Descrição de chapéu dólar câmbio

Dólar vai a R$ 3,81 e fecha no maior patamar em mais de dois anos; Bolsa cai 2,5%

Real, assim como outras moedas emergentes, é atingido por fuga de capital

Anaïs Fernandes
São Paulo

O dólar disparou ante o real nesta terça-feira (5) e se valorizou também sobre importantes moedas emergentes, conforme ameaças comerciais entre Estados Unidos e seus parceiros se intensificam e mais dados fortes da economia americana reforçam a possibilidade de alta adicional nos juros por lá.

No cenário nacional, investidores observam ainda com temor o vaivém das notícias sobre o futuro da política de preços da Petrobras e incertezas no front político a respeito das eleições de outubro.

O dólar comercial fechou em alta de 1,81%, cotado a R$ 3,812, maior nível desde 2 de março de 2016 (R$ 3,889). O dólar à vista avançou 1,01%, para R$ 3,780.

O Ibovespa, índice que reúne as ações mais negociadas da Bolsa brasileira, caiu 2,49%, para 76.641,73 pontos, reforçando a aversão a risco do investidor e pressionado por papéis da Petrobras, além de bancos e da Eletrobras. O giro financeiro foi de R$ 12,2 bilhões. 

"As perspectivas são muito ruins. A crise fiscal é séria", afirmou o economista e sócio da NGO Corretora Sidnei Nehme. "A economia não anda, nem vai andar, porque empresários não vão investir com esse elevado grau de incerteza. Todo o cenário ficou ruim", acrescentou.

A escalada do dólar frente ao real aconteceu apesar da intervenção do Banco Central no câmbio pela manhã, quando fez leilão, mais uma vez, de novos swaps cambiais tradicionais (equivalente à venda futura de dólares), vendendo a oferta integral de até 15 mil contratos —além de realizar leilão de até 8.800 swaps para rolagem do vencimento de julho.

"O mercado está tentando colocar o Banco Central contra a parede para que ele entre com mais vigor", avalia Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio da Treviso Corretora.

Para tentar conter a alta do dólar, o BC anunciou, por volta de meio-dia, oferta adicional de até 30 mil contratos, dos quais vendeu 16,2 mil. Logo depois, anunciou segunda operação, para ofertar o restante (13,8 mil), mas só vendeu 6.110 contratos.

Em comunicado divulgado no mês passado, quando iniciou as ofertas de 15 mil contratos, o BC já havia indicado que poderia realizar atuações adicionais como a de hoje a qualquer momento, se necessário.

Para Cleber Alessie, operador de câmbio da corretora H.Commcor, o mercado indica que não está tão interessado em swaps. "Fica a percepção de que está querendo outra forma de intervenção e pode ser o leilão de linha, que supre a demanda no mercado à vista", acrescentou ele, referindo-se aos leilões do BC de venda de dólares à vista com compromisso de recompra.

EXTERIOR

A desvalorização do real reflete movimento compartilhado entre moedas emergentes como um todo. O dólar avançou sobre 14 das 31 principais divisas do mundo.

O peso mexicano recuou 1,76%, após o México anunciar que vai impor tarifas de 15% a 25% sobre produtos siderúrgicos americanos e alguns itens agrícolas, em retaliação às tarifas sobre metais anunciadas pelo presidente dos EUA, Donald Trump.

O rand sul-africano recuou 1,4%, enquanto o peso chileno caiu 0,18%, e a lira turca e o rublo russo perderam 0,13% cada um.

No Canadá, outro país que voltou ao radar das tarifas de Trump, o dólar canadense se desvalorizou 0,38%.

"O que vem precificando o dólar mais alto há um tempo já é o exterior, a briga comercial entre Estados Unidos e China e as relações no comércio internacional", diz Galhardo, que não descarta um dólar chegando a R$ 4 neste ano com o cenário eleitoral brasileiro incerto e instabilidades no exterior.

Ainda no cenário externo, o índice de atividade de serviços nos Estados Unidos, divulgado pela manhã, apontou que o setor acelerou em maio, ao mesmo tempo em que dados de sexta (1º) mostram que a abertura de vagas de trabalho atingiu máxima recorde em abril, ambos os indicadores mostrando crescimento econômico robusto do país no segundo trimestre.

