Descrição de chapéu

Não há nada mais saboroso do que ler os textos de Nina Horta

Resta reler o que ela escreveu e apreciar com a mesma volúpia com que repetimos nossos pratos preferidos

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Não há nada mais saboroso no mundo do que ler os textos de Nina Horta. E não somente sobre comida, mas foi em torno deste tema que, há mais de 30 anos, sugeri à Folha que ela me substituísse numa coluna que eu deixaria de escrever no caderno Casa & Companhia, editado por Lilian Pacce.

Foi o começo de uma colaboração que nunca mais parou. Pouco depois o jornal lançou o caderno Comida, que eu editava, e que tinha um espaço cativo para as crônicas de Nina. Com o fim do caderno, anos depois, ela continuaria a servir sua prosa fina nas páginas da Ilustrada.

Escrevia com o coração, com a alma e com uma sabedoria que não conseguia conter nos rígidos formatos de um projeto editorial. Que dolorido era, quando eu era seu editor, ter que fazer seus textos caberem no espaço estipulado. Como me atreveria a cortar qualquer palavra, que nunca era óbvia, nunca era gratuita, nunca era demais?

Nina adorava comida, que ademais, até poucos anos atrás, era seu objeto principal de trabalho —ela era, na época, a alma do bufê Ginger, cujas ideias inovadoras ela penava para esgueirar marotamente nos menus de uma clientela majoritariamente convencional.

Mas ao escrever, sua prosa era mais sedutora ainda do que os temas —comida era somente um pretexto ocasional para suas surpreendentes abordagens. Quando deitava a falar de qualquer outra coisa —da literatura que amava, da Paraty que tantas recordações lhe trazia, de um programa de TV—, era sempre com o mesmo olhar fino e temperado de humor.

Conversar com Nina por escrito era uma aula de informação e de estilo. Conversar com ela ao vivo era uma alegria, sempre regada a boas gargalhadas. Pelo menos comigo, que lhe dedicava admiração e muito afeto, e ainda mais porque, desde que ela me disse que detestava quando a convidavam para “tomar um chazinho” (“isso é coisa de velho, eu gosto é de uísque!”), nunca mais deixei de levar um bom scotch a nossos encontros.

Os dois últimos, na casa dela. O último, gravando um depoimento, ainda inédito, para a série de TV “Comida É Arte”, que realizei sob a direção de Paulo Caldas e Barbara Cunha, e deve estrear este ano.

Não há nada de mais saboroso no mundo do que ler os textos de Nina Horta. Agora que ela se foi, resta reler e reler o que ela escreveu. E apreciar com a mesma volúpia com que comemos e repetimos tantas vezes vida afora nossos pratos preferidos.

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