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Renato Terra

'One Child Nation' expõe a desumana política do filho único da China

Documentário tem imagens contundentes, mas foge do sensacionalismo ao acompanhar ponto de vista de sua diretora

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Renato Terra

Roteirista do Conversa com Bial e diretor dos documentários 'Narciso em Férias', 'Eu Sou Carlos Imperial' e 'Uma Noite em 67'. Trabalhou na revista piauí até 2016 e foi o ghost-writer do 'Diário da Dilma'

One Child Nation

De tão perversos, alguns momentos retratados no documentário “One Child Nation” parecem uma ficção distópica. Mas não são. A rígida política do filho único, lançada pelo governo chinês em 1979 vigorou até 2015. Muitas mulheres foram forçadas a abortar, recém-nascidos foram abandonados até morrerem sozinhos, uma rede de tráfico de bebês se instalou no país.

As imagens são contundentes, mas o tom escolhido pela diretora Nanfu Wang não é sensacionalista. Wang parte de sua história pessoal e transforma o filme numa brilhante reportagem investigativa.

pôster de filme que mostra família chinesa feliz com recorte onde deveria haver uma filha mulher
Pôster do documentário 'One Child Nation', dirigido por Nanfu Wang e Jialing Zhang - Divulgação

Wang é uma exceção. Seus pais moravam numa província rural e conseguiram ter dois filhos. No momento que fez o filme, seu primeiro filho tinha acabado de nascer. É a partir dessa ótica pessoal que o documentário se constrói.

Em paralelo, a diretora mostra como o governo chinês fez uma propaganda massiva da política do filho único durante quase três décadas. O enfrentamento do crescimento desordenado da população era encarado como uma guerra. Caso a taxa de nascimentos continuasse alta, o Partido Comunista previa fome, miséria e uma máquina pública impossível de administrar.

O problema é que a política do filho único ia muito além das propagandas. Havia fiscais em todas as vilas para esterilizar as mulheres que viravam mães. Quem tentava desobedecer às regras sofria severas punições. Muitos fetos foram abortados com oito, nove meses de gestação. Muitas filhas recém-nascidas foram abandonadas até que a mãe gerasse um homem.

Os diálogos entre Wang e sua mãe são comoventes. Apesar das atrocidades cometidas, a mãe ainda defende a política do filho único. “Viraríamos canibais”, argumenta ela. Nesses momentos, sua voz e seus olhos perdem qualquer traço de compaixão. O mesmo acontece com todas as pessoas entrevistadas que defendem a política sem ressalvas.

As poucas lágrimas vêm das pessoas que se contrapõem às ordens do Partido. O irmão de Wang, por exemplo, se emociona ao lembrar dos privilégios que teve por ser homem.

Há vários debates internos em “One Child Nation”. Em certo momento, Wang faz um paralelo entre a política do filho único na China e as leis que proíbem o aborto em outros países. O filme, portanto, trata de várias questões pela ótica pessoal de Wang. E faz isso muito bem.

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