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Livro conta como Sergio Rodrigues mobiliou os palácios de Brasília

Móveis e ambientes que designer carioca criou para a capital são lembrados em textos e imagens históricas pouco vistas

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Poltronas da sala Alberto Nepomuceno, no Teatro Nacional Cláudio Santoro, em Brasília, desenhadas por Sergio Rodrigues

Poltronas da sala Alberto Nepomuceno, no Teatro Nacional Cláudio Santoro, em Brasília, desenhadas por Sergio Rodrigues Rafael Gontijo/Divulgação

São Paulo

Em abril de 1962, as expectativas estavam altas para a inauguração do auditório da Universidade de Brasília. As 250 poltronas da sala —projetadas por Sergio Rodrigues, um designer de móveis com poucos anos de carreira à época, mas já muito bem-sucedido— foram produzidas e instaladas em tempo recorde, num contexto de euforia com a construção da nova capital do país.

No evento da inauguração do Auditório Dois Candangos, contudo, houve um imprevisto. Segundo um relato histórico do próprio Rodrigues, uma das poltronas não ficou pronta no prazo. Para que nenhum dos convidados notasse o buraco na plateia, ele mesmo ficou em pé no lugar do assento.

Desenho de Sergio Rodrigues para a poltrona Beto, criada para o Palácio do Planalto
Desenho de Sergio Rodrigues para a poltrona Beto, criada para o Palácio do Planalto - Divulgação

A anedota ilustra a relação do criador da poltrona Mole com Brasília, tema do livro "Sergio Rodrigues em Brasília 1956 - 1981". O volume recém-lançado reúne nove textos de diversos autores e uma seleção de fotos históricas pouco vistas sobre o papel de um dos pioneiros do móvel moderno brasileiro em definir os interiores de prédios emblemáticos da capital federal.

Além das poltronas do auditório da universidade, o carioca projetou o mobiliário do refeitório e também dos alojamentos dos professores e dos estudantes. Para edifícios-sede do poder, Rodrigues desenvolveu a ambientação e os móveis —mesas, cadeiras, bancos, poltronas e sofás— para o Palácio do Itamaraty, além de ter criado uma cadeira, a Beto, especialmente para o Palácio do Planalto.

"Foi a partir de Brasília que Rodrigues constituiu a sua carreira. Ele esteve em contato com pessoas que proporcionaram um salto qualitativo na sua profissionalização", afirma Marcelo Mari, o organizador livro, acrescentando que até agora não havia pesquisas sobre a trajetória do designer em Brasília.

Mari conta que as encomendas que Rodrigues recebeu de Oscar Niemeyer, o arquiteto de Brasília, de Darcy Ribeiro, então reitor da universidade local, e de outras pessoas ligadas ao governo federal foram determinantes para que o designer passasse da produção artesanal de móveis para a fabricação em larga escala.

Ele foi chamado para mobiliar os palácios pouco depois de inaugurar a sua loja, Oca, no Rio de Janeiro, em 1955, momento em que desenvolvia a linguagem característica de seus móveis. É desta época, por exemplo, a criação da poltrona Oscar, parte da mobília do Palácio da Alvorada que se tornou um clássico do móvel brasileiro com seu desenho leve de braços curvos e assento de palhinha.

A boa recepção das peças do designer em Brasília e a qualidade de seu desenho, que ganhava reconhecimento internacional com a poltrona Sheriff, uma variação da poltrona Mole premiada na Itália, garantiram a Rodrigues o convite para mobiliar a embaixada do Brasil em Roma.

Um dos textos do livro aborda as negociações de anos para que os ambientes do Palácio Pamphilij recebessem os móveis do modernista, e outro, de Roseli Sartori, responsável pelo patrimônio histórico e artístico da embaixada, trata da preservação e do restauro deste mobiliário, em uso há 60 anos. Há fotos de arquivo e atuais mostrando, por exemplo, a troca do estofado original branco pelo preto em sofás e poltronas do gabinete do embaixador.

Poltrona Oscar, de Sergio Rodrigues
A poltrona Oscar, de Sergio Rodrigues - Andre Zimmerer/Divulgação

Rodrigues nasceu em 1927 e começou sua carreira como arquiteto, mas se firmou como designer de móveis. Ele se preocupava com os encaixes de madeira das peças que criava, e ficou conhecido pelo uso do jacarandá —à época permitido— e do couro nas poltronas e sofás que vendia na loja Oca, um ponto de encontro de intelectuais e gente das artes no Rio de Janeiro da metade do século 20. O designer morreu devido às complicações de um câncer em 2014, aos 86 anos.

Junto com Joaquim Tenreiro, Bernardo Figueiredo e outros designers do período, Rodrigues desenvolveu a estética do mobiliário que deveria dialogar com a arquitetura majestosa proposta por Niemeyer para Brasília. Não se tratava somente de produzir mesas e cadeiras para gabinetes de governo, mas de imbuir as peças de uma identidade brasileira, assim como a nova capital vendia a imagem de um Brasil novo e moderno.

Para o organizador do livro, foi a arquitetura, mais do que a arte, que se impôs como um símbolo da modernização do Brasil, porque segundo ele edifícios têm impacto público maior do que obras de arte, restritas a um grupo menor de pessoas. Brasília seria o exemplo máximo disso.

Foi neste contexto que Rodrigues e a sua geração construíram o móvel brasileiro. Segundo Mari, "eles tinham esse sentimento de que o Brasil podia produzir coisas inovadoras e dar contribuição à cultura internacional".

Sergio Rodrigues em Brasília 1956 - 1981

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