Mostra de Banksy se opõe ao seu estilo de guerrilha com ingressos por até R$ 400

Exposição em Londres levanta debate sobre acesso à arte de rua, já que obras do grafiteiro viraram itens de colecionador

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'Love is in the Air', obra de Banksy exibida na exposição 'The Art of Banksy', em Londres Reprodução

Londres

Num bairro endinheirado de Londres, uma galeria cercada por lojas de grife acaba de abrir uma exposição sobre o artista de rua mais famoso do planeta, conhecido por ser crítico ao capitalismo.

“A Arte de Banksy” é um sucesso. Vista por mais de 750 mil pessoas no mundo, enfim chegou ao país do grafiteiro. “Achei brilhante”, disse a visitante Alexandra Naylor, com uma credencial VIP que, pelo equivalente a R$ 400, dava direito a não enfrentar fila.

São mais de 90 obras. Há versões de “Menina com Balão”, que mostra uma garota tentando alcançar um balão em forma de coração, e “Love Is in the Air”, que ilustra um manifestante lançando flores.

Há telas típicas de Banksy, marcadas pelo ativismo e pelo sarcasmo. Nas paredes, referências ao modo como o artista ironiza a elite. “O mundo da arte é a maior piada. É uma casa de repouso para os privilegiados, os pretensiosos e os fracos”, diz uma das frases ali.

Mas há um detalhe. Banksy não autorizou a mostra nem ganha nada com ela. A entrada mais barata custa R$ 180. As obras pertencem a colecionadores e isso gera um dilema entre fãs. É certo incentivar algo que vai contra a vontade do artista? Jason Holland, que se diz “fanático por Banksy”, se arrependeu de ter ido.

“Não é o que o Banksy gostaria”, disse. “Arte é para todos e isso deveria estar num museu para as pessoas verem de graça. Sinto culpa. Paguei a alguém que vai ganhar dinheiro com o nome dele. É errado.”

Outros não veem problema. “As pessoas querem ver”, disse Naylor. “Se ele está produzindo arte, vai ser assunto.”

O produtor da mostra, Sean Sweeney, defende a iniciativa. “É uma oportunidade fantástica de as pessoas verem essas peças que estariam na casa de alguém”, disse. “É uma chance de mostrar essas obras.”

Banksy é pseudônimo do artista cercado por mistério. Ele nunca revelou o nome nem o rosto. Dizem que nasceu em Bristol, na Inglaterra, nos anos 1970, e se tornou conhecido pelo mundo por grafites em muros, prédios e pontes.

Entrevistas são raríssimas. Procurada, a assessoria dele se limitou a dizer que “a exibição é 100% não oficial e não tem qualquer relação com Banksy.”

A fama fez com que seja difícil para o público ver uma obra dele de graça. Quando um trabalho aparece, dura só horas ou dias. Acaba sendo vandalizado, pintado por cima, ou arrancado e vendido.

Os organizadores de “A Arte de Banksy” deixam claro que nada foi retirado das ruas. Não é o caso de outras exposições. Em 2014, “Roubando Banksy?” reuniu obras que estavam em muros e foram leiloadas depois. À época, a estimativa era que as peças valiam de R$ 800 mil a R$ 3 milhões.

Em 2013, “Trabalho Escravo” foi removido de um muro em Londres, causando revolta, e vendido por R$ 5,5 milhões. A empresa responsável alegou que estava ajudando os donos dos prédios e que a renda iria para caridade. Grafite é ilegal no Reino Unido e considerado crime, com pena máxima de dez anos de prisão.

“Ser um líder desse movimento artístico traz coisas boas e ruins. O bom é que tudo que Banksy faz recebe atenção. O ruim é que dura pouco tempo”, diz Mateo Macía, chefe de comunicação da Global Street Art, que conecta artistas de rua ao redor do mundo.

A sede da organização em Londres fica no bairro de Shoreditch, onde há um contraste entre o colorido de prédios pintados por artistas e uma das poucas obras de Banksy na cidade, escondida atrás de grades no terreno de um bar.

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Grafite de Banksy em Shoreditch, em Londres, escondido atrás de um vidro e de grades no terreno que pertence a um bar - Reprodução

A Global Street Art ajuda artistas a encontrar muros onde podem pintar. Macía acredita que em muitos países faltam recursos para esses projetos.

“Há poucos espaços, apesar de Londres ser um dos melhores lugares para isso”, diz. “Artistas acabam fazendo seu trabalho até ilegalmente. Poderíamos ampliar o debate e ter pessoas próximas de governos incentivando o movimento.”

Ele lembra, no entanto, que a essência da arte de rua é ser efêmera. “O artista que pinta murais ao ar livre precisa entender que sua arte não estará lá para sempre. Parte do que se faz é ter uma conversa com a sociedade. Se alguém pinta em cima da sua arte, é preciso aceitar. Se tivéssemos dez 
vezes mais espaços, menos seriam pintados por cima.”

Olivia Calvert, dona da London with a Local, que faz passeios de arte urbana em Londres, diz que Banksy ainda é o artista que atrai mais atenção.

“A pergunta que mais recebemos é se eles vão ver um Banksy e com que frequência ele aparece. Nossos guias explicam que a arte é algo transitório e que o trabalho do Banksy frequentemente é vendido ou danificado. Eles acabam conhecendo outros artistas e se interessam por eles.”

Enquanto isso, sob a anonimidade que não impediu a 
fama, Banksy vai deixando sua marca. Em 2018, minutos depois que uma versão de 
“Menina com Balão” foi arrematada por R$ 5 milhões na casa de leilões Sotheby’s, o quadro foi destruído de 
surpresa por um triturador instalado na moldura pelo artista.

Como diz uma frase atribuída a ele, “quando você vai a uma galeria de arte, é simplesmente um turista olhando para a estante de troféus de alguns poucos milionários”.

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