Descrição de chapéu Obituário J. Borges (1935 - 2024)

Morre J. Borges, poeta e artista considerado mestre da xilogravura, aos 88 anos

Poeta só frequentou a escola por um ano e foi carpinteiro e pedreiro antes de se encantar com arte com as histórias do pai

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São Paulo

O artista plástico e poeta J. Borges morreu na manhã desta sexta-feira (26), aos 88 anos, em Bezerros, cidade onde nasceu, no Pernambuco.

Segundo a comunicação do Memorial J. Borges, que cuida de sua obra, o artista, que já tinha problemas cardíacos, foi internado na semana passada para receber medicações para o coração, mas logo teve alta. Ontem, o artista chegou a visitar seu ateliê e parecia estar bem. Na manhã desta sexta-feira, o enfermeiro que o acompanhava estava com ele quando seu coração parou, pouco antes das 7h.

Borges será velado hoje (26), às 13h, no Centro Artesanal de Pernambuco, em Bezerros, próximo localizado na Rodovia Luiz Gonzaga, a BR-232, e sepultado às 15h de sábado (27), no Cemitério Parque dos Eucaliptos.

O xilogravurista J. Borges - Divulgação

José Francisco Borges nasceu em 1935 na zona rural de Bezerros, a 100 km da capital Recife. Borges só frequentou a escola por um dez meses, aos 12 anos, quando aprendeu a ler, e foi carpinteiro, pedreiro, mascate, pintor de parede e oleiro antes de se apaixonar pela arte. Ele atribuía às histórias de seu pai, um agricultor, a origem do seu interesse pela poesia de cordel.

"O cordel era o jornalismo dos sítios, pois só os comerciantes ricos e os fazendeiros tinham rádio. Quando fui para a escola, meu intento era ler cordel", disse em uma entrevista à Folha em 2023.

Nos anos 1950, ele compra um lote de folhetos de cordel e vendê-los em feiras populares. Em 1964, Borges escreve seu primeiro folheto, "O Encontro de Dois Vaqueiros no Sertão de Petrolina", grande sucesso que vende cinco mil exemplares em dois meses.

Sem ter quem ilustrar seu segundo cordel, "O Verdadeiro Aviso de Frei Damião sobre os Castigos que Vêm", Borges produz sua primeira xilogravura, inspirada na fachada da igreja de Bezerros.

"Eu fazia umas gravuras muito tronchas. E pensava: "Só podem comprar por gozação, porque isso é muito malfeito". Depois conheci outros artistas primitivistas e descobri que arte moderna é essa loucura. Arte popular também podia ser feita daquela maneira. Se fizesse bem feito, ninguém ia gostar."

Ele então adquire máquinas tipográficas e começa a editar folhetos de outros autores.

Nos anos 1970, as encomendas de J. Borges começam a aumentar, e ele passa a fazer ilustrações não só para cordéis. O artista cria a gráfica Casa de Cultura Serra Negra e passa a ensinar a xilogravura para seus filhos, como o também artista J. Miguel, e para outros interessados.

Nas décadas seguintes, seu trabalho começa a ganhar reconhecimento formal. Em 1990, ele ganhou a medalha de honra ao mérito da Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Em 1999, ganhou outra insígnia de honra, dessa vez do Palácio do Planalto, em Brasília, e foi nomeado Patrimônio Vivo Imaterial de Pernambuco, título que o rendeu uma bolsa vitalícia que possibilitou a criação do Memorial J. Borges.

Entre suas láureas, estão ainda a Ordem do Mérito Cultural do Brasil e a oportunidade de ilustrar obras de José Saramago, Eduardo Galeano e os Irmãos Grimm.

Após a notícia da morte de Borges, o presidente Lula se pronunciou. "Nos despedimos hoje de José Francisco Borges, o J. Borges, um dos maiores xilogravuristas do país", escreveu.

"Autodidata, começou a trabalhar muito cedo no agreste pernambucano. Fiquei muito feliz de poder levar sua arte até o Papa. Meus sentimentos aos familiares, amigos e admiradores deste grande artista do nosso país."

Raquel Lyra, a governadora de Pernambuco, também falou sobre o artista em suas redes sociais. "J. Borges levou Bezerros, o Agreste e Pernambuco pro mundo. E vai deixar uma saudade imensa. Mas a sua grandiosidade permanecerá aqui pelas mãos de seus filhos, discípulos e centenas de xilogravuras que representam tão bem a nossa cultura. Meus pêsames aos familiares e amigos."

O Clube Náutico, time de futebol que era paixão de Borges, se lembrou de um dos seus torcedores mais célebres e se solidarizou aos amigos e familiares.

"A cultura pernambucana perdeu hoje o pintor, cordelista, poeta, xilogravurista e alvirrubro J. Borges. Reconhecido internacionalmente por sua obra, J. Borges foi o homenageado deste ano no Timbu Coroado, um gesto simples diante de sua grandeza para o nosso Estado."

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