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Maitê Proença

Maldade tem perna mais curta do que mentira velada

Jovens repórteres, ainda que inteligentes, precisam saber que notícia distorcida não trará de volta o leitor evadido de outrora

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Maitê Proença

Há dias, concedi entrevista para este jornal com o intuito de divulgar a peça "O Pior de Mim", em que figuro como autora e atriz, e que iniciava temporada em teatro paulista na semana passada.

A distância entre a conversa com o repórter e a reportagem impressa é tão vasta quanto o sensacionalismo que se buscou no resultado final. Jovens repórteres, ainda que inteligentes, precisam saber que a noticia distorcida não trará de volta o leitor evadido de outrora. E que a maldade tem a perna mais curta do que a mentira velada (e por isso, mais perniciosa).

Maitê Proença na estreia da peça 'O Pior de Mim' no teatro UOL, no shopping Pátio Higienópolis, em São Paulo - Ronny Santos/Folhapress

A maior parte do texto toca em futricas das redes sociais que não foram abordadas na entrevista, em escolhas políticas discutidas de raspão e em momentos pinçados de meu livro homônimo recém-lançado que, destacados do contexto, pesam em dramaticidade, estabelecendo um tom banal, vulgar, justamente o avesso da atmosfera que permeou nossa conversa.

A impressão que fica é a de que o repórter tinha o texto pronto e não precisaria de mim para dar forma a seu conteúdo. "Atriz diz que acusações de que era bolsonarista e lesbofóbica foram o mote que inspiraram 'O Pior de Mim'."

Este é o subtítulo. Ora, o material de onde tirei a peça estava, havia anos, no fundo de uma gaveta, escondido de mim mesma, sendo anterior a quaisquer zumbidos no meu ouvido que acusassem a existência do velhaco que nos governa. E por que voltar à tona com essas mentiras? Não sou e nunca fui bolsonarista. Mostrem uma afirmação minha, de viva voz, em qualquer momento, que comprove este desvario. Não há.

E, sobre a lesbofobia, faz bem pouco sentido que eu me oponha ao mundo lésbico, tendo vivido abertamente uma relação com alguém do mesmo sexo. Relaciono-me com pessoas, com o que elas são da pele para dentro.

Se altas, pretas, japonesas, peludas, homens ou mulheres, tudo é secundário. Quanto ao entrevero com Regina Duarte, nunca concordei com suas afirmações sobre as qualidades do deplorável, mas defenderei até a morte seu direito de fazer as escolhas que lhe parecerem dignas. Ainda que me custe compreender, aceito e defendo que qualquer pessoa pratique escolhas diferentes das minhas.

E, finalmente, sobre a peça "O Pior de Mim": o público tem lotado as salas e saído arrebatado. Estamos indicados ao prêmio Cesgranrio de Teatro para melhor texto.

Esta semana tivemos uma crítica de Helder Moraes Miranda, no portal Resenhando, que diz: "Há um encantamento em torno da figura de Maitê Proença e uma espécie de surpresa ao vê-la tão entregue em um texto tão revelador, escrito por ela mesma, sob a direção sensível de Rodrigo Portella. Também existe doçura, e ódio, e gritos que ecoam ao longo de todas as falas, mesmo as aparentemente mais tranquilas".

"Ali está uma mulher com raiva curando as próprias dores no palco, tendo a generosidade de dividir com o público a própria dor e, também, conduzindo o público a uma catarse coletiva. 'O Pior de Mim' é a face mais corajosa de Maitê Proença. Até mais do que quando ela se expõe nos textos. Verborrágica, intensa, visceral e, sobretudo, um ser de verdade —desconstruído de qualquer afetação. Mulheres assim movem o mundo. Assistir ao espetáculo é, sem dúvida, uma experiência libertadora."

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