Pianista destaque da nova geração brasileira captou Chopin com maracatu

Filho de imigrantes romenos, o paulista Cristian Budu estuda 12 horas por dia e ganha relevo internacional

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São Paulo

No final de julho, Cristian Budu participou do Festival de Verbier, na Suíça, um dos eventos mais respeitados do mundo da música clássica. O recital de piano solo foi um sucesso, mas teve uma cena de bastidor inusitada: ele havia esquecido a roupa de concerto no trem. 

Budu foi salvo pelo jovem violoncelista britânico Sheku Kanneh-Mason —músico de 20 anos que ficou mundialmente conhecido ao tocar no casamento do príncipe Harry com Meghan Markle, em 2018—, que lhe emprestou sua roupa logo após tocar.

A história prosaica reflete bem a personalidade do pianista de 31 anos nascido em Diadema, na Grande São Paulo. Depois de Verbier, teve outros compromissos na Europa, incluindo concertos em outro festival suíço, o Zermatt, onde tocou com a estrela do violino Renaud Capuçon.

Antes e depois, ele viajou por boa parte do Brasil, dando recitais solo ou tocando com orquestras. Na música de câmara, parece igualmente à vontade tocando ao lado de Antônio Meneses —brasileiro considerado um dos maiores violoncelistas no mundo—, na Sala São Paulo, ou tocando com o pianista Hercules Gomes na pequena e descolada Oca Tupiniquim, na Vila Madalena. 

A partir desta quinta (24), ele faz uma série de concertos com a Osesp na qual a estrela é o “Concerto em Lá Menor”, de Schumann. 

A peça tem papel crucial em sua carreira: foi com ela que conquistou, na Suíça, o concurso Clara Haskil em 2013 —uma das mais importantes competições de piano. Além de ganhar o único reconhecimento concedido pelo júri, também levou os prêmios do público e da jovem crítica.

Com uma rotina pesada de viagens e concertos, ele diz que precisava de “alguma disciplina” e tem implementado mudanças, como uma alimentação balanceada e pouca bebida alcoólica. “A concentração e a entrega são outras”, justifica. Para estudar até 12 horas ao dia, ainda precisou diminuir o tempo dedicado ao sono. 

O sacrifício compensa ao subir no palco. “Quanto mais energia você tiver acumulada para poder entregar na hora, melhor. A não ser que você tenha um certo tipo de frieza, chegar e tocar sempre igual, mas esse não é o meu estilo.”

Budu é filho de romenos que emigraram ao Brasil em 1981. Seus pais, músicos amadores, iniciaram-no ao piano, mas ele diz que começou “sem muito compromisso” e gostava de tocar tanto quanto de jogar futebol. Sua mãe fazia questão de que os filhos conhecessem a cultura brasileira e foi assim que ele descobriu o trabalho de Antônio Nóbrega e foi ter aulas no Instituto Brincante. 

Budu diz ter saudades dos quase cinco anos que passou na escola e que Nóbrega o ensinou algo essencial: “Não importa o que você vá fazer no palco, aquilo é um portal para a imaginação das pessoas. Mesmo numa peça abstrata, é necessário criar um ambiente e contar uma história”.

Budu também tem, como mentor e amigo, a estrela maior do piano brasileiro, Nelson Freire. Foi Nelson que, após ouvi-lo em 2012, aconselhou-o a disputar o Clara Haskil. “Meus professores não insistiam para que eu fizesse concursos internacionais, de certa forma me viam como um pianista fora dos padrões. Nelson me orientou sobre o tipo de concurso no qual minha forma de tocar seria mais apreciada”, conta.

Em boa parte dos recitais solo, ele interpreta o que podem ser considerados seus cavalos de batalha: os 24 prelúdios de Chopin e a “Kreisleriana”, de Schumann. Dois ciclos de miniaturas do período romântico que toca com domínio técnico e compreensão musical, além de criar todo um universo poético em torno delas. A recepção do público costuma ser calorosa, mas diz que, por falta de tempo, acaba não aprendendo outras coisas. “Agora estou sentindo necessidade de ampliar meus caminhos.”

“A primeira vez que estudei os prelúdios de Chopin, eu estava brigando com as peças”, relembra. “Então, aconteceu uma coisa rara em Diadema: passou um cortejo de maracatu. Eu fui atrás, dancei; parece até que entrei em transe. Voltei para casa e os prelúdios fizeram sentido.”

Ele se explica: “Eu via a partitura e me sentia obrigado a fazer algo que eu não sabia o que era. É preciso deixar fluir a fantasia, deixar a imaginação participar do processo”.

No futuro, diz querer dar aulas. “Não só para passar o que aprendi, mas também por estar num lugar por um tempo maior. Sinto falta de ser parte de uma comunidade.”

Estes planos devem ficar para daqui a alguns anos, já que sua agenda tem compromissos até 2021 —em dezembro, ele toca no teatro Mariinsky, em São Petersburgo— e incluem fazer os cinco concertos para piano de Beethoven no ano que vem, quando se comemoram os 250 anos de nascimento do compositor.

Temporada Osesp: Thomson e Budu

  • Quando Qui (24) e sex. (25), às 20h30; sáb. (26), às 16h30
  • Onde Sala São Paulo, pça. Júlio Prestes, 16
  • Preço R$55 a R$ 230
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