Nova geração de gestoras globaliza aplicações de pequenos investidores

Mais acessíveis, casas de ex-executivos de bancos pedem de R$ 5 mil a R$ 25 mil de aporte inicial

Ana Paula Ragazzi
São Paulo

O cenário de juros brasileiros nas mínimas e do investidor doméstico migrando para os fundos multimercado em busca de retornos maiores impulsiona novas gestoras de recursos no país.

São casas que abriram nos últimos meses, mas não estão nas mãos de novatos. A maioria foi criada por executivos que comandaram áreas de investimento de grandes bancos. A estratégia dominante é manter um olho aqui e outro lá fora, em busca de diversificação e variedade de opções de ativos internacionais.

Os fundos estarão em plataformas de investimento. Isso equivale dizer que, com aplicações iniciais entre R$ 5 mil e R$ 25 mil, o pequeno investidor poderá contar com a gestão desses profissionais, antes alocados nas áreas privates dos bancos.

A Dahlia Capital reúne a experiente equipe de análise de ações do Bank of America Merrill Lynch. Com mais de dez anos no banco, os quatro sócios decidiram deixar o BofA para fazer algo diferente e dar espaço à equipe treinada por eles mesmos. Como tinham expertise em análise, precisavam de um gestor e fizeram a parceria com José Rocha, ex-Apex Capital.

A ideia da Dahlia é operar um fundo multimercado, mas com foco na análise das empresas do Brasil e da América Latina. Os sócios Sara Delfim e Felipe Hirai explicam que a ideia é, pela análise de uma empresa, definir várias possibilidades de investimentos, a partir de fatores macroeconômicos que pesam no negócio. Se for uma mineradora ou uma companhia de aviação, como exemplos, eles podem ter ideias de aplicações em commodities ou moedas. Ou ainda, em vez de optar pelas ações das companhias, escolher títulos de dívida ou até derivativos (produto sofisticado que lida com indicadores financeiros e de produtos).

A empresária Sara Delfim que, com os demais sócios, saiu com Bank of America Merrill Lynch para criar a Dahlia Capital - Karime Xavier/Folhapress

A Dahlia está com R$ 30 milhões sob gestão, dinheiro do bolso dos sócios, e neste mês de julho inicia a captação de clientes. "O comprometimento é total. Se der certo ou se der errado, será com o dinheiro dos sócios", diz Sara Delfim. Antes de iniciar a captação, eles trabalharam por alguns meses para testar a integração dos sócios. "A equipe já nasceu unida", afirma ela.

Por contar com profissionais que passaram por grandes instituições financeiras, a nova geração de gestoras tem experiência para lidar com o sobe e desce do mercado --a chamada volatilidade.

A MZK, formada por antigos gestores que deixaram o HSBC cerca de um ano após ele ter sido adquirido pelo Bradesco, é um exemplo. O sócio Marco Mecchi levou para sua casa a equipe dele no banco.

"Aqui, a maior experiência dos quatro principais gestores está nos negócios com câmbio e juros", diz. Cada um deles dividirá as responsabilidades de gestão a partir de suas expertises.

COMEÇO NA CRISE

A visão nas novas gestoras é que começar o negócio num período de maior volatilidade do mercado, como o atual, gera também mais oportunidades de investimentos para quem consegue identificar essas oportunidades.

O sobe e desce dos preços dos ativos, por exemplo, não incomoda os donos da Vinland, gestora de um fundo de ações e um multimercado. "Volatilidade sempre existe. A experiência do time é grande. Quando falo experiência, me refiro a quantas crises tivemos de navegar durante nossas carreiras", diz André Laport.

Ele conta que deixou a Goldman Sachs para abrir o próprio negócio e procurou alguém com experiência macro, para complementar a sua, em renda variável. Fez parceria com James Oliveira, ex-BTG.

A Vinland já nasceu grande. Atualmente tem R$ 1,6 bilhão em gestão num fundo com recursos captados no Brasil. Mas está prestes a lançar um fundo offshore, com recursos de investidores globais, que será um espelho da carteira doméstica. O foco é o investimento global. Segundo Laport, a escolha foi para buscar a diversificação da carteira, mas também para evitar a correlação com outros fundos multimercado que só olham o Brasil.

A Sagmo Capital uniu Sergio Zanini, ex-Itaú BBA, e Marcio Ayrosa, que trabalhou por 40 anos-- até 2017-- no Banco Central do Brasil. Nos últimos nove anos, Ayrosa chefiou o departamento de reservas internacionais do BC.

A ideia da Sagmo é não ficar restrito a opções de investimento no Brasil, para aliar a experiência de ambos nos mercados externos. "Vai depender das oportunidades que identificarmos. Se elas estiverem aqui, podemos estar 100% investidos em Brasil. Se não, 100% lá fora. Vamos aproveitar conhecimento em mercados estrangeiros em busca de opções", diz Zanini.

Ayrosa destaca ainda que o mercado brasileiro é muito concentrado, seja em poucas ações ou em pedaços das curvas dos juros. "Em momentos de estresse, a porta de saída fica pequena para todo mundo. É um fator de risco importante que queremos diminuir."

A Miles tem no comando Fabiano Custodio, ex-gestor do Itaú e do Credit Suisse. Ele aposta no investimento em ações, mas num fundo que tem como característica poder estar "comprado" (apostando na alta) ou "vendido" (acreditando na baixa) dos papéis. A ideia é ter maior mobilidade nos investimentos em bolsa, buscando capturar tanto as maiores possibilidades de valorização quanto as posições que possam proteger a carteira do fundo de eventuais baixas. "Somos um fundo de ações com gestão bastante ativa, diferentemente da ideia de comprar uma pequena quantidade de papéis e ficar esperando para ver o que acontece", diz.

Já a Kiron, que tem Luiz Liuzzi, ex-Vinci Partners, e Francisco Utsch, ex-M Square, é uma gestora mais tradicional com foco em ações. Eles identificaram que esse mercado é pequeno no país e grandes gestores fecharam os fundos para captação, daí a oportunidade para novos nomes.

Eles apostam na vontade de ser mais "focados" como um diferencial da casa. "De um universo de 200 empresas que acreditamos serem 'investíveis' na bolsa, vamos cobrir 30 ou 40", conta Utsch. De um time que hoje tem oito analistas, cada um deles terá menos empresas para cobrir e mais tempo para olhar cada uma delas. "Acreditamos que nossa análise, assim, poderá ser melhor que a média", diz.

A Warren não é tão nova assim. Surgiu há cerca de dois anos, mas começa neste segundo semestre a repaginar o negócio. Ela pertence a dois ex-sócios da XP Investimentos, Tito Gusmão e Marcelo Maisonnave. Warren é uma espécie de robô que monta uma carteira de investimentos a partir do perfil e do objetivo do poupador. No início, ela buscava os chamados millenials, jovens na média com 27 anos e poucos recursos ainda, mas já dispostos a investir. E oferecia fundos próprios. A partir de agora, vai passar a buscar os pais desses jovens, esperando que eles ouçam a recomendação dos filhos. Com a mudança no perfil, vai oferecer produtos selecionados de outras casas de investimento. A aplicação mínima é de R$ 100.

Outras duas gestoras não deram entrevista: a Truxt, que tem equipe saída da ARX BNY Mellon, e a Legacy, formada por ex-Santander.

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