Descrição de chapéu Artes Cênicas

Pouco exportado, teatro brasileiro mira internacionalização

Produções nacionais buscam aproximação com programadores estrangeiros e apoio do governo para criar pontes com festivais

Maria Luísa Barsanelli
São Paulo

Ainda que de produção profícua —só nesta semana, há mais de cem espetáculos em cartaz apenas na cidade de São Paulo—, o teatro brasileiro passa um tanto despercebido fora do país.

"Lá fora, conhece-se coisas muito boas feitas no Brasil, como [os trabalhos dos diretores] Antunes Filho, Cacá Rosset e Lia Rodrigues. Mas não há uma dimensão da variedade da produção e do que está sendo feito de novo aqui", comenta o produtor teatral Guilherme Marques. "E falta esse conhecimento porque os artistas não estão circulando."

A dificuldade em exportar peças, dizem gestores culturais, deve-se em especial à falta de políticas públicas para divulgar o trabalho brasileiro no exterior, algo já consolidado nos vizinhos Chile, Colômbia e Argentina, e o incentivo à arte na educação.

O produtor Paulo Feitosa identificou em 2014 que o orçamento de toda a cultura chilena (algo como R$ 400 milhões) era menor do que o que foi investido, na mesma área, no estado do Ceará.

Ainda assim, o Chile, que tem um programa de mobilidade de artes cênicas e pontos com festivais de teatro pelo mundo, conseguiu exportar mais peças que todo o Brasil.

Pensando nisso, artistas têm se mobilizado para encurtar o caminho até palcos estrangeiros. E têm visto os festivais de artes cênicas brasileiros como ferramenta para a venda de produções nacionais.

Seguem exemplos como o do Chile, cujo festival Santiago a Mil teve, em sua última edição, cerca de 120 trabalhos chilenos, ou 70% das peças encenadas na mostra, circulando depois para fora do país.

Neste ano, a MITsp (Mostra Internacional de Teatro de São Paulo) inaugurou o projeto MITbr, voltado à internacionalização brasileira. Para tanto, convidou programadores estrangeiros a ver peças nacionais, selecionadas pela mostra paulistana. Os trabalhos foram encenados com legenda em inglês e acompanhados de um dossiê sobre a obra.

"Quando conversamos com os programadores, disseram que veríamos resultados depois de cinco anos", afirma Guilherme Marques, que é gerente de produção e um dos idealizadores da MITsp. "Mas a resposta foi quase imediata, ficamos bem surpresos."

Depois da experiência, a mineira Grace Passô foi convidada a levar seu monólogo "Vaga Carne" a três festivais estrangeiros. Algo semelhante aconteceu com os espetáculos "Caranguejo Overdrive", da carioca Aquela Companhia, e "DNA de DAN", do performer paranaense Maikon K.

Algumas mostras nacionais também têm se organizado, principalmente em torno do recém-criado Núcleo de Festivais Internacionais de Artes Cênicas no Brasil, para conseguir apoio de setores do governo, como o Ministério das Relações Exteriores, e de órgãos como a Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos).

A ideia é promover o trabalho brasileiro lá fora e também trazer estrangeiros para conhecer a produção nacional.

Um desses nomes é Iva Horvat, produtora croata radicada em Barcelona, que dirige a agência Art Republic, especializada em estratégias e mobilidade das artes performáticas.

Neste ano, ela está circulando por seis festivais nacionais —além da MITsp, o brasiliense Cena Contemporânea, o pernambucano Cambio, o gaúcho Porto Alegre em Cena, o carioca Tempo_Festival e o baiano Fiac. Em cada um, trabalha com artistas locais, ministrando aulas de como internacionalizar cada trabalho.

"Viajando pelo Brasil, percebi que há muitos trabalhos que não são internacionalizados, mas têm grande potencial para isso", afirma Horvat.

Segundo ela, porém, a questão brasileira não é tão diferente da de outros países. Em geral, há muitos artistas com "trabalhos prontos para serem apresentados, mas que não conseguem ser vendidos".

"O artista tem uma dificuldade de se definir bem. Para se internacionalizar, é preciso entender não só por que faz o trabalho, mas também para quê. Assim, consegue se comunicar com outro festival, entender onde e como pode encaixá-lo numa mostra estrangeira", diz a produtora.

Outra frente do Núcleo de Festivais está na dramaturgia. Para o ano que vem, trará ao país textos franceses (e brasileiros, em troca, serão traduzidos para a língua de Molière). Depois virão holandeses, argentinos e nórdicos.

Também trabalham em estudos que demonstrem o retorno econômico de mostras teatrais no Brasil —em festivais franceses, por exemplo, cada euro investido traz em média 7 euros de retorno.

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