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'A Última Floresta' vai da poesia à denúncia ao retratar os yanomamis

Documentário de Luiz Bolognesi premiado no último Festival de Berlim foi feito em parceria com os indígenas

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A Última Floresta

  • Quando Estreia nesta quinta (9) nos cinemas
  • Produção Brasil, 2021
  • Direção Luiz Bolognesi

“A Última Floresta”, filme sobre os yanomamis e o desmonte das políticas indigenistas, estreia nos cinemas justamente na semana em que Jair Bolsonaro arreganhou os dentes, vociferando ameaças autoritárias.

Nos discursos em Brasília e em São Paulo neste Sete de Setembro, o presidente não mencionou os povos originários, mas não é preciso ter dons de profeta para saber que os indígenas, prejudicados desde a chegada dele ao Planalto, perderiam ainda mais seus direitos se o projeto golpista avançar.

O filme de Luiz Bolognesi lembra que a Terra Indígena Yanomami foi reconhecida pelo governo brasileiro em 1992. Apesar do ato oficial, garimpeiros atrás de ouro invadiram uma aldeia no ano seguinte e mataram pelo menos 16 indígenas, incluindo mulheres e crianças. O episódio ficou conhecido como o massacre do Haximu.

Desde então, sob a liderança de Davi Kopenawa e com apoio de organizações brasileiras e estrangeiras, o território foi protegido. No entanto, a partir de 2019, sob novo governo, milhares de garimpeiros têm invadido estas terras, provocando desmatamento e poluindo os rios com mercúrio.

Embora jogue luz sobre o problema, “A Última Floresta” não é exatamente um filme-denúncia, ou seja, não se restringe a organizar uma narrativa com a finalidade de indicar os responsáveis por atos criminosos. O que faz Bolognesi é adotar caminho semelhante ao do seu documentário anterior, “Ex-Pagé”, que leva o público a conhecer os costumes de uma tribo para só depois revelar como aquela cultura está em risco.

No filme de 2018 e neste que agora entra em cartaz, a câmera não aparece como intrusa. Pelo contrário, “A Última Floresta” foi feito em parceria com os indígenas, a começar pelo roteiro, assinado por Bolognesi e Kopenawa.

O cineasta Luiz Bolognesi e o líder indígena Davi Kopenawa durante as filmagens de 'A Última Floresta'
O cineasta Luiz Bolognesi e o líder indígena Davi Kopenawa durante as filmagens de 'A Última Floresta' - Carol Fernandes/Divulgação

Mulheres, homens, adolescentes e crianças da aldeia Watoriki, em Roraima, surgem à vontade, envolvidos em atividades do dia a dia, como a alimentação em família, a pesca, a caça e a produção de cestos. Em meio a esses afazeres, Kopenawa lembra os mitos que deram origem aos yanomamis.

Os rituais promovidos pelos xamãs são registrados com uma plasticidade que lembra, em alguns momentos, as imagens dos yanomamis feitas pela fotógrafa Claudia Andujar nos anos 1970 —naquela época como hoje, essas tribos correm perigo.

Ao acompanhar tanto ações triviais quanto abordagens espirituais, tudo em meio a uma natureza exuberante, o documentário nos leva a um ambiente de transcendência, uma atmosfera etérea. Mas logo depois, sem solavancos, nos põe diante de uma realidade alarmante. Talvez a maior força do filme esteja justamente nesse trânsito fluente do universo da poesia, da imaginação e da memória para o terreno da violência contra os yanomamis e a sua cultura ancestral.

É um trunfo que pesou para carreira bem-sucedida em festivais, haja vista o prêmio do público na mostra Panorama no último Festival de Berlim, em março deste ano.

A estética encontra a urgência em “A Última Floresta”. Para este Brasil pós-Sete de setembro, isso definitivamente não é pouco.

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