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Produtora Brasil Paralelo revisa a história em filmes e livros com visão de direita

Grupo gaúcho faz frente quanto ao que acredita ser uma predominância do ideário da esquerda no universo da cultura

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Montagem com personagens do impeachment em vídeo da produtora Brasil Paralelo
Montagem com personagens do impeachment em vídeo da produtora Brasil Paralelo - Reprodução
São Paulo

Para derrotar as ideias esquerdistas, é preciso ir além da política e enxergar a história, a cultura e a educação como campos de batalha. Caso contrário, o conservadorismo que saiu vitorioso na eleição de 2018 terá sido apenas uma pequena onda perdida numa maré vermelha.

A essa missão se dedica a Brasil Paralelo, produtora de vídeos surgida em 2016 como um projeto quase estudantil de amigos do curso de administração da Escola Superior de Propaganda e Marketing, em Porto Alegre. 

Em três anos, a empresa cresceu rapidamente, ao ponto de ter se firmado como uma referência na difusão de ideias de direita neste primeiro ano de governo Jair Bolsonaro.

“Somos bastante combativos com o comunismo, da mesma forma que dá para ser combativo com o nazismo. Essas ideias foram testadas, e repetidamente aconteceram tragédias em massa”, diz Lucas Ferrugem, 27, um dos três sócios da Brasil Paralelo, ao lado de Filipe Valerim, 26, e Henrique Viana, 28.

Em 31 de março deste ano, aniversário do golpe militar, a produtora lançou “1964: O Brasil entre Armas e Livros”, documentário que justifica a derrubada do presidente João Goulart como um movimento de reação à ameaça comunista. A produção foi elogiada pelos filhos do presidente Bolsonaro e incensada em círculos da direita.

Entre os depoimentos do filme, que teve pré-estreias em diversos cinemas e registrou 6 milhões de acessos online, estão figuras de proa do conservadorismo como o ideólogo Olavo de Carvalho. No entanto, é praticamente consensual entre historiadores que, apesar do flerte de Goulart com o populismo de esquerda, nunca houve ameaça real de uma revolução comunista do estilo cubano no Brasil.

 

Para dar conta dos múltiplos projetos, a Brasil Paralelo está se expandindo. Há dois meses, trocou Porto Alegre por um escritório na Vila Olímpia, bairro nobre de São Paulo. Seus cerca de 20 funcionários devem crescer para 30 até o fim do ano.

A base de consumidores de seus produtos estava em cerca de 20 mil pessoas no início do ano e subiu, mas a produtora não revela números atuais. Pelo seu site, pode-se comprar acesso a vídeos, cursos de ensino à distância com pensadores conservadores e ebooks. Há assinaturas anuais que variam de R$ 480 a R$ 687.

Em três anos de existência, a Brasil Paralelo produziu 26 vídeos, todos online, num total de 14 milhões de acessos. A empresa começa agora a adentrar plataformas de vídeo sob demanda. O filme sobre o golpe de 1964 deve estrear em breve na Amazon Prime Video.

No momento, estão sendo tocados simultaneamente mais dois documentários pela produtora. Um deles, ainda sem nome, discutirá os problemas da educação brasileira, que na visão conservadora patina em índices internacionais por causa da influência de pensadores marxistas como Paulo Freire. Está 
previsto para o fim do ano.

“A Última Cruzada” é o projeto mais ambicioso e retratará eventos que teriam sido negligenciados pela historiografia de esquerda. Orçado em R$ 2 milhões, prevê a exibição do filme em escolas. Um crowdfunding foi iniciado e arrecadou R$ 450 mil em menos de um mês. No Twitter, Eduardo Bolsonaro
recomendou que seus seguidores apoiassem o projeto. 

A Brasil Paralelo também está diversificando suas áreas de atuação. Já lançou dois livros com noções de livre mercado para crianças, a partir do licenciamento de obras americanas. Um deles é uma adaptação de “A Lei”, de Frédéric Bastiat, que dá base à ideia de que o Estado cobrar impostos é algo moralmente equivalente a roubo. “Uma parte imensa do nosso público são pais preocupados com a qualidade educacional dos filhos”, diz Ferrugem.

A próxima fronteira é a da ficção. No último dia 19, conforme revelou a coluna Mônica Bergamo, os sócios da Brasil Paralelo tiveram uma reunião com Roberto Alvim, diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte, conhecido por ter se aproximado do bolsonarismo.

“Fomos nós que o procuramos”, diz Ferrugem. Queriam indicações de atores e diretores que aceitassem trabalhar em filmes de ficção com temas históricos e culturais, até agora abordados apenas em 
documentários.

Ser vista como uma empresa de viés conservador cria alguns obstáculos, afirma ele. “Há uma escassez de atores que topam trabalhar com ideias que não sejam alinhadas à política da esquerda”, diz.

Na conversa, surgiu a ideia de a produtora realizar eventos para a Funarte, que poderiam ser exibições de filmes seguidas de debates em teatros federais. Seria uma doação, sem contrapartida de dinheiro público, que a produtora rejeita. “O financiamento de nossos projetos é totalmente privado e vai continuar assim”, diz Ferrugem.

Por meio de sua assessoria, Alvim confirmou o teor do encontro. “Uma das ideias que surgiram se relaciona com a exibição de filmes da Brasil Paralelo, seguida de debates com a plateia”, afirmou.
Os eventos aconteceriam em horários livres da programação dos teatros federais, como uma atividade formativa, segundo Alvim.

Em um de seus vídeos de apresentação, a Brasil Paralelo diz que nasceu do inconformismo. “Pessoas com análises lúcidas não tinham espaço na mídia tradicional”, diz um trecho.

O cardápio de pensadores conservadores inclui, além de Olavo de Carvalho, nomes como o ensaísta e colunista da Folha Luiz Felipe Pondé, o escritor Flávio Morgenstern e o youtuber católico Bernardo Küster.

Nos vídeos, uma temática é comum: a infiltração de ideias de esquerda na mídia, na academia e no meio cultural. É recorrente a crítica a um suposto complô de partidos de esquerda, reunidos no Foro de São Paulo, para promover ideias marxistas.

Apesar de veicular valores parecidos com aqueles em voga no alto escalão do governo, a Brasil Paralelo diz não se ver como uma produtora símbolo da era Bolsonaro. A relação com o governo, afirma Ferrugem, é zero. “É difícil alguém ter tão pouca proximidade com eles como a gente.”

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