Descrição de chapéu
Henrique Artuni

Faustão na Band mostra que nem o tiozão aguenta viver o domingo todo dia

Assim como não se faz Carnaval de segunda a sexta, uma lenda da TV sozinha não é capaz de dinamitar o império da Globo

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São Paulo

Seis meses de Faustão na Band foram suficientes para lembrar que, com certas entidades, não se mexe. É também verdade que na estreia do programa naquela noite quente de janeiro deste ano, o público estava sedento –outra emissora seria capaz de reproduzir a domingueira faustiana?

Sim, é bem possível, Faustão mostrou. Mantendo a equipe, dando um toque aqui e acolá de novidade, o programa na Band nasceu como cópia cuspida e escarrada da fórmula conciliadora da Globo, onde um país em frangalhos se reúne para rir (das mesmas "Video Cassetadas"), chorar (com as histórias de artistas novos e velhos no "Arquivo Confidencial"), se impressionar (com os "Se Vira nos 30" e afins). Era o momento de aliviar a pressão antes da revista semanal trágica do Fantástico.

Fausto Silva em retorno à Band com programa diário - Rodrigo de Moraes 17.jan.22/Band

Mas a Band acabou aprendendo, de maneira tão involuntária quanto o humor de Faustão, que nem todos os pactos —para lembrar o xará popularizado por Goethe— valem a pena. Afinal, não demorou para semanas escancararem a perda de interesse da audiência no programa de auditório diário —o pico perto dos dez pontos na estreia despencou em fevereiro para a faixa dos quatro, que só voltaria a ser atingido em meados de maio, e é a audiência que mantém o programa vivo. Agora, mais de 40 pessoas serão demitidas da atração, que deixará de ser diário em 2023.

Ora, o último programa do Faustão na Globo, em 6 de junho do ano passado, passou dos 15 pontos de audiência, e hoje, comandado por Huck, o programa ultrapassa isso —afinal, mesmo um carisma canastrão pode não prejudicar quadros consagrados, e ter estrelas de um sucesso como "Pantanal" à disposição é luxo que o Faustão da Band não tem.

Mas dois elementos me parecem fundamentais na observação empírica do assistir à televisão —quem mexe no controle remoto? E quem está disposto a fazer Carnaval todo dia?

Sobre o primeiro, há de se considerar a força motriz que a Globo estabeleceu há gerações, fazendo com que a vovó veja tudo desde o Jornal Hoje, seguido de um Vale a Pena Ver de Novo, com direito à sesta do almoço.

A TV ligada segue atravessando as novelas do dia, até o fim do horário comercial, entre noticiário e mais novelas. No domingo —futebol e Carnaval e, em tempos áureos, o Faustão para a digestão da macarronada antes de uma nova semana. Há aí uma força simples, compulsiva, de um império maior que o Faustão e que nem tiozões ou a velha guarda tiete de Silvio Santos podem quebrar tão facilmente.

Como uma novela que se acompanha enquanto se lava a louça, Faustão se vê por osmose e mostra que o público ama se joga na farra conciliadora, mas com hora marcada —e ai de quem mexer no controle na hora da novela. Não se faz Carnaval todo dia.

Sim, podemos pôr Anne Lotterman, ex-moça do tempo da Globo, ao lado do jovem João Guilherme, hoje já devidamente barbado, mas juventude não é sinônimo de bombar nas redes —Ana Maria Braga e Benedito Ruy Barbosa que o digam.

Sim, apostemos na transmídia, com um canal do Faustão na Band no YouTube, com notáveis 515 mil inscritos e quadros paralelos tentando fazer graça com as tiradas do apresentador no ao vivo. Mas dá para dizer que o "Faustop" institucionalizado —como se chama o quadro comandado pelo filho de Faustão— tem a graça de quem cresceu com os memes do rei dos domingos? Uma lenda da TV sozinha não pode dinamitar o império da Globo.

Tony Goes já explicou neste jornal como a aposta da Band era uma derrocada anunciada, cravando bem que a lenda septuagenária, fora do seu trono desde os anos 1990, não consegue sair da zona de conforto num cenário em que Marcos Mion e Huck assumiram a cadeira. O rei está nu, mas todo mundo já viu essa fita.

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