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Lorde inventa a fotossíntese musical com álbum de rock rural

Canções têm estruturas delicadas, acordes improváveis, quando não refrões camuflados, mas nos conectam com natureza

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Solar Power

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  • Autor Lorde

Alguém arrume urgente uma casa no campo para Lorde porque os rocks rurais ela já compôs. E eles são bons, muito bons.

Estou ciente de que a grande maioria dos jovens fãs da artista neozelandesa talvez não tenham captado a referência da letra que citei acima imortalizada por Elis Regina, composta pelo genial Zé Rodrix, um farol ainda mais distante. Mas não resisti à tentação de procurar nela algo que me ajudasse a definir um trabalho tão iluminado quanto “Solar Power”, o novo álbum de Lorde.

Como que para espantar de vez uma imagem sombria, reforçada não exatamente pela música, mas pelo título de seus álbuns anteriores —“Pure heroine”, ou “Heroína pura”, e “Melodrama”—, Lorde vem com um punhado de canções que são pequenos alvoreceres.

São doze faixas, um exagero em tempos em que EPs são considerados “manifestos” e os singles abundam, que trazem a cada começo não apenas o sol, mas uma certa paz, numa espécie de fotossíntese musical.

E é nesse sentido que gosto de pensar nessas músicas como rock rurais, uma definição em si um tanto diáfana. Elas têm quase sempre estruturas delicadas, acordes improváveis, quando não refrões camuflados. Mas nunca deixam de nos conectar com a natureza, terrestre e humana, que parece ser a grande inspiração de Lorde desta vez.

Da abertura com “The Path” à composição que fecha o trabalho, “Oceanic Feeling”, Lorde oferece uma intimidade genuína e convidativa. Se o tom de seu primeiro disco era sutilmente suplicante e o do segundo, ensaiadamente confessional, em “Solar Power” ela simplesmente é.

"Stoned at the Nail Salon" ou contando "Secrets From a Girl (Who's Seen it All)", dois títulos inéditos, Lorde está simplesmente narrando, com poucos filtros, o que está na sua cabeça. Nas duas melhores faixas, além da que dá título ao trabalho, a já citada “Secrets From a Girl” e “California” são, não por coincidência, as mais pessoais.

A primeira em que, como a própria Lorde explicou na disputada audição prévia de “Solar Power”, traz ela conversando consigo mesma no passado, refletindo, entre outras coisas, sobre a morte de seu cão de estimação. (Um feat do ícone pop Robyn, como uma aeromoça futurista, acrescenta charme à canção).

E a segunda, uma reflexão sobre a loucura da sua carreira meteórica e suas impressões sobre Los Angeles, é de uma alegria quase embaraçosa.

“California” tem um pouco de Beatles, de Bowie, de Monkees, de Carole King. “Path” parece misturar Björk, Renaissance, Carla Bruni. A faixa título é parte George Michael (“Freedom 90”), parte Primal Scream (“Come Together”).

“Fallen Fruit” é pura Elis, mesmo que Lorde nunca a tenha ouvido. E “Leader of a New Regime” é uma homenagem involuntária à genial e desconhecida Diane Cluck, que eu duvido também que ela jamais tenha escutado.

Cabe todo mundo e tudo é permitido nos limites gasosos de “Solar Power”. Como na casa de campo de Rodrix, Lorde ali plantou amigos, livros e discos. Prepare-se para uma farta colheita.

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