Indicação de Pedro Parente é confirmada na BRF, e Abilio perde poder

Atual presidente do conselho, empresário só teve um nome indicado para os acionistas

Igor Gielow Raquel Landim
São Paulo

O Conselho de Administração da BRF aprovou a indicação do nome do presidente da Petrobras, Pedro Parente, para assumir o comando do colegiado da maior processadora de alimentos do Brasil, que passa por grave crise.

O presidente da Petrobras e indicado para chefiar o conselho da BRF, Pedro Parente, dá entrevista após leilão de campos de petróleo em março, no Rio
Presidente da Petrobras e indicado para o conselho da BRF, Pedro Parente dá entrevista em março - Pilar Olivares - 29.mar.2018/Reuters

O empresário Abílio Diniz deixará o comando do conselho, que presidia desde 2013 com apoio do fundo Tarpon, em um acerto costurado por seus maiores adversários no conjunto dos acionistas: os fundos de pensão Petros (da Petrobras) e Previ (do Banco do Brasil).

Parente será o nome recomendado pelo conselho atual à assembleia de acionistas marcada para o dia 26. A votação, contudo, continuará sendo vaga a vaga para os dez assentos do colegiado. A lista de recomendações dos outros nomes, definida durante reunião do conselho nesta quinta (19), é francamente desfavorável ao empresário, que terá nominalmente apenas um representante.

Será Flávia Almeida, do Península, holding da família Diniz que tem 3,92% das ações da empresa. O Tarpon, fundo que viabilizou a gestão Abilio e tem 7,26% da BRF, ficou sem nomes sugeridos.

Os fundos de pensão indicaram Francisco Petros, Walter Malieni Jr e Augusto Cruz, e têm sob sua responsabilidade a sugestão dos independentes Roberto Mendes, Dan Ioschpe e José Luiz Osório. Completam a lista os ex-ministros Roberto Rodrigues e Luiz Fernando Furlan, este que esteve próximo de Abilio recentemente.

Não haverá chapa indicada porque o fundo britânico Aberdeen, dono de 5,02% do controle da BRF, manteve o pedido feito na semana passada pelo chamado voto múltiplo. A reunião desta quinta não deliberou sobre temas nevrálgicos como a manutenção do atual presidente-executivo, José Drummond.

A solução Pedro Parente animou o mercado. A BRF, que tivera alta de 9,51% em suas ações quando o acordo transpareceu na tarde de quarta (18), fechou a quinta em alta de 5,5%, a R$ 24,25, patamar de 2010. Muito disso, contudo, se deve à extrema depreciação dos papéis da empresa. No fim de 2015, a ação valia quase R$ 70, no auge do sucesso da gestão Abilio. 

A mudança é a culminação de um processo que arrastou a empresa durante dois anos, agravado em 2017. No ano passado, a BRF foi afetada diretamente pela Operação Carne Fraca, que investiga irregularidades na produção de carnes no país —nesta quinta, a União Europeia descredenciou 12 fábricas exportadoras de frango sob suspeita da empresa

Além disso, houve problemas de gestão, indicados em auditorias internas. O endividamento da empresa, que era mínimo antes da chegada de Abilio e o Tarpon, chegou a quase cinco vezes o chamado Ebitda (lucro antes de pagamento de juros, impostos, depreciação e amortizações).

Em 2017, a empresa perdeu seu presidente-executivo, o executivo do Tarpon Pedro Faria, abatido pela crise. O braço direito de Abílio no dia-a-dia da BRF, o vice-presidente José Roberto Pernomian Rodrigues, saiu após ser condenado em segunda instância por uma fraude em outra empresa. Dois ex-conselheiros foram implicados como infiltrados da JBS no escopo da delação da rival e outro, o ex-presidente da Petrobras e do BB Aldemir Bendine, acabou preso pela Operação Lava Jato.

A resultante dessa tempestade foi um prejuízo recorde de R$ 1,1 bilhão registrado no ano passado, o estopim para que os fundos de pensão pedissem a cabeça de Abílio e sugerissem uma nova chapa à assembleia dos acionistas, encabeçada pelo executivo Augusto Cruz, no fim de fevereiro.

Desde então, houve uma grande queda de braço e quase um acordo foi fechado, no qual Abílio e seu grupo manteriam três assentos no conselho. Contrária ao bônus de R$ 40 milhões que o empresário queria dar a Drummond, a Petros interrompeu a negociação.

Abílio reagiu, indicando uma chapa presidida por Furlan, herdeiro da Sadia e negociador da fusão da marca com a Perdigão, que deu origem à gigante BRF em 2009. Só que o movimento foi esvaziado da semana passada para cá, com a saída de nomes sugeridos por Abílio da chapa e pelo pedido de voto múltiplo por parte do Aberdeen que jogou combinado com os fundos.

Segundo a Folha apurou, Abilio descobriu a negociação entre pelo nome de Parente, conduzida pelos fundos de pensão. Na condição de presidente da empresa que emprega os cotistas da Petros, ele tem larga influência sobre o fundo, o que azeitou as conversas.

Com isso, Abilio interveio, exigindo assumir a indicação de Parente. Chegou a enviar Flávia Almeida a Londres, onde o presidente da Petrobras se encontrava, para conversar sobre o assunto. Em público, portanto, e em nome de uma transição menos beligerante, Abilio emergiu como o autor do convite já negociado.

Ato contínuo, a Petros e a Previ também defenderam o nome de Parente, que aceitou o convite quando teve certeza da unanimidade.

PERFIL

Parente, 65, é visto no mercado como um executivo especializado em crises. Como ministro da Casa Civil de Fernando Henrique Cardoso, supervisionou a mitigação do impacto do colapso energético de 2001 ao chefiar o que se apelidou de "ministério do apagão". Ganhou fama de organizado e eficaz no encaminhamento de problemas.

Teve passagens por setores diversos (comunicação na RBS, agronegócios na Bunge e gestão de recursos na Prada) e desde 2016 preside um processo bem sucedido de recuperação gerencial e de imagem da Petrobras, que havia sido implodida pelo esquema do petrolão desvendado pela Lava Jato.

Ele continuará à frente da petroleira, mas deixará a chefia de conselho que hoje ocupa, a do B3, empresa que administra a Bolsa de São Paulo. Seu acordo com a Petrobras só lhe permite ter um cargo do gênero fora do universo de empresas ligadas à estatal. Em entrevista nesta quinta no Rio, ele disse não haver conflitos éticos em caso de assumir a BRF.

 
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