SP-Arte retorna presencial com galerias mirando a Faria Lima com a força da pintura

Maior feira do país tenta atravessar a crise com telas coloridas e figurativas, ativos mais seguros para colecionadores

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Tela de Rebecca Sharp, à venda na galeria Sé, na atual SP-Arte João Mascaro/Divulgação

São Paulo

Quem visitar a SP-Arte verá pinturas em cores vivas de vasos com flores feitas por Panmela Castro, artista da galeria Luisa Strina, a poucos metros de telas gráficas amarelas e alaranjadas de Lina Kim, representada pela Casanova. Alguns passos adiante, um óleo de Francisco Hurtz, da Verve, mostra um pugilista de cuecas num cenário multicolorido, e uma tela azul e marrom de Arnaldo de Melo vai ocupar quase sete metros de uma parede do estande da Sé.

Embora representem assuntos muito distintos, essas obras denunciam a onipresença da pintura no evento, boa parte dela figurativa. É o denominador comum entre galerias de diversos tamanhos na edição que marca o retorno da maior feira de arte do país à sua versão presencial, depois de ser suspensa no ano passado por causa da pandemia. Do elenco da atual edição, ao menos 14 galerias, mesmo representando uma série de artistas conceituais, com trabalhos, digamos, mais difíceis de vender, terão óleos em oferta.

“Acho que as feiras do mundo inteiro têm esse lado de uma volta da pintura. Eu estive na Art Basel [na Suíça, a mais importante feira de arte do mundo] agora e era predominantemente pintura. Uma pintura alegre, pintura de uma volta de um mundo muito triste”, afirma Luisa Strina, uma das principais galeristas do país. “Uma volta não só nas artes, mas em querer viver, uma euforia na volta à vida.”

“Fui para Basel e vi muita pintura gigantesca”, acrescenta Maria Montero, da Sé, usando o adjetivo “safe”, seguro, para descrever o evento no mês passado que marcou a retomada do calendário europeu de feiras. Montero diz esperar que os galeristas não deixem de lado a arte conceitual, mas reconhece que vender pintura é mais fácil num momento de crise, já que a técnica tem séculos de existência em comparação com a performance, por exemplo, e também é mais palatável para potenciais compradores.

A 17ª edição da SP-Arte enfim abre para o público nesta quarta ocupando pela primeira vez a Arca, um galpão industrial dos anos 1960 com 9.000 metros quadrados na Vila Leopoldina, em São Paulo. O espaço que já recebeu uma edição da São Paulo Fashion Week tem menos de metade dos 24 mil metros quadrados que a feira costumava ocupar no pavilhão de Oscar Niemeyer no parque Ibirapuera. Desta vez, por causa da Bienal de São Paulo, que também conseguiu entrar em cartaz, o evento comercial precisou mudar de lugar.

Isso significa uma redução no tamanho dos estandes e também um menor número de galerias de arte —serão 72, em relação às 120 da última edição presencial da feira, em 2019. Só três são estrangeiras, sendo duas do Uruguai e uma dos Estados Unidos. Outra mudança é que as oito galerias de design do evento, entre as quais Jacqueline Terpins e a loja Etel, não terão estandes na Arca e vão vender suas peças exclusivamente pela versão online da SP-Arte, que ocorre em paralelo à edição presencial.

O número reduzido de galerias responde ao momento, diz Fernanda Feitosa, a diretora da feira, ressaltando que os corredores na Arca terão cinco metros de largura, e não quatro, como na Bienal, permitindo uma circulação mais espaçada dos visitantes, dos quais será exigido o comprovante de vacinação ou um teste negativo para coronavírus.

Além disso, segundo ela, a baixa participação de galerias estrangeiras num evento que já teve gigantes do setor como a britânica White Cube e a americana David Zwirner reflete a crise econômica na qual o Brasil está desde 2014, tornando a SP-Arte uma feira mais regional e menos internacional, como a ArteBA, de Buenos Aires.

Feitosa lembra ainda uma conversa corrente no meio antes da pandemia, a de uma saturação de feiras de arte no mundo e a dificuldade financeira das galerias pequenas e médias em bancarem sua presença em todas, incluindo as da Ásia e do Oriente Médio, que emergiram na última década, em paralelo à crise brasileira.

“O online entra como auxílio para que a gente possa ter galerias estrangeiras participando sem a pressão de que elas tenham que se deslocar ao Brasil, levando em conta que o Brasil está a oito horas de viagem dos centros de consumo de arte, a Europa e os Estados Unidos”, diz ela, ressaltando que algumas casas estarão só na versão digital da SP-Arte, entre as quais a nova-iorquina Marian Goodman e outras nacionais.

Dos grandes do mercado paulistano, terão estandes, por exemplo, a Fortes D'Aloia & Gabriel e a Bergamin & Gomide, a primeira com esculturas de Erika Verzutti, atualmente com uma mostra no Masp, e a segunda mostrando uma seleção de obras a partir de R$ 600 mil, incluindo uma tela de Antonio Dias da mesma série em exposição na Bienal de São Paulo. A jovem galeria HOA, dedicada à arte contemporânea feita por artistas LGBTQIA+, indígenas ou negros na faixa dos 30 anos, estreia no presencial depois de participar de duas SP-Arte virtuais.

A feira deve ser um termômetro da recuperação do mercado local depois da crise causada pela pandemia. No ano passado, a venda de obras de arte e de antiguidades encolheu 22% no mundo, segundo um estudo da feira Art Basel e do banco suíço UBS, a maior queda desde a crise de 2009.

Uma nova versão do relatório, publicada em setembro, já indicava aquecimento —51% dos marchands relataram aumento das vendas nos primeiros seis meses de 2021 em relação à igual período de 2020. Mais tradicional, a pintura foi o principal motor da recuperação, contabilizando 60% do valor das vendas neste ano, seguida pela escultura, com 15%.

Na visão dos galeristas, as feiras são os principais eventos onde se podem conhecer novos colecionadores, mas eles reconhecem que o cenário é de cautela para os compradores, não de euforia. ”Tem uma vibe muito boa. O mercado precisa dessa energia que uma feira de arte traz para o ecossistema. É um momento importante de troca. Encontrar as pessoas ainda é um estímulo”, afirma Jaqueline Martins, da galeria de mesmo nome, que mostrará trabalhos de Regina Vater e Daniel de Paula, um dos nomes fortes da atual Bienal de São Paulo.

Segundo Thiago Gomide, da Bergamin & Gomide, com a volta do presencial os colecionadores não devem nem se lembrar da versão virtual da feira. As vendas não arrematadas no ato podem ser concretizadas depois por email ou WhatsApp, ele diz, lembrando que há dinheiro circulando no Brasil e que quem compra arte costuma ser mais afluente, menos afetado por crises.

Seu estande será todo dedicado a trabalhos com cifras maiores, os chamados "blue chip", a exemplo de uma escultura de Sol LeWitt cotada em R$ 1,5 milhão. “Acho que a Faria Lima vai comparecer em peso.”

SP-Arte em números

  • 128 expositores ao todo, somando a feira presencial e a virtual, que ocorrem simultaneamente
  • 84 expositores presenciais, entre galerias de arte e editoras
  • 44 expositores somente na versão digital
  • Oito galerias de design e mobiliário, todas na versão virtual

17ª SP-Arte

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