Quem apregoa livre mercado deve exercitá-lo, diz Sindaçúcar

Senado aprovou a venda direta do etanol das refinarias para os postos na noite de terça

Nicola Pamplona
Rio de Janeiro

Uma das lideranças na proposta de mudança no modelo de venda de etanol no Brasil, o presidente do Sindaçúcar-PE (Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool de Pernambuco), Renato Cunha, defende que ela dá mais opções ao consumidor.

Cunha afirma que o modelo atual, que garante exclusividade às distribuidoras de combustíveis, é excludente e gera ineficiências. E que credita que a revisão ocorrerá "mais dia, menos dia", já que o tema é objeto de outros projetos no Congresso —na Câmara, o deputado Mendonça Filho (DEM-PE) tenta alterar as regras de venda de etanol.

Senado aprova a venda direta do etanol das refinarias para os postos de gasolina - Adriano Vizoni/Folhapress

Cunha argumenta que a nota fiscal eletrônica impede a sonegação de tributos e que a qualidade do combustível é garantida pelas usinas. "Só é contra quem tem temor perder lugar na cadeia [de suprimento]", disse à Folha nesta terça (19), momentos antes da votação do projeto no Senado.

 

O sr. acha que terá apoio político para aprovar a venda direta?

É inevitável. Outros parlamentares têm projetos semelhantes. Mais dia, menos dia, a sistemática que permite aos postos adquirirem produtos de outra fonte vai se tornar realidade. Hoje, é exclusividade da distribuidora. Nossa proposta não é excludente, ela só vai criar uma nova opção. O modelo atual não tem mais sentido, principalmente com o código do consumidor, com a nota fiscal eletrônica. Ficou ultrapassado.

O benefício não seria só localizado, para consumidores que estão perto das usinas?

Não tem nada de localizado. O maior produto do etanol é o hidratado, é o que vende mais. E o posto que está perto da usina não pode ter essa alternativa? Só é contra quem tem o temor de perder lugar na cadeia [de suprimento]. É preciso ser muito ineficiente, com toda a estrutura que as distribuidoras têm. Esse pessoal que apregoa livre mercado tem que exercitar o livre mercado. Quem imaginava há dez anos que seria possível vender energia elétrica direto para um consumidor não cativo das distribuidoras de energia?

Mas são necessárias mudanças na tributação.

O ICMS não muda nada. No caso dos impostos federais, o governo teria que se adequar. Mas essa preocupação não tem que ser da Única (União da Indústria de Cana-de Açúcar) nem de ninguém. O governo federal é maduro na cobrança de impostos, ainda mais em combustíveis, que têm grande arrecadação. Os argumentos contrários parecem coisa de quem quer se perpetuar.

Como fiscalizar a qualidade?

O certificado de qualidade hoje já é gerado na usina, que também tem que gerar contraprovas. Não tem nada que impeça a mudança no modelo.

A greve dos caminhoneiros ajudou no convencimento pela mudança?

O Brasil quer fazer revisões das ineficiências. Sem dúvida nenhuma, esse momento de greve mostrou o quão ineficiente é o modelo rodoviário de transporte no país, mostrou o quão ineficiente é o modelo de distribuição de combustíveis. Essa é uma bandeira antiga, que o setor sempre perseguiu. O dono do posto vai ter duas opções. E, no momento em que ele tiver duas opções, o consumidor também vai ter.

A venda direta valeria apenas para bandeira branca ou para postos com bandeiras de distribuidoras?

Poderia ser para qualquer bandeira. O próprio Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] já se manifestou contra essa fidelidade de bandeiras. Tem usina que tem distribuidora e posto, essa verticalidade é positiva? Precisa dar um freio de arrumação para que o mercado tenha mais equilíbrio. Nós queremos o direito de vender. Só. Ponto. Por que eu não posso vender ao posto se ele pode?

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.