Descrição de chapéu Folhainvest Coronavírus

Alerta de crise por coronavírus demorou a chegar ao pequeno investidor

Sinais de que impacto seria forte chegou apenas no fim de fevereiro

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São Paulo

Apesar do mercado financeiro global reagir ao coronavírus desde janeiro, o sinal de alerta para pequenos investidores no Brasil veio apenas a partir do fim de fevereiro.

A princípio, a leitura de gestoras, corretoras e casas de análise era que o risco da doença consistia na desaceleração da economia chinesa, com impactos na economia global, mas que tudo rapidamente voltaria ao normal após incentivos de Pequim.

O cenário mudou com a disseminação pela Europa e a paralisação do norte da Itália, e as Bolsas despencaram. Pipocaram recomendações de compra de ações para aproveitar a liquidação dos papéis.

O faturamento de corretoras e gestoras provém da quantidade de investidores e das taxas de corretagem cobradas em cada transação de compra e venda de ações. Cotistas de fundos pagam taxa de administração e de performance —em média, de 2% e de 20% ao ano, respectivamente.

No dia 10 de março, Henrique Bredda, sócio fundador e gestor dos fundos Black da Alaska Asset Managment, disse em seu Twitter que o coronavírus “ficará na história como uma das maiores histerias coletivas”. Antes, havia tuitado que “é muito interessante ver que o coronavírus, mais leve que uma gripe do influenza, esteja causando tanto medo”.

Após os fundos Black da Alaska acumularem rentabilidade negativa de 70% neste ano, investidores questionaram Bredda no Twitter, que apagou as postagens.

O gestor então explicou a estratégia dos fundos desde o fim de 2015: além de ações, apostavam na queda do dólar e da Selic. A operação, que deixou de ser vantajosa em 2020 com a Selic a 3,75% ao ano e alta dos juros futuros e do dólar, foi encerrada em 18 de março. Agora, os fundos estão comprados apenas em ações.

“2020 nos trouxe uma lição que ficará para sempre: essa estratégia, por mais que faça todo o sentido, pode machucar no caso de 5, 6 circuit breakers [paralisação temporária da Bolsa após fortes quedas] e isso não pode acontecer, não na magnitude que foi”, escreveu Bredda no dia 19. Procurado, não se manifestou.
A Guide também demorou para avaliar o impacto do vírus, reconheceu o analista Henrique Esteter.

“Passamos um alerta aos clientes quando o Ibovespa chegou nos 102 mil pontos [27.fev]. Contudo, quando analisamos hoje, vemos que foi até positiva a data, já que foi no primeiro quarto da queda”.
No dia 9 de março, o Ibovespa entrou em terreno baixista após queda de mais de 20% em relação ao pico recente.

“Recomendamos cautela para nossos clientes em tempos de alta volatilidade. Quem tem coragem de dormir comprado sem saber o desenvolvimento das coisas nos próximos dias? Estamos no escuro agora”, Henrique Esteter, analista da Guide

A Verde Asset Management, uma das mais respeitadas e bem-sucedidas gestoras do Brasil, presidida por Luis Stuhlberger, disse que subestimou a crise do coronavírus.

“Cometemos um erro importante: começamos a comprar [ações] muito cedo”, disse a gestora em carta a investidores no dia 20 de março.

Em janeiro, Stuhlberger afirmou que havia uma bolha no mercado acionário brasileiro.

A declaração de Stuhlberger causou polêmica no mercado; a maioria discordou que houvesse bolha, ainda que alertaram para a dificuldade de vê-la antes que estourasse.

“Existe uma bolha na Bolsa. Os órfãos do CDI estão diversificando tudo o que aparece. Isso é muito bom para economia brasileira, mas o mercado está praticamente forçando o Banco Central a cortar mais a taxa quando, na minha opinião, deveria ter parado no 4,75% para depois não ter que subir de novo”, disse Stuhlberger à época.

A queda da Selic, a taxa básica de juros, que embasa o CDI, foi um dos movimentos que fez o número de investidores na Bolsa mais que dobrar, superando os 2 milhões. Atualmente a Selic está em 3,75%.

Para Roberto Dumas Damas, professor do Insper, o mercado se deixou levar pela euforia de seguidos recordes dos índice acionários, apesar da desaceleração da economia.

“A bolha era clara, mas ninguém previu que o coronavírus seria uma agulha tão forte”, afirmou Damas.

Em 28 de fevereiro, por exemplo —dois dias após a primeira confirmação de um caso de Covid-19 no Brasil—, a XP Inc. projetava 140 mil pontos para o Ibovespa neste ano e afirmou que a estimativa só mudaria se a expectativa de lucro das empresas fosse afetada por um crescimento menor da economia. Na semana seguinte, reduziu a previsão para 132 mil pontos e passou a ver alta de 1,8% no PIB brasileiro, contra 2,3% antes.

O fundador da XP, Guilherme Benchimol, posa atrás da bancada da Nasdaq segurando uma bandeira do Brasil no alto. Atrás, o logo da XP Inc. aparece escrito em um fundo azul escuro
Guilherme Benchimol, um dos fundadores da XP Investimentos, na estreia da XP Inc. na Nasdaq, Bolsa de tecnologia de Nova York - Matheus Detoni/Divulgação

Só em 8 de março recomendou aos seus clientes, via email, cautela devido a “uma possível desaceleração econômica” por causa do coronavírus.

No dia 27 de março, a XP reduziu mais uma vez sua expectativa para o PIB de 2020, para retração de 1,9% e, no dia 29, abaixou a previsão do Ibovespa para 94 mil pontos.

Em nota, a XP Inc. afirmou que desde os primeiros casos do novo coronavírus na China seus analistas se dedicam a entender a dimensão da crise, que chamou de “sem precedentes” e que “pegou todo o mundo de surpresa por sua dimensão e velocidade”.

“Todo o mundo já entendeu a gravidade da crise. De tempos em tempos, temos crises, mas quem investe no longo prazo tende a se dar bem. Obviamente, essa crise vai passar”, Guilherme Benchimol, presidente da XP, em transmissão ao vivo pela internet no dia 1º de abril

Ele lembrou que, na crise de 2008, a XP dobrou a base de clientes à época com a campanha “Como transformar crise em oportunidade”. “Espero que aconteça o mesmo”, disse Benchimol.

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