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'Noites de Alface' tem Marieta Severo em trama de melancolia da perda

Filme baseado em romance de Vanessa Barbara deixa para trás personagens excêntricos e se dedica a trama de viuvez

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São Paulo

Noites de Alface

  • Quando Estreia quinta (24)
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Marieta Severo, Everaldo Pontes, Inês Peixoto, Teuda Bara
  • Produção Brasil, 2018
  • Direção Zeca Ferreira
  • Duração 87 min

Feito em 2018 e lançado só agora, o filme “Noites de Alface” ganha mais uma demão de melancolia. Assistir a Otto, um homem idoso e viúvo, perambular pela casa assombrada pelas reminiscências de sua mulher, Ada, e observar a vizinhança pela janela nos enche de pensamentos sobre nossos pais ou avós que estão muitas vezes sozinhos e amedrontados por causa do vírus mortal.

Mas o longa de estreia na ficção de Zeca Ferreira consegue nos tirar da tristeza ao envolver Otto num mistério digno dos que ele gosta de ler em livros policiais.

A primeira metade do filme de menos de 90 minutos é pouco atraente e parece uma sequência de episódios que buscam o cômico mas não conseguem ser engraçados. O filme cresce, porém, na segunda metade, quando se consolida a estranheza da situação de Otto e ganham um pouco mais de espaço a mística Iolanda e a engajada na comunidade Teresa, vividas pelas maravilhosas Teuda Bara e Inês Peixoto, atrizes do Grupo Galpão de teatro

Everaldo Pontes faz um Otto que gosta de ficar em casa vendo televisão ou lendo, e que tem a vida transformada pela morte da mulher, Ada, encarnada por Marieta Severo. Expansiva e falante, Ada era o ponto de conexão de Otto com o mundo exterior. Ela ajudava na quermesse da igreja, levava comida para agradar o vizinho que está doente, enquanto ele hesitava em sair de casa.

Tudo se passa numa pequena comunidade de casas pequenas e ruas não asfaltadas em que todos se conhecem e conversam com o carteiro. As casas ficam com os portões abertos. Ninguém usa telefones celulares. O filme foi rodado na ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro, mas poderia se passar em algum lugar do passado.

A calma dos dias é perturbada pela presença de um investigador que está atrás de descobrir os motivos do sumiço do carteiro substituto, que trabalhava na área uma vez por semana e simplesmente desapareceu. Um homem correto, que nunca errava as entregas e nunca chegava atrasado ao trabalho.

Tivesse dado mais tempo ao incômodo gerado pela investigação, o filme poderia fisgar melhor o espectador, mas tudo vai muito depressa fora das conversas reais ou imaginadas entre Otto e Ada.

Baseado no romance de mesmo nome de Vanessa Barbara lançado em 2013 pela Alfaguara, o filme teria ganhado muito se também tivesse dado mais tempo para o desenvolvimento dos personagens Nico, papel de João Pedro Zappa, e o idoso Tanaguchi, vivido por Antonio Sakatsume, os mais memoráveis do livro.

Nico é um hipocondríaco louco por bulas de remédios que vive falando de efeitos colaterais, de nomes de doenças e de estranhos princípios ativos, e é o alívio cômico do romance, mas vira, no filme, apenas o atendente de farmácia e nadador do clube. Sem um contexto maior para sua figura, as cenas da piscina parecem sem sentido.

Tanaguchi, figura central da trama, é baseado em Hiroo Onoda, o soldado japonês da Segunda Guerra que não quis se render e que morou no Brasil —o cineasta Werner Herzog lança em agosto sua biografia. No filme, somos pouco informados sobre sua história até descobrirmos a importância de seu papel.

Em tempos difíceis como os que vivemos, quando a vida é, por alguns, desvalorizada, sobretudo a vida dos mais velhos, é de encher o coração ver um filme em que a comunidade é tão importante, o cuidado com a vizinhança é tão especial, e que é, também, uma bela história de amor entre duas pessoas que compartilharam suas vidas.

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