Sede da Funarte em SP tem mofo e salas interditadas e atribui problemas a Bolsonaro

OUTRO LADO: Autarquia diz que reformará o local, considerado o berço da vanguarda paulista, no ano que vem

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São Paulo

Nas paredes, falta reboco e sobram infiltrações. Carcomidas, as pilastras estão com as vigas expostas. No revestimento do teto, algumas placas desapareceram, enquanto outras estão mal fixadas.

Ao ultrapassar a faixa amarela que interdita o auditório, o cheiro de mofo invade as narinas do visitante. Na cabine de som e luz, há um buraco no forro de madeira em cima do disjuntor.

É este o estado do Complexo Cultural da Funarte em São Paulo, que se firmou nos 1980 como o berço da vanguarda paulista, mas hoje definha por problemas estruturais.

Complexo Cultural da Funarte em São Paulo tem infiltração de água, mofos nas paredes, salas interditadas e pinturas descascadas - Rubens Cavallari/Folhapress

Em nota, a autarquia do Ministério da Cultura atribui a degradação ao desmonte do setor promovido pelo governo de Jair Bolsonaro e afirma que começará a reformar o imóvel no primeiro semestre de 2024.

"O Ministério da Cultura também prepara o retorno de seu escritório regional em São Paulo para o Complexo Cultural da Funarte, ainda em 2023, o que certamente trará ainda mais relevância e oferta de serviços e atividades culturais para o espaço", afirma a entidade.

Servidores ouvidos pela reportagem sob condição de anonimato dizem que a deterioração do complexo se arrasta há anos, mas que o processo piorou há cerca de quatro meses.

Foi quando a sala multiúso Carlos Miranda e o auditório Guiomar Novaes precisaram ser interditados depois que um temporal agravou as infiltrações, que são um problema crônico do imóvel.

Com a chuva, o forro que reveste a cabine de som e luz cedeu, abrindo um buraco pelo qual a água entrou no local. Aconteceu um problema semelhante na sala multiúso. A água começou a escorrer em uma parede com tomadas, gerando nos funcionários o medo de acidentes. Por precaução, eles decidiram interditar ambos os ambientes.

O fechamento prejudicou a programação do complexo, que reduziu atividades como peças de teatro e apresentações musicais em razão da escassez de espaço. As interdições devem reduzir também o número de visitantes, que varia entre 11 e 12 mil por ano.

Os servidores dizem que as infiltrações se dão porque as calhas não comportam o volume de água que o imóvel recebe. Segundo eles, o problema teve origem em um erro de cálculo ocorrido em uma reforma feita entre 2004 e 2007. Por esse motivo, é preciso trocar as calhas, além de sete telhados.

Com cerca de 4.000 metros quadrados, a sede da Funarte na capital paulista conta ao todo com três salas multiúso, duas galerias, três ateliês, duas salas de ensaio e um auditório.

O espaço é considerado fundamental para compreender a vanguarda paulista, movimento musical que ganhou fôlego nos anos 1980. Artistas como Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção começaram suas carreiras na sala Guiomar Novaes, agora interditada.

Jorge Mautner lançou no centro cultural o disco "O Ser da Tempestade", que marcou a comemoração de seus 40 anos de carreira.

Casarão do Complexo Cultural Funarte-SP no centro de São Paulo - Rubens Cavallari/Folhapress

Embora não seja tombado, o imóvel está na área de tombamento do Theatro São Pedro, de modo que sua fachada deve ser preservada.

Além de problemas estruturais, a Funarte de São Paulo tem sofrido o que funcionários chamam de "sucateamento de pessoal".

Isso significa que servidores se aposentaram, mas não foram substituídos, o que sobrecarrega os sete funcionários concursados do complexo. O último concurso público da instituição aconteceu em 2014.

Em nota, a autarquia diz que o Ministério da Cultura já sinalizou que a recomposição dos quadros de funcionários é uma das prioridades do governo, mas não deram uma data para isso acontecer.

Os servidores também lidam com questões mais prosaicas. Durante a pandemia, o governo Bolsonaro cortou linhas de telefone para diminuir gastos, restando apenas um aparelho na instituição. Com isso, os funcionários precisam usar os próprios telefones para resolver questões do trabalho.

Esta não é a primeira vez que a Funarte se vê às voltas com a degradação estrutural. Em 2021, um prédio da autarquia no centro do Rio de Janeiro precisou ser interditado por causa das más condições físicas.

O local abrigava o Centro de Documentação e Pesquisa, o Cedoc, que guarda um acervo com mais de 2 milhões de itens, entre livros, periódicos e fotografias.

Na época, a autarquia avaliou que as condições do edifício colocavam em risco a integridade do acervo e dos funcionários. Em janeiro deste ano, a instituição começou a transferir os itens para a Casa da Moeda, onde o Cedoc funcionará. A mudança deve ser concluída em setembro.

A Funarte, ligada ao Ministério da Cultura, é uma autarquia criada em 1975 para formular e executar políticas públicas nas áreas de circo, dança, teatro, música e artes visuais. Em 1977, a entidade abriu uma representação em São Paulo e ocupou o imóvel no bairro dos Campos Elíseos no qual está instalada até hoje.

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