'Meu Casulo de Drywall' segue regras de 'filme bem-feito', mas cai no dramalhão

Longa-metragem de Caroline Fioratti observa classe média alta pelo prisma da insegurança, comum nas grandes cidades do país

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Meu Casulo de Drywall

  • Onde Em cartaz nos cinemas
  • Classificação 18 anos
  • Elenco Maria Luisa Mendonça, Michel Joelsas, Caco Ciocler
  • Produção Brasil, 2023
  • Direção Caroline Fioratti

"Meu Casulo de Drywall" tem, de início, uma proposição pouco explorada: como vivem os brancos de classe média alta, recolhidos em seus condomínios exclusivos, de certa maneira excluídos das dores do restante da população.

No caso, a jovem Virginia (Bella Piero) pede à mãe, Patricia (Maria Luísa Mendonça) que não fique em casa durante a festa em que vai comemorar os seus 17 anos. A mãe reluta, mas concorda, pois a filha garante que não haverá perigo algum.

Dito e feito: Virginia morre durante a festa. O "plot" está dado. O pai de Virginia, um juiz, ausente antes e durante a festa, aparece para dar uma bofetada em Patricia e culpá-la por deixar os adolescentes entregues a si mesmos. Ou seja, não há elementos externos nessa história. A segurança estava garantida contra qualquer invasão do condomínio ou coisa assim.

Um homem branco, de camisa azul e expressão facial neutra, abraça uma mulher que parece sofrer. Ela está com os braços pendidos e ele a segura com apenas um braço
Cena do filme 'Meu Casulo de Drywall', de Caroline Fioratti - Stella Carvalho/Divulgação

O ambiente do filme destoa da maior parte do cinema brasileiro contemporâneo, o que não é um defeito. Observar a classe média alta pode ser tão interessante quanto observar essa entidade que normalmente chamamos por "o povo" (os pobres, os sobreviventes em geral).

O tema a ser tratado por Caroline Fioratti é o que se pode chamar de universal: diz respeito não propriamente à segurança, mas à da insegurança, que faz tanto sucesso nas grandes cidades do país.

A insegurança (e sua indústria) está instalada na cabeça dos que podem se proteger de alguma forma. Trata-se, vamos chutar, de no máximo uns 10% da população. Mas os restantes 90% também assistem ao programa do Datena e congêneres e sentem a insegurança com a mesma intensidade que os demais. Então, o que o filme de Fioratti encaminha é que temos dois problemas: um é a segurança real (ou a falta de), o outro é o sentimento de insegurança, ou o seu imaginário.

Formulada a questão, que é bem interessante, o filme de Fioratti passa a patinar no dramalhão mais sinistro. De um lado temos os outros jovens envolvidos com Virginia, por amizade ou namoro: à parte pequenos deslizes aceitos como naturais na adolescência, nada os culpabiliza.

De outro, temos Patricia, que assume toda a responsabilidade pelo acontecimento: não só foi ela que estava fora na hora da tragédia, como, ao fazer a limpeza da festa, encontra camisinhas e tal. Tudo se transforma em sintoma de falta, de indevida despreocupação com relação à filha e seus amigos.

Nesse ponto, o filme desvia-se da questão da segurança para a da culpabilidade. Virginia parece achar que mereceu a bofetada que levou do marido. Mas o drama da culpa interessa bem pouco em si. O filme perde em interesse e Maria Luísa Mendonça gasta seu talento chorando aos borbotões, mas ainda assim não consegue partilhar seu sentimento nem com outros personagens, nem com o público. Em outras palavras, esse choro não tem significado dramático e, se não tem significado, o filme morre, abalroado por um soluçar tão intenso quanto vazio.

Fioratti mostra, ainda que por vias transversas, que, por mais que nos cerquemos de medidas de segurança, podemos sempre ser surpreendidos pelo acaso. A ausência da polícia no filme é eloquente a esse respeito. A sua reflexão parece se encaminhar para isso.

Ao mesmo tempo, como seu filme detém-se na questão da culpa de cada um (de Patricia, sobretudo), o sentido fica rebaixado. O melodrama em questão quando muito interessa aos personagens do "Casulo de Drywall", que, diga-se, tem cuidado para responder às regras do "filme bem-feito", mas não para produzir as astúcias que poderiam torná-lo de algum modo memorável.

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