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Peça refaz ‘Hamlet’ com menos personagens e mantendo mesma energia

‘O Dia das Mortes na História de Hamlet’ recria a tragédia de Shakespeare com apenas quatro artistas em cena

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São Paulo

O rei da Dinamarca é assassinado pelo irmão, Cláudio, que se casa com a rainha. Ao descobrir o crime pelo espírito do pai, o príncipe Hamlet decide se vingar.

"Hoje à noite, Hamlet, já está tudo decidido, até o fim", diz Tiago Martelli, que faz o príncipe na adaptação "O Dia das Mortes na História de Hamlet", do célebre dramaturgo francês Bernard-Marie Koltès, que estreia no Sesc 24 de Maio, neste sábado, com direção de Guilherme Leme Garcia.

homem de cabelo platinado e roupa preta e mulher negra de olhos fechados e vestido prata
Tiago Martelli e Larissa Noel na montagem 'O Dia das Mortes na História de Hamlet' - João Pacca/Divulgação

"Hamlet" é a peça mais extensa de William Shakespeare. Ao abordar temas universais como traição e moralidade, ele provocou Sigmund Freud e Jacques Lacan, séculos mais tarde, a elaborar teorias psicanalíticas sobre o inferno interior de Hamlet, enquanto este reflete sobre o sentido de sua existência.

Koltès reescreve a história de Hamlet usando só quatro personagens do drama original —Hamlet, vivido por Tiago Martelli; sua amada Ofélia, papel de Larissa Noel; a rainha Gertrudes, encarnada agora por Lavínia Pannunzio, e Cláudio, encenado por Leopoldo Pacheco.

O resultado é a adição de novas camadas à história. "As relações mudam quando Koltès decide se concentrar nesses personagens", diz Pannunzio, fã declarada do dramaturgo.

Koltès é mais conhecido pelas peças da década de 1980, essencialmente narrativas, como "Na Solidão dos Campos de Algodão", de 1986, e "Roberto Zucco", de 1988.

"O Dia das Mortes na História de Hamlet", porém, foi escrita no início da carreira, quase como exercício de estudo da dramaturgia —reorganizar um clássico sem podar a sua potência. O resultado é uma afiada introdução a "Hamlet", sem perder intensidade.

Tomado pela raiva, o príncipe dinamarquês transita entre sanidade e loucura enquanto combate a hesitação em matar o tio. Sua angustia é transmitida quase num diálogo direto com o público.

A tensão do espetáculo escala, acompanhando a agressividade dos diálogos de Hamlet e Cláudio, e chega ao ponto de não retorno quando o rei, irado, percebe que não é possível conviver com o sobrinho.

Diferente do texto shakespeariano, na adaptação a rainha parece ser cúmplice de Cláudio. Dividida entre segredos que compartilha com o novo marido e a preocupação com o estado de angústia permanente do filho, não hesita em usar Ofélia como peça-chave em um jogo viciado pelas relações de poder estabelecidas dos personagens.

Mas, se em certos momentos a relação hierárquica entre Gertrudes e Ofélia é clara, em outros elas estão na mesma posição de vulnerabilidade frente às leis, à moral e às pressões dos homens.

Ofélia, que no original emana inocência e obediência, se torna a mais densa das personagens junto a Hamlet. "Temos como referência a Ofélia doce, recatada e do lar. Queríamos apresentar um pouco mais de posicionamento", conta Larissa Noel, que também canta em alguns momentos do espetáculo.

Somado à música, um forte jogo de luz e sombra, em contraste com o figurino em tons de cinza e azul marinho dos atores, contribui para aumentar o clima denso instaurado no palco e até a traduzir visualmente os sentimentos intensos dos personagens.

"Existe também um trabalho com artes plásticas", afirma o diretor, que reforça as escolhas visuais da peça. "É quase como se fosse um ringue."

O clima do espetáculo pode ser resumido na declaração de Cláudio, quando, desesperado, percebe que está em perigo —"a paz dilacerou-se".

Por fim, esse clima de paz dilacerada, como diz o personagem em cena sem margem para dúvidas, conduz toda a mise-en-scène da peça. Além do canto lírico, o cenário, composto apenas por um tablado, um pêndulo piramidal e holofotes, contribui com o forte jogo de luz e sombra.

"É como um ringue", afirma o diretor, ressaltando o tom soturno da nova montagem, que ressalta as emoções violentas da tragédia. Ou, como prevê Hamlet no início, "mais rápido que o espírito, os sombrios atos se mostram".

O Dia das Mortes na História de Hamlet

  • Quando Qui., sex. e sáb, às 20h; dom., às 18h. Até 9 de abril
  • Onde Sesc 24 de Maio - r. 24 de Maio, 109, São Paulo
  • Preço R$ 40, em sescsp.org.br
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Tiago Martelli, Lavínia Pannunzio, Leopoldo Pacheco e Larissa Noel
  • Direção Guilherme Leme Garcia
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