçadas pelos elementos cênicos. É comum que monólogos sejam encenados economicamente, a fim de valorizar o intérprete e a palavra.

Neste espetáculo, ainda que evidenciem a potência de um ator experimentado, luz, cenário e figurino, minimalistas, ressaltam a fragilidade da dramaturgia. Por vezes, a encenação lança mão de recursos primários, como uma gutural voz divina em off.

O prólogo alcança níveis maiores de densidade e poesia. O ator parece se desvencilhar da dramaturgia e, em tom autobiográfico, rememora a juventude na Campos dos Goytacazes natal, onde, vendo júris, se interessou pelo direito. Nesse momento, ainda reverencia seus mentores.

Embora não supra as deficiências do espetáculo, Tonico é habilidoso com a palavra. Munido de poucos recursos, demonstrando grande vigor cênico do alto dos seus 50 anos de carreira, consegue prender a atenção do público e com ele travar um sincero diálogo.

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