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Ama é chamada a mulher que mergulha no mar, ficando sem respirar por alguns poucos minutos para recolher algas e outros tesouros do mar. É uma profissão tradicional no Japão, embora tenha sérios riscos.
O que acompanhamos em "Ama-San", filme japonês da portuguesa Cláudia Varejão, rodado com equipe luso-nipônica e vencedor do DocLisboa de 2016, é a vida de três dessas amas: Mayumi Mitsuhashi, Masumi Shibahara e Matsumi Koiso.
Elas vivem em uma vila de pescadores japonesa chamada Wagu, onde o tempo passa deliciosamente devagar e o contato com a natureza é primordial, como não poderia deixar de ser.
O cotidiano dessas mulheres adquire interesse conforme tomamos conhecimento dos costumes do local, num tempo especial, o tempo da familiarização. A familiaridade é que nos permite o envolvimento com elas. Logo, o filme cresce com o passar do tempo.
As imagens submarinas são deslumbrantes, mas elas só funcionam porque não dominam o filme, e este seria outro se dominassem. Há um equilíbrio no uso dessas imagens que faz perceber que a diretora está menos interessada nessa beleza natural do que na vida das amas.
Varejão quer entender o Japão dos pescadores e das pequenas vilas, seus costumes, pela observação da vida de suas trabalhadoras, e isso faz toda a diferença. Desse processo saímos entendendo melhor também a vida em um Japão escondido, bem menos óbvio.
"Ama-San" é um documentário observacional. Como tal, importa demais a posição da câmera, o tempo que cada imagem dura na tela, a disposição das pessoas no espaço, essas coisas que os depreciadores do formalismo costumam ignorar. É a forma que determina o sucesso ou o fracasso de um filme.
Felizmente, a diretora demonstra que tem olhar. Sabe usar a câmera no lugar desse olhar, um lugar que tem de ser privilegiado, o melhor lugar possível. E assim, constrói um belo e inesperado filme.
Belo principalmente pelos motivos formais apontados acima. Podem passar despercebidos pelo espectador mais envolto com as personagens. Mas estão presentes, a segurar nosso interesse sem que saibamos exatamente por quê.
Qualquer espectador, contudo, ficará maravilhado com a linda sequência dos vagalumes, ou com o ritual de preparação para os mergulhos dessas mulheres.
Inesperado porque essas vidas singelas, pacatas, poderiam fazer o filme cair no oportunismo ou na insignificância, como costumamos ver em recentes "docudramas" (os velhos documentários dramatizados que são tudo, menos novidade), que não sabem trabalhar com a beleza de um cotidiano.
Graças à ausência desses descuidos, e à sensibilidade da diretora, somos agraciados com o quanto essas vidas têm de brilhantes.
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