Empresário cria app de corridas da Brasilândia

Serviço é oferecido por motoristas do bairro, que não temem ir onde Uber e outros apps não chegam

Filipe Oliveira
São Paulo

Se a Uber e os outros aplicativos de corrida não vão à Brasilândia, a Brasilândia faz seu próprio aplicativo.
Por estar em área considerada de risco, o bairro na zona norte de São Paulo não é bem atendido pelos serviços de transporte. A reportagem tentou chamar um Uber ali e recebeu mensagem de que não havia carros disponíveis. 

Motoristas também se recusam a levar passageiros até lá por medo de entrar na região.
Alternativa local, o Jaubra foi idealizado e é tocado por um morador nascido e criado ali, Alvimar da Silva, 50. 

Seu escritório é a sala de casa, no piso térreo do sobrado onde ele mora com a mulher e o filho. Ali fica a central de atendimento, com dois profissionais recebendo pedidos feitos via WhatsApp ou telefone. 
 

Alvimar da Silva e a filha, Aline, sua sócia, em frente a um carro vermelho, com vista para o bairro da Brasilândia
Alvimar da Silva e a filha, Aline, sua sócia, na Jaubra, serviço de transporte da zone norte da capital paulista - Patricia Stavis/Folhapress

Alvimar trabalhou como motorista a maior parte da vida. Em 2016, entrou para a Uber. Na época, já gostava mais de atender o bairro do que ir para o centro da cidade procurar passageiros.

Por ideia do sobrinho, imprimiu 500 cartões e os distribuiu para potenciais clientes. Logo recebia tantas chamadas que começou a ter de passar parte delas para amigos. Daí veio a ideia de começar uma cooperativa, afirma.

O nome original, Ubra, surgiu de madrugada, da abreviação de Unidos da Brasilândia. Mas, depois, Alvimar achou melhor mudar, incluindo a palavra Já para dar ideia de agilidade e não criar caso com a competidora Uber.

O negócio começou há um ano e logo chamou a atenção dos jornais locais. Tanto que, no início, o serviço não dava conta da demanda e clientes ficavam frustrados, diz Alvimar. “Alguns pensavam que eu estava fazendo propaganda enganosa, entendiam que tinha montado um Uber no bairro com carros à vontade.”

Um ano depois, o serviço tem 13.200 clientes cadastrados e 50 motoristas ativos, todos moradores locais. Outros 400 estão na fila de interessados em atender corridas. A inclusão deles depende de atualização tecnológica da empresa, que deve ocorrer neste mês.


Segundo Alvimar, os motoristas são respeitados no bairro. “Os próprios usuários propagam no bairro que é algo bom para eles, que transportamos a mãe, a avó, o filho deles, que fazemos um trabalho digno e de inclusão social.”

Os finais de semana concentram o maior movimento. É comum que a Jaubra leve moradores a baladas e ao sambódromo, diz Alvimar.

A startup já tem um aplicativo, doado por outra companhia a Alvimar logo no começo do negócio. Porém o empresário conta que levou seis meses para adotá-lo.

“Eu não tinha entendimento, não sabia como usar. Tinha até medo dessa tecnologia”, diz. Isso mudou quando a filha de Alvimar, Aline Landin, 28, viu que o negócio crescia e que seu pai precisava de apoio para geri-lo. 

Deixou então seu emprego como bancária e investiu R$ 20 mil no negócio, tornando-se sua sócia.
Sem o apoio tecnológico, muitas corridas eram anotadas no papel e o pai acabava perdendo dinheiro, diz Aline. Agora, mesmo quando as chamadas são feitas por ligação ou WhatsApp, são todas cadastradas na plataforma pelos atendentes do serviço. 

Hoje Aline cuida das contas e da administração. Alvimar cuida do atendimento a clientes e motoristas.
Eles participaram de programa de aceleração da Artemisia, ONG que apoia negócios de impacto social.

Receberam dela US$ 6.600 (cerca de R$ 23 mil) para investir em novo app para a empresa.

A companhia recebe cerca de 5.000 chamadas por mês. Aline diz que o negócio ainda não dá lucro, mas paga suas contas, de R$ 10 mil mensais.

A dupla quer expandir a Jaubra para outras regiões. Já houve até convites para levar o serviço para mais estados, mas a ideia é começar pela zona leste de São Paulo. 

O fotógrafo Diogenes da Silva, 57, dirige para a Jaubra há cinco meses. Começou no aplicativo porque, devido à economia desaquecida, vinha recebendo menos serviços para sua atividade principal.

Morador da Cachoeirinha, próximo à Brasilândia, diz fazer questão de trabalhar com o serviço por conhecer todo o mundo e todos os becos de lá e não se sentir em perigo.

“Faço questão de trabalhar aqui, porque vejo que existe uma carência muito grande desse serviço”, diz. Ele também está cadastrado no aplicativo 99. Afirma que, quando uma corrida o leva para longe da Brasilândia, passa a atender no outro serviço para não voltar para o bairro com o carro vazio.

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