Neste contexto, aumentam ainda mais as apostas de investidores de que, com um aumento da inflação, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) pode elevar a taxa de juros mais três vezes neste ano —por enquanto, a previsão é de mais dois aumentos.

A elevação de juros nos EUA atrai para o país um fluxo global de capital até então alocado em mercados considerados mais arriscados, como os emergentes, incluindo o Brasil.

"O que pegou mais forte hoje no câmbio e nas moedas emergentes, incluindo o real, foram os índices de atividade nos EUA, que indicam uma pressão sobre a inflação crescendo de maneira gradual e consistente, corroborando com a previsão de mais três altas nos juros neste ano e gerando uma fuga de países emergentes", afirma Bruno Foresti, gerente de câmbio do banco Ourinvest.

BRASIL

No cenário interno, incertezas políticas sobre as eleições de outubro também não aliviam. 

Pesquisa DataPoder360 divulgada nesta terça mostrou Jair Bolsonaro (PSL) em primeiro nas intenções de voto, seguido por Ciro Gomes (PDT). "Extremos seguem fortes", escreveu a Guide Investimentos em seu relatório.

Geraldo Alckmin (PSDB), visto pelo mercado como um candidato com perfil reformista, não decola, segundo o levantamento. "Apesar de [a pesquisa] não ter muita credibilidade ainda junto aos agentes de mercado, aponta mais uma vez para a desidratação de Geraldo Alckmin e o avanço significativo de Ciro Gomes sem contar na consolidação e Bolsonaro", avalia André Perfeito, economista-chefe da Spinelli Corretora, em seu relatório.

"Não temos consenso sobre nenhum governo que se apresente e agrade o mercado. O investidor procura um porto seguro no dólar e aumenta a possibilidade de hedge [busca por proteção]. Há também desmonte de operações por aqui", diz Galhardo.

Investidores seguem também cautelosos com os desdobramentos da paralisação dos caminhoneiros e os impactos sobre a política de preços da Petrobras.

Os papéis da Petrobras tiveram mais um dia de fortes quedas: -5,36% (preferenciais) e -3% (ordinários).

A petroleira havia indicado ao governo que aceita debater a revisão da política de reajuste diário do preço da gasolina, desde que a cotação internacional do combustível continue a servir de referência para o preço no mercado interno.

"O mercado se preocupa com sinalizações populistas", afirma Galhardo.

Nesta terça, no entanto, o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, negou que o governo esteja estudando qualquer programa de subsídio para reduzir o preço da gasolina

"Há uma indecisão e um empurra-empurra em relação às responsabilidades sobre os preços dos combustíveis. Isso é muito ruim para a economia no geral", diz Marco Tulli, da Coinvalores. 

O CDS (credit default swap, termômetro do risco-país) subiu 2,09%, para 236,4 pontos. No mercado de juros futuros, os contratos mais negociados subiram. O DI com vencimento em julho de 2018 avançou de 6,428% para 6,459%. O DI para janeiro de 2019 subiu de 6,71% para 6,9%. 

"Uma soma de vários fatores: um cenário internacional menos favorável, e uma cautela crescente por conta das eleições presidenciais", avaliou a Guide.

BOLSA

Das 67 ações do Ibovespa, 59 caíram e oito subiram. 

Além da Petrobras, o índice foi puxado para baixo com queda nos papéis dos bancos —o que pode indicar saída de investidor estrangeiro— e da Eletrobras.

"A saída de estrangeiro de mercados de capitais continua", afirma Tulli. Maio registrou saldo externo negativo de R$ 8,4 bilhões, e junho começa com saída líquida de quase R$ 1 bilhão.

​As baixas foram lideradas, porém, pelas ações da Eletrobras: as preferenciais recuaram 8,15%. A Justiça trabalhista suspendeu nesta terça o processo de desestatização da empresa. Os papéis ordinários caíram 7,81%.

A baixa no Ibovespa só não foi maior porque as empresas de siderurgia e celulose seguraram o índice.

A Suzano Papel e Celulose comandou as altas, avançando 2,70%. A Fibria subiu 1,15%. Atrelados ao dólar, os papéis da empresa são considerados mais defensivos em um cenário de aversão ao risco.

A Vale subiu 2,3%, com a alta do preço do minério de ferro à vista na China. A Gerdau  avançou 1,76%, e a CSN, 0,11%, após forte alta no pregão anterior. A Usiminas foi a exceção, caindo 2,76%. 

Com a Reuters

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