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Piano de Maria João Pires sustenta utopias de Beethoven e Chopin

O concerto extra-assinatura celebrou o término da primeira fase de reconstrução do Teatro Cultura Artística

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CULTURA ARTÍSTICA APRESENTA MARIA JOÃO PIRES

“Na medida em que envolvem a nós, ouvintes, na experiência, os intérpretes nos convidam para uma esfera utópica que, de outro modo, nos seria inacessível.”

A afirmação de Edward Said resume o impacto do recital da pianista portuguesa Maria João Pires na Sala São Paulo na terça (8).

O concerto extra-assinatura celebrou o término da primeira fase de reconstrução do Teatro Cultura Artística —consumido por um incêndio em 2008— e sua arrecadação será totalmente revertida para a segunda fase das obras.

Com olhar generoso, sorriso aberto e invejável agilidade corporal, a intérprete de 75 anos organizou o programa de modo a começar e encerrar com sonatas de Beethoven, tendo ao meio seis noturnos de Chopin.

Recital da pianista portuguesa Maria João Pires, que tocou com o violoncelista russo Pavel Gomziakov na Sala São Paulo em 2010 - Rogerio Lacanna/Folha Imagem

Ambas na tonalidade de dó menor, as sonatas de Beethoven são de fases diametralmente opostas: a “Patética” (op.13) foi escrita quando o compositor tinha 27 anos, enquanto que a op.111, de 1822, foi a última de suas 32 sonatas para o instrumento.

A pianista sustentou com rara firmeza o silêncio essencial presente na introdução da “Patética” (o epíteto remete à uma forte passionalidade), que retorna ao longo do movimento de modo cada vez mais incômodo.

É possível que alguns preferissem escutar o segundo movimento um pouquinho mais lento, mas a qualidade de seu som e a primorosa equalização das melodias sobrepujaram tudo o mais.

No bloco dedicado a Chopin, Pires imprimiu liberdade fraseológica e um sensacional sentido de condução. A pianista se arrisca: carrega a música consigo e não tem medo de se deixar levar .

Suas interpretações são muito trabalhadas em termos de timbres e variações de dinâmica: o melodismo do famoso “Noturno” op.9 n.2 soou como uma ária sem palavras e o op.72 n.1 foi construído com frases alongadas, complexas e expressivas.

A pianista portuguesa Maria João Pires durante concerto em Frankfurt, Alemanha, em agosto de 1999 - Hermann Wuestmann/AFP

Haveria muito a detalhar sobre a última sonata de Beethoven. O compositor primeiro apresenta os elementos isolados, para depois tentar integrá-los numa forma clássica; mas os gestos já não cabem em si, e as variações que se sucedem apenas multiplicam os desencaixes.

Embora com dimensão muito maior, a “Sonata” op.111 dialoga com as miniaturas do ciclo das “Bagatelas” op.126, sua última publicação para piano. Uma delas (a n.5) foi escolhida pela pianista como bis.

Said escreveu que o intérprete transita entre o compositor e o ouvinte. Maria João Pires tocou o programa certo, no dia exato, para um público afortunado.

Nesta quarta (4), a pianista toca no Theatro Municipal do Rio de Janeiro e segue, então, para o Instituto Baía dos Vermelhos, na Ilhabela, para uma semana de residência artística com o pianista sérvio Milos Popovic. A dupla fará uma série de workshops e, no dia 19, se apresenta no Teatro Vermelhos. Pires encerra suas apresentações no Brasil no dia 26, quando toca no Palácio das Artes, em Belo Horizonte.

Rio de Janeiro

Ilhabela

Belo Horizonte

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