Charlotte e Simon estão de acordo. Ambos só querem transar. As semelhanças entre os dois parecem terminar aí, porém.
Ela é charmosa e despreocupada, com a graça da beleza incomum que há tantos anos Sandrine Kiberlain empresta às personagens que interpreta. Ele, vivido por Vincent Macaigne, é atormentado e inseguro, e seu encanto é de início pouco notável, uma mistura de Gregorio Duvivier com Woody Allen.
Ela é livre e vive só com o filho pequeno; ele é casado, com filhos.
Como tantas relações, essa, um tanto improvável, nasce do acaso. Os dois se conhecem numa festa e não se entendem de cara —ficamos sabendo na sequência no início, algo teatral e coreografada, que mostra o primeiro encontro marcado, num bar.
A partir daí, passamos a acompanhar essa "Crônica de uma Relação Passageira" por meio dos sucessivos rendez-vous em parques, ruas e apartamentos de Paris e arredores.
A relação se constrói de maneira fragmentária, e também assim é narrada, por quadros, sempre precedidos pela data dos acontecimentos —recurso clássico que, aqui, sublinha de maneira delicada a mudança de caráter no envolvimento.
É, diz o título, de algo fadado a acabar. A todo o tempo, esse fantasma paira sobre o casal. Estão bem nos momentos a dois, mas todo encontro pode sempre ser o último, dadas as circunstâncias.
Ao mesmo tempo, eles, como nós, parecem crer que haja aí um engano. Todo amor é eterno —enquanto dura. Pois, como frisa Charlotte, tudo, não só a paixão, mas cada um é fadado a mudar. Sendo os mesmos, somos outros a cada nova situação.
É um filme francês com muitos diálogos? Sim. É cansativo por isso? Nem um pouco. A dupla garante boas risadas, gargalhadas até, decorrentes do choque evidente entre as personalidades de Simon e Charlotte.
Se há algum reparo a fazer, reside no fato de que, no início, Charlotte e Simon parecem ambos um pouco caricaturais. Mas mesmo nisso se pode, com generosidade, ver uma astúcia narrativa. Quem, afinal, se dá a conhecer claramente e por inteiro assim de cara?
Assim, os personagens pouco a pouco se desvelam. Quando o registro muda, pois ele mudará, Kiberlain e Macaigne mostram que são excelentes não apenas no timing cômico.
Timing, aliás, é uma boa palavra. Emmanuel Mouret, o diretor, que assina o roteiro com Pierre Giraud, constrói um filme belo e enternecedor sobre o aspecto subjetivo da duração —de uma relação mas também de um sentimento.
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