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Flip começa celebrando Firmina como ancestral que fundou a liberdade no Brasil

Primeira mulher a publicar um romance no país foi homenageada por ter feito 'nosso primeiro texto de liberdade'

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Paraty (RJ)

A Flip começou na noite dessa quarta com uma homenagem afetuosa a Maria Firmina dos Reis, a primeira mulher a publicar um romance no Brasil, elogiando tanto seu pioneirismo como sua capacidade de dialogar com lutas antirracistas de hoje.

Participaram a crítica literária Fernanda Miranda, que chamou a escritora de "autora de nosso primeiro texto de liberdade", e a historiadora Ana Flávia Magalhães Pinto, mediadas pela jornalista Adriana Couto.

Mesa de abertura da FLIP com a participação de Ana Flavia Magalhães Pinto e Fernanda Miranda editora da revista Firminas - Zanone Fraissat/Folhapress

A poeta e slammer Midria fez uma apresentação emocionada de uma breve música em homenagem a Firmina —"Ô Firmina, abençoa os passos, abençoa os cantos das que virão"— leu um poema da autora, que chamou de sua ancestral.

Em seguida, vieram ao palco a crítica literária Fernanda Miranda, que começou afirmando a homenageada como "a autora de nosso primeiro texto de liberdade", e a historiadora Ana Flávia Magalhães Pinto, que definiu a escritora de "Úrsula" como "um farol a iluminar a experiência negra no Brasil".

O romance, obra-prima da maranhense, divide sua atenção entre o sofrimento amoroso da mulher branca que dá título ao livro e os relatos em primeira pessoa das agruras de personagens escravizados —algo até então inédito na literatura do país, num gesto de evidente intenção abolicionista.

Miranda, autora de "Silêncios Prescritos", estudo sobre narrativas de mulheres racializadas, afirmou que a escritora "desafia um cenário que dizia que pessoas negras nem eram pessoas", para dar dimensão da ousadia de seu projeto literário.

"A classe letrada da época precisava ouvir Mãe Susana", disse, sobre a personagem que conta sua experiência trazida da África num navio negreiro em um capítulo seminal do livro. "Mas Firmina tambem estava escrevendo sobre o nosso agora. Por isso ela nos acolhe, porque nós ainda estamos lutando pelo direito de ser."

As pesquisadoras ressaltaram como Firmina escrevia voltada para seu tempo, mas era consciente do que seu gesto inaugural significava para o futuro e de como ele seria recebido pela elite ilustrada de então —algo evidenciado por um prefácio no qual anuncia que seu livro poderia ser recebido entre o riso e a indiferença.

Magalhães Pinto, a historiadora, ligou a narrativa literária escrita por Firmina a uma tradição mais ampla de cultura afrobrasileira, que ainda precisa ter sua imagem de "exótica e insólita" desmontada e entendida como fundadora do Brasil.

"Susana não é elaborada a partir de um acúmulo da literatura canônica brasileira, mas da produção de memória em narrativas orais", apontou, lembrando que Firmina era educadora e tinha imenso interesse pelas culturas e folclores populares. "É uma tradição que não se inicia com essa escritora."

Todas as participantes da mesa, vale dizer, eram mulheres negras, incluindo a mediadora, a jornalista Adriana Couto, e artistas do Slam das Minas que se apresentaram após o término da palestra. Já a plateia dentro da tenda da Flip era majoritariamente branca.

"Temos que perceber Firmina não como alguem que merece lugar no cânone branco, mas como alguém que teceu uma rede de solidariedade composta por sujeitos que ainda nao conhecemos", afirmou Magalhães Pinto. "Quem são as mulheres negras que construíram o século 19 e 20 com Maria Firmina dos Reis e ainda são desconhecidas?"

A Flip segue até domingo em Paraty com mais 19 mesas, numa programação que se inspira em Firmina para pautar histórias e artistas invisibilizadas.

Antes do começo da mesa, o diretor artístico Mauro Munhoz fez uma fala celebrando que a festa literária tenha chegado a sua 20ª edição, assim como os três curadores dessa edição, Fernanda Bastos, Milena Britto e Pedro Meira Monteiro.

A mesa completa pode ser vista no vídeo abaixo.

